"No próprio dia da batalha, as verdades podem ser pinçadas em toda a sua nudez, perguntando apenas;
porém, na manhã seguinte, elas já terão começado a trajar seus uniformes."

(Sir Ian Hamilton)



sábado, 10 de julho de 2021

A BATALHA DO LAGO REGILO (c.496 a.C)

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A Batalha do Lago Regilo foi uma lendária vitória romana sobre a Liga Latina logo depois da fundação da República Romana. 


Os latinos eram liderados pelo já idoso Tarquínio Soberbo, o sétimo e último rei de Roma, deposto e expulso em 509 a.C., e seu genro, Otávio Mamílio, o ditador de Túsculo. A batalha foi a última tentativa dos Tarquínios de voltarem ao trono de Roma. Segundo a lenda, Castor e Pólux lutaram pelos romanos nesta vitória. A ameaça de uma invasão de Roma pelos seus antigos aliados no Lácio levaram à nomeação de Aulo Postúmio Albo como ditador. Ele escolheu Tito Ebúcio Helva para ser seu mestre da cavalaria.

O ano exato no qual a batalha ocorreu é incerto e já era assim nos tempos antigos. Lívio localiza a batalha em 499 a.C., mas afirma que algumas de suas fontes também sugerem que ela pode ter acontecido no ano do consulado de Postúmio em 496 a.C. A outra principal fonte para este período, Dionísio de Halicarnasso também concorda com esta data. Autores modernos também já sugeriram 493 a.C. ou 489 d.C.

O Lago Regilo ficava no centro de uma cratera vulcânica, entre Roma e Túsculo, e foi drenado no século IV a.C.. Segundo Lívio, os volscos, uma tribo vizinha que habitava a região ao sul do Lácio, havia mobilizado um exército para ajudar na luta dos latinos contra Roma, mas a pressa do ditador romano em se engajar rapidamente no combate fez com as forças volscas chegassem atrasadas.

Condições atuais de um dos possíveis lugares onde o Lago Regilo (Cratera Prata Porci, Monte Compatri) se localizava


Choque de forças

O ditador Postúmio liderou a infantaria romana e Helva, a cavalaria. Tarquínio estava com seu último filho ainda vivo, o primogênito Tito Tarquínio. Conta-se que a presença dos dois aumentou ainda mais o fervor dos romanos no combate.

Logo no início, o rei foi ferido ao tentar atacar Postúmio. O mestre da cavalaria atacou Mamílio e os dois foram feridos, Ebúcio no braço e o ditador latino, no peito, e acabou obrigado a se afastar do combate e comandá-lo à distância. Os soldados do rei, incluindo muitos romanos exilados, começaram a levar vantagem sobre as forças republicanas e os romanos sofreram um revés quando Marco Valério Voluso, cônsul em 505 a.C., foi morto por uma lança enquanto atacava Tito Tarquínio, mas Postúmio engajou sua própria guarda pessoal na luta e progresso inimigo foi interrompido.

Reprodução de moeda que homenageia Tarquínio Soberbo

Enquanto isso, Tito Hermínio Aquilino, famoso por ter lutado ao lado de Horácio Cocles na Ponte Sublício e cônsul em 506 a.C., atacou Mamílio e o matou; porém, ele próprio foi morto por um dardo enquanto tentava retirar os espólios de seu inimigo vencido. Como o resultado da batalha ainda era duvidoso, Postúmio ordenou que os cavaleiros desmontassem para lutar a pé, forçando os latinos a se retirarem, o que lhes permitiu capturar o acampamento latino. Tarquínio e o exército latino abandonaram o campo de batalha e o resultado foi uma vitória decisiva para os republicanos. Postúmio e seu exército voltaram para Roma e o ditador celebrou seu triunfo sobre os latinos.

Uma lenda muito popular conta que os Dióscuros, Castor e Pólux, lutaram com os romanos na forma de dois jovens cavaleiros. Postúmio ordenou então a construção do Templo de Castor e Pólux no Fórum Romano, no exato local onde os dois teriam dado de beber aos seus cavalos. 


Consequências

Depois desta vitória, um tratado conhecido como "Foedus Cassianum" ("Tratado de Cássio") firmou uma aliança entre romanos e a Liga Latina. O tratado foi batizado em homenagem ao cônsul Espúrio Cássio. 

Este conflito marcou um ponto de inflexão no qual Roma tornou-se o poder dominante no Lácio, embora ainda reconhecesse a autonomia e independência de várias cidades-estado latinos. Ele estipulava que os latinos deveriam prover aliança militar aos romanos no caso de ameaças externas e que quaisquer exércitos mobilizados para este fim seriam comandados por romanos. Também legalizou o casamento entre cidadãos romanos e latinos, um antigo ponto de disputa, e recobrou o comércio da região.



terça-feira, 29 de junho de 2021

UNIFORMES - OFICIAL DOS ATIRADORES ARGELINOS, 1867

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Tenente do 3º Regimento de Atiradores Argelinos do Exército Imperial Francês. 


Renato Coutinho


Excelente foto batida em 1867. Este veterano veio de baixo. Começou sua carreira militar como praça, sargento na Guerra da Criméia, servindo no 5º Batalhão de Caçadores a Pé do Exército Imperial Francês, quando foi condecorado por bravura com a Medaille Militaire (condecoração que aparece nesta foto). Foi promovido a 2º tenente (sous-lieutenant em francês), promoção que recompensou sua conduta exemplar sob fogo, quando tinha 29 anos de idade. Foi promovido a 1º tenente com 34 anos (simplesmente "tenente" em francês). 

O oficial também lutou na Campanha do México. Em 1870, quando eclodiu a Guerra Franco-Prussiana, era capitão comandando uma companhia de um dos batalhões do excelente 3º Regimento de Atiradores Argelinos. Na Batalha de Froeschwiller, o 3º Regimento de Atiradores Argelinos combateu com uma tenacidade fora do comum e sofreu baixas muito pesadas. O capitão teve o quepe arrancado de sua cabeça por um projétil de fuzil prussiano, o qual também arrancou alguns cabelos de sua cabeça. Outra bala inimiga partiu a lâmina de seu sabre (esse mesmo sabre que aparece na foto). O capitão deu sorte naquele dia... Não foi ferido... Cerca de 82% dos oficiais do regimento foram mortos ou feridos naquele terrível dia. 

Ele foi agraciado com a Légion d'Honneur pela conduta/liderança exemplar que teve naquela batalha. Encerrou sua carreira militar em 1884, como coronel comandando um regimento de infantaria de linha francês.


segunda-feira, 14 de junho de 2021

IMAGEM DO DIA - 14/6/2021

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Grupo de veteranos franceses da Batalha de Verdun durante uma viagem aos EUA para ajudar a apoiar o Terceiro Empréstimo da Liberdade, promulgado em abril de 1918, e que permitiu a captação de US$ 3 bilhões em títulos de guerra a 4,5% de juros.



domingo, 13 de junho de 2021

BAIONETA: A ARMA QUE MILITARIZOU O CAMPONÊS RUSSO

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A baioneta estreou nos exércitos europeus no final do século 17 como uma espécie de “arma de destruição em massa” primitiva. As armas de fogo da época eram pouco precisas e apresentavam diversos problemas técnicos. Mas a baioneta imediatamente revolucionou os rifles pesados e ineficientes nos quartéis da Europa.


Por Alexandr Verchínin


No final do século XVII surgiu uma novidade no continente europeu que iria mudar drasticamente a dinâmica e eficácia do combate de infantaria: a baioneta. Esse punhal fixo montado abaixo do cano de um fuzil permitia que um soldado em terra lutasse contra um adversário de perto quando o uso de qualquer arma de fogo já era impraticável.

As tropas preferiam recorrer ao gatilho e balas, acumulando rapidamente uma grande quantidade de corpos em ambos os lados. Mas um esquadrão de infantaria armado com fuzis e baionetas não só conseguia resistir contra os ataques de cavalaria, mas era também capaz de montar ataques que poderiam acabar com setores inteiros das tropas inimigas.

Os soldados russos se familiarizaram com a baioneta no início do século XVIII, e comprovaram de cara os benefícios dessa lâmina fixa montada abaixo do cano da arma. A inconsistência do calibre e falhas de disparo muitas vezes tornavam os rifles obsoletos e ineficazes no campo de batalha, especialmente para as tropas compostas por trabalhadores rurais.

Mas um fuzil com uma baioneta afiada era muito parecido com o tridente usado pelos camponeses russos desde a infância. Enquanto o soldado de infantaria europeia tentava fincar a baioneta no peito do inimigo, com seu fuzil mantido na altura do ombro, os granadeiros russos atacavam no “estilo camponês”, empunhando o objeto na posição vertical contra a barriga. Quando a baioneta penetrava, eles largavam a coronha do rifle e impulsionavam a baioneta. Além disso, o modelo triangular da baioneta russa tornava a arma mais fácil de penetrar em roupas grossas e deixar feridas profundas e de difícil cicatrização. “A bala é tola; a baioneta, uma boa companheira”, disse certa vez o famoso general russo Aleksandr Suvorov, que enfatizou a necessidade de habilidades de luta entre os cadetes do exército.

Enquanto os fuzis de cano liso do final do século XVIII tinham alcance de até 100 passos (cerca de 75 metros), a infantaria de Suvorov cobria essa distância em 30 segundos, permitindo que o inimigo desse apenas um voleio antes de ser massacrado pelas ondas de tropas russas.

Em algumas ocasiões, seus protégées venciam forças muitas vezes maiores em número e armas. “O inimigo tem mãos como nós, elas só não sabem manusear a baioneta”, escreveu Suvorov. Antes da campanha italiana contra os franceses, em 1799, ele supervisionou pessoalmente o treinamento de baioneta para o Exército austríaco aliado, que também contava com técnicas de combate corpo a corpo.

Napoleão cobrara uma vitória contra as forças russo-austríacas na Batalha de Austerlitz, em 1805, mas o general francês elogiou mais tarde as habilidades dos inimigos russos. “Os russos lutaram contra seus adversários um por um. Eu vi como soldados lutavam sozinhos com tanta confiança, como se tivessem o apoio de um batalhão”, afirmou.

Na batalha de Leipzig, em outubro de 1813, alguns soldados do Regimento de Salvaguarda Finlandês foram cercados por forças inimigas superiores. Os granadeiros revidaram com baionetas fixas até que apenas um soldado continuasse vivo. Ferido 18 vezes, ele foi preso e, em seguida, citado por Napoleão como um exemplo de habilidade de combate próximo para o seu exército.

Infantaria russa realiza um ataque à baioneta na Batalha de Berezina


Na Guerra da Crimeia, nos anos de 1854 e 1855, os britânicos e franceses experimentaram a fúria da carga de baioneta russa durante o cerco de Sebastopol.

A Rússia pode não ter vencido a guerra, mas o efeito de suas lâminas foi uma memória persistente para os vencedores. Doze anos depois, O Reino Unido e a França até pressionaram a organização russa da Sociedade Internacional da Cruz Vermelha a convencer as autoridades militares russas a abandonar o uso de golpes de baioneta contra o estômago. A Rússia concordou formalmente com o pedido, mas seus soldados muitas vezes continuavam a lutar usando o estilo antigo.

Até o início do século XX, as habilidades de combate com baioneta da Rússia eram consideradas as melhores da Europa, apesar de não haver orientações escritas – as habilidades eram passadas de soldado para soldado.

A baioneta russa também encontrou aplicação na nova era de fuzis de disparo rápido e até foi adotada em alguns dos principais rifles alemães na Primeira Guerra Mundial. Mas a baioneta foi gradualmente suplantada por variantes, que seriam amplamente introduzidas no Exército Vermelho – antes da eclosão da Segunda Guerra Mundial interromper essa reforma.

A rapidez do ataque nazista à União Soviética indicou que ainda havia muito espaço para a baioneta no campo de batalha quando a guerra eclodiu. O soldado soviético Ivan Ischenko, por exemplo, matou sete alemães em combates corpo a corpo perto de Kirovograd, em 1944, usando sua afiada baioneta russa.

Depois da guerra, o Exército soviético finalmente adotou a faca-baioneta, que foi lançada com o novo fuzil de assalto Kalashnikov. A antiga arte marcial se espalhou para além do ambiente militar como uma variação de esgrima, com carabinas e baioneta. Não durou muito mais do que uma década, no entanto, e foi retirada a pedido do Comitê Olímpico Internacional, que considerava a modalidade excessivamente agressiva e militarista.

Fonte: Gazeta Russa


segunda-feira, 7 de junho de 2021

“COM O SACRIFÍCIO DA PRÓPRIA VIDA” ... QUANDO RENDER-SE NÃO É UMA OPÇÃO

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Todas as sociedades são constituídas por diferentes corporações profissionais que, não raro, reúnem homens e mulheres extremamente dedicados a seus ofícios, trabalhando com competência e de forma destacada. Existe, no entanto, uma profissão diferenciada, na qual seus integrantes, ao nela ingressarem, comprometem-se voluntariamente a doar, se necessário for, seu bem jurídico mais valioso: a própria vida. Apenas por esse aspecto singular, a profissão militar revela-se diferente de todas as demais. Ao serem incorporados às fileiras do Exército Brasileiro (EB), todos os homens e mulheres – soldados, sargentos e oficiais – prestam o compromisso de defender a Pátria, “com o sacrifício da própria vida”.

No curso da história militar, não é difícil encontrar exemplos onde tal conceito foi provado no calor da batalha. No distante ano de 480 a.C., cerca de trezentos guerreiros espartanos, sob as ordens de Leônidas, resistiram até a morte diante de uma investida persa, no desfiladeiro das Termópilas. Em 1836, pouco mais de duzentos norte-americanos permaneceram lutando até o fim no Forte Álamo, Texas, ao serem atacados por 1.800 soldados mexicanos. Menos de dez defensores da fortificação sobreviveram. Durante a Segunda Guerra Mundial, por ocasião da blitzkrieg alemã contra a França, em 1940, a 13ª Brigada britânica decidiu “ficar para trás”, a fim de cobrir e possibilitar a retirada em Dunquerque, mesmo sabendo que o destino seria a morte ou a captura.

Tenente Antônio João, defensor da Colônia Militar de Dourados

Em nossa história militar, soldados brasileiros também foram levados até esse limite, onde a rendição não era uma opção a ser considerada. Em dezembro de 1864, nos primeiros movimentos da Guerra da Tríplice Aliança, uma coluna paraguaia com aproximadamente 300 homens sob o comando do Coronel Vicente Barrios investiu contra o Mato Grosso, tomando a direção da Colônia Militar de Dourados, um diminuto posto avançado do Exército Imperial liderado pelo Tenente de Cavalaria Antônio João Ribeiro. Ciente da notícia da aproximação de tropa inimiga de valor incontestavelmente superior, o oficial brasileiro providenciou para que a população civil da colônia fosse evacuada para um local seguro e decidiu resistir, ainda que a vitória fosse impossível. Liderando sua guarnição, não se renderia ao inimigo.

Instado à capitulação pelo major paraguaio Martin Urbieta, Antônio João comunicou-lhe sobre sua disposição em defender aquela longínqua porção do território de sua Pátria, e enviou-lhe a resposta que entraria para a história: "Sei que morro, mas o meu sangue e o de meus companheiros servirá como solene protesto contra a invasão do solo de minha Pátria."

Cópia da página do Almanak do Exército Brasileiro de 1864, onde constam os dados do tenente Antônio João.


Não se renderam. O Tenente Antônio João e sua guarnição não foram poupados pelos paraguaios. Em 1870 o conflito terminaria com a vitória da Tríplice Aliança. Quase 120 anos mais tarde, em 1980, Antônio João foi escolhido pelo EB como Patrono do Quadro Auxiliar de Oficiais (QAO).

Representação do sacrifício do tenente Antônio João em escultura na Praça General Tibúrcio (Praia Vermelha), Rio de Janeiro


No entanto, extrapolando o universo dos integrantes do QAO, na verdade o Tenente de Cavalaria Antônio João representa o compromisso perene e o espírito de sacrifício do soldado do Exército de Caxias, pronto para, se necessário for, entregar seu bem maior – a vida – na defesa da Pátria. 

Não se rendeu... entrou para a história com “o sacrifício da própria vida”.

Fonte: EBlog


UNIFORMES - MILÍCIA POPULAR SOMALI

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Milícia Popular Somali
Miliciano
Guerra do Ogaden (1977-1978)

A breve Guerra do Ogaden começou com a invasão somali da Etiópia. A União Soviética desaprovou a invasão e cessou seu apoio à Somália, passando a apoiar a Etiópia. A Etiópia foi salva de uma grande derrota e da perda permanente de território por meio de um transporte aéreo massivo de suprimentos militares no valor de US $ 1 bilhão, a chegada de entre 12.000 e 24.000 soldados cubanos enviados por Fidel Castro para obter uma segunda vitória africana (após seu primeiro sucesso em Angola em 1975-1976).

O miliciano acima utiliza uniforme camuflado modelo de selva e equipamento de origem soviética. Está armado com uma metralhadora DP-27, remanescente dos estoques da Segunda Guerra Mundial.


terça-feira, 25 de maio de 2021

PRIMEIRA BATALHA DE TUIUTI (1866)

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A Batalha do Tuiuti, travada entre as forças da Tríplice Aliança contra o Paraguai, foi a maior já ocorrida na América do Sul.

Por Ricardo Cabral

Em 24 de maio de 1866 foi travada a Batalha do Tuiuti entre forças do Império Brasileiro, a Repúblicas Argentina e Uruguai contra as forças paraguaias. Foi a maior batalha campal da América do Sul e envolveu cerca de 55 mil homens. As forças aliadas somavam 32 mil homens, sendo 21 mil brasileiros, 9.700 argentinos e 1.300 uruguaios contra 24 mil paraguaios. As baixas foram de em torno de 6 mil mortos e 7 mil feridos entre os paraguaios, com relação aos Aliados foram 996 mortos e 2934 feridos.

Tuiuti é uma região pantanosa localizada no sudoeste do Paraguai, situada na confluência dos rios Paraná e Paraguai. As tropas aliadas estavam acampadas e muito concentradas em uma porção de terra seca, que favorecia a defesa, porém insalubre e suscetível a várias doenças como, por exemplo, o cólera. 

O acampamento Aliado estava próximo a uma sólida posição defensiva paraguaia, a trincheira de Sauce, guarnecida por 1580 homens e várias posições de canhões, a 6 km dali, em Paso Pucú, estavam acampadas as forças de Lopez, que percebendo a intenção dos Aliados de atacar Sauce, decidiu se antecipar.


O Exército paraguaio, atacou de surpresa, com quatro colunas o centro do acampamento, com o objetivo geral era flanquear as forças Aliadas a fim de não permitir sua retirada para Estero Bellaco. As colunas foram organizadas de forma desigual entre elementos de cavalaria e infantaria. A cavalaria liderou o ataque e conseguiu destruir algumas unidades aliadas localizadas no perímetro exterior de defesa.

Apesar do sucesso inicial, as forças aliadas, lideradas pelo general Manuel Luís Osório, resistiu, se reorganizou e aproveitando sua superioridade de efetivos e de sua artilharia, contra-atacou provocando. Além de Osório, se destacaram na batalha, o brigadeiro Antônio Sampaio, comandante da 3ª Divisão de Infantaria (a esquerda do dispositivo) e o tenente-coronel Émile Louis Malett, comandante do 1º Regimento de Artilharia a Cavalo (no centro do dispositivo Aliado a retaguarda de fosso defensivo e fundamental para a vitória). As tropas brasileiras estavam distribuídas por todo o acampamento, com a reserva à retaguarda, também composta por forças Imperiais.

O 1º Regimento de Artilharia a Cavalo, comandado por Emílio Luiz Mallet, ocupou posição no centro do dispositivo Aliado, a retaguarda de um fosso defensivo, e foi fundamental para a vitória na Batalha de Tuiuti

Aliados e paraguaios cometeram usa série de falhas táticas no planejamento, na montagem do dispositivo defensivo, na condução e coordenação do ataque, no reconhecimento do terreno, das posições inimigas e de suas intenções. Ocorreram várias críticas sobre os motivos que levaram as forças Aliadas a não realizarem uma perseguição e ao aproveitamento do êxito contra as forças paraguaias que se retiravam. Bartolomeu Mitre, presidente da Argentina e comandante-em-chefe do Exército Aliado, decidiu reforçar a posição em Tuiuti, alegando a falta de cavalos.

1º tenente do 1º Regimento de Artilharia a Cavalo em 1866


Fonte: História militar em debate


segunda-feira, 24 de maio de 2021

IMAGEM DO DIA - 24/5/2021

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O vapor Satélite parte conduzindo o 58º Batalhão de Caçadores para combater na Guerra do Contestado, em imagem publicada na Revista da Semana nº 36, de outubro de 1914. 

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quinta-feira, 20 de maio de 2021

CRIANÇA-SOLDADO QUE SE TORNOU COMANDANTE REBELDE É CONDENADO POR CRIMES DE GUERRA

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Tribunal Penal Internacional condena Dominic Ongwen a 25 anos de prisão por crimes de guerra. Ex-guerrilheiro foi uma criança-soldado ugandesa que se tornou comandante do Exército de Resistência do Senhor.


Dominic Ongwen, 45 anos, foi condenado em fevereiro por 61 acusações, incluindo gravidez forçada, sobre a qual o Tribunal Penal Internacional (TPI) nunca antes se tinha pronunciado. Em audiência do último dia 6 de Maio, em Haia, ele também foi considerado culpado de homicídio, violação, escravidão sexual e recrutamento de crianças-soldado.

"À luz da gravidade dos crimes que cometeu, a câmara condena-o a um período total de prisão de 25 anos", disse o juiz Bertram Schmitt ao dirigir-se a Dominic Ongwen.

De acordo com o tribunal, Ongwen ordenou ataques aos campos de refugiados no início de 2000, enquanto servia como comandante do Exército de Resistência do Senhor (ERS), um grupo armado liderado pelo fugitivo Joseph Kony, que empreendeu uma guerra brutal no Uganda e em três países vizinhos, para estabelecer um Estado baseado nos Dez Mandamentos da Bíblia.

Dominic Ongwen, apelidado de "formiga branca", fotografado no tempo em que comandava o ERS


Cogitava-se prisão perpétua

Ongwen enfrentava uma sentença de prisão perpétua, mas tendo em conta a sua própria história de rapto pelo grupo rebelde, quando tinha cerca de 9 anos, a acusação optou por pedir 20 anos de prisão. "Esta é uma circunstância que distingue este caso de todos os outros julgados por este tribunal", disse Colin Black, um membro da acusação, na audiência de sentença de abril no TPI.

Depois de ter invocado a absolvição durante o julgamento, sublinhando que o próprio acusado tinha sido vítima da brutalidade do grupo rebelde, a defesa pediu 10 anos de prisão para esta antiga criança-soldado, apelidada de "formiga branca", durante a audiência da sentença. As vítimas, por outro lado, pediam prisão perpétua.

Dominic Ongwen sentado no banco dos réus do Tribunal Penal Internacional


"Em nome de Deus", Ongwen sempre negou todas as acusações, alegando que o ERS o forçou a comer feijões embebidos no sangue das primeiras pessoas que foi obrigado a matar, como iniciação após ter sido raptado."Sou a primeira vítima. Estou perante este tribunal internacional com tantas acusações e, no entanto, sou a primeira vítima de rapto de crianças", afirmou durante o seu julgamento.

"O que me aconteceu, acho que nem sequer aconteceu a Jesus Cristo", acrescentou. Ao declará-lo culpado, os juízes do TPI reconheceram que Ongwen tinha sofrido muito, mas disseram que os seus crimes tinham sido cometidos "como adulto responsável e comandante do Exército de Resistência do Senhor".

Memorial às vítimas do massacre perpetrado pelo ERS em Lukodi, Uganda

De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), o ERS massacrou mais de 100.000 pessoas e 60.000 crianças, numa violência que se espalhou pelo Sudão, República Democrática do Congo e República Centro-Africana.  Ongwen, que se rendeu em 2015, é o primeiro comandante do ERS a ser julgado pelo TPI. O fundador do grupo, Joseph Kony, é objeto de um mandado de captura do tribunal.

Fonte: DW/Agência Lusa


sábado, 15 de maio de 2021

BATALHA DE SAMARRA (363)

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A batalha foi travada em junho de 363, após a invasão da Pérsia Sassânida pelo imperador romano Juliano. Os romanos, isolados no território persa e sofrendo com a falta de suprimentos, foram forçados a aceitar termos de paz, depois da morte de Justiniano em combate.


O imperador Juliano invadiu o Império Sassânida com uma força de 95.000 homens, na esperança de sua vitória mudar o equilíbrio de poder no leste, onde os romanos haviam sofrido recentes reveses sob Constantino II, e talvez substituir o xá Shapur II por seu irmão Ormisdas. Juliano, porém, cometeu dois erros de erro no início da invasão: dividiu sua força em duas, uma sob o comando de seu primo Procópio, com 30.000 homens, mantendo ao norte da Mesopotâmia um total de 65.000 homens sob sua própria liderança. Seu segundo erro foi não derrotar o principal exército sassânida antes de atacar a capital, o que acabou por levar ao fracasso da expedição em 363. 

Moeda romana com a efígie do imperador Juliano

Juliano obteve uma vitória tática em Ctesifão, capital do Império Sassânida, mas não conseguiu tomar a cidade. Pior ainda, Procópio falhou em se juntar a ele com seu exército, devido à traição de Arshak II, rei cristão da Armênia, que apoiou os movimentos do contingente do norte. Juliano, então, despachou a frota que ele trouxera rio abaixo até Ctesifão, deixando para trás grande parte da bagagem que não podia ser transportada. Ele então dirigiu sua marcha para o interior, no coração dos domínios de Shapur, na esperança de forçar uma batalha. Vários dos escritores cristãos que relataram os eventos, assim como o historiador Ammianus, culparam essa decisão pelos desastres subsequentes. 

O absolutista Shapur implementou uma política implacável de devastação do solo, queima de colheitas, residências e provisões onde quer que os romanos dirigissem sua marcha, para que o exército logo se estreitasse por falta de sustento. Juliano, percebendo que seu exército não poderia ser reabastecido ou reforçado, tentou forçar uma batalha com seu inimigo, mas Shapur o iludiu, e seus guias apenas desorientaram e confundiram os passos dos romanos.

Soldados do Império Sassânida

Assim, foi tomada a relutante decisão de recuar pelo distrito de Corduene, ao norte, onde havia esperança de encontrar suprimentos adequados.  Após alguns dias avançando pelo país inimigo, apesar de derrotar as escaramuças persas e infligir pesadas perdas na Batalha de Maranga, o exército desmoralizado, que pretendia derrubar a monarquia persa, estava com suas provisões quase esgotadas e extremamente desgastado pelo clima quente e pelos contínuos combates.

Depois de três dias tranquilos, o exército romano foi emboscado durante seu cauteloso avanço em formações quadradas pelo país ao sul da cidade de Samarra. A batalha começou como uma escaramuça persa, contra a retaguarda da coluna romana. Um grande corpo de cavalaria e de elefantes de guerra caiu no centro da ala esquerda romana, comandada por Anatólio. De acordo com a narrativa de Ammianus Marcellinus, Juliano se apressou a reunir suas forças contra os persas, sem usar sua armadura, que ele havia removido devido ao calor. Ele conseguiu elevar seu moral e repelir o ataque principal do inimigo à esquerda, mas sua guarda pessoal foi dispersada durante os combates e Juliano foi atingido por uma lança, que penetrou em seu fígado. O imperador mortalmente ferido caiu do cavalo e foi retirado do campo de batalha inconsciente. 

A luta continuou inconclusa até que a escuridão da noite pôs fim à luta. A ala esquerda do exército romano foi derrotada e Anatólio morto. Mas, em outros lugares, os persas foram derrotados, seus elefantes e tropas maciças de cavalaria dispersados e seus generais nobres mortos.  De acordo com a versão, os romanos podem ser considerados vitoriosos, ou derrotados pelas forças persas. 

Juliano morreu em sua tenda, à meia-noite, com seus oficiais reunidos ao seu redor, em decorrência do ferimento recebido. Libânio, em suas orações em comemoração à vida e às obras do último imperador romano pagão legítimo, declarou inicialmente que Juliano foi assassinado por um cristão que era um de seus próprios soldados, mas depois afirmou que o assassino era um sarraceno ou soldado persa. 

O imperador Juliano é mortalmente ferido na batalha

Juliano se absteve deliberadamente de nomear um sucessor, e os comandantes se reuniram ao amanhecer para a eleição. A honra foi estendida ao prefeito Salustiano, mas este recusou. A escolha então recaiu espontaneamente sobre Joviano, um comandante da guarda pessoal de Julian, cujo pai fora um general de mérito distinto no mesmo serviço. Ele imediatamente retomou o retiro ao longo da margem leste do Tigre, sob o contínuo assédio dos persas, e sofreu pesadas perdas em compromissos sucessivos em Samarra e no acampamento em Carche, no qual os persas, revigorados pelas notícias de da morte de Juliano, mal foram adiados. 

Shpaur II, o Grande, vencedor em Samarra

Depois de quatro dias de luta, o exército desmoralizado finalmente estacionou  em Dura, onde tentaram construir uma ponte para atravessar o rio, mas não conseguiram, e foram cercados por todos os lados pelo exército persa. Joviano percebeu  claramente que a situação era desesperada. Inesperadamente, os enviados de Shapur II chegaram em seu acampamento oferecendo ofertas de paz, e Joviano, que durante a parada esgotara suas provisões, agarrava-se ansiosamente a qualquer local para libertar o exército de sua terrível situação. Assim, ele foi forçado a aceitar termos humilhantes de Shapur, a fim de salvar seu exército e a si mesmo da destruição completa. 

O tratado com Shapur, revogando as condições favoráveis que Diocleciano havia conseguido do avô deste, Narseh, rendeu-lhe a Mesopotâmia Oriental, com as cinco províncias além do Tigre: Intilene, Zabdicene, Arzanena, Moxoene e Corduene/Armênia,  bem como quinze fortalezas, incluindo as cidades estratégicas de Nisibis e Singara, sem seus habitantes. 

Uma trégua de trinta anos foi estabelecida entre os impérios rivais. A perda da elaborada cadeia de fortificações fundada por Diocleciano dificultou severamente o sistema defensivo do império no leste e deu aos persas uma vantagem definitiva em seus subsequentes confrontos com os romanos. 

Investidura do rei Ardashir II pela divindade angélica Mitra (esquerda) e Shapur II (direita); o corpo de Juliano é pisado. Relevos em Taq-e Bostan.


terça-feira, 11 de maio de 2021

DOIS HERÓIS BRASILEIROS: UM ESTUDO SOBRE A CAMARADAGEM

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Uma história de camaradagem e coragem na Força Expedicionária Brasileira

Entre os deveres militares, a camaradagem é conceituada na Cartilha Valores e Ética Profissional Militar, do Programa Raízes, Valores e Tradições, como “capacidade de estabelecer relações amistosas com superiores, pares e subordinados”. Se, em tempo de paz, figura como importante atributo para o perfeito funcionamento das instituições militares, quando em combate, a camaradagem revela-se essencial para a sobrevivência e para o cumprimento de missões de elevados risco e complexidade.

A história militar brasileira é rica em episódios que demonstram como a camaradagem é valiosa em situações que levam os combatentes a situações extremas. Foi o que ocorreu na noite de 12 para 13 de dezembro de 1944, por ocasião da quarta tentativa brasileira de conquistar o Monte Castello, durante a Segunda Guerra Mundial.


Desde o mês de novembro, a Força Expedicionária Brasileira (FEB) tentava subjugar a importante posição estratégica, cuja conquista permitiria a ruptura da Linha Gótica, rede defensiva alemã apoiada na cordilheira dos Apeninos. Apesar da coragem e tenacidade dos pracinhas da FEB, três tentativas de ataque haviam fracassado dada a qualidade das posições alemãs, que dominavam o terreno e os acessos à elevação.

No dia 12 de dezembro, desenvolvia-se mais um ataque, e o Capitão João Tarciso Bueno liderava a 1ª Companhia do 11º Regimento de Infantaria em sua progressão rumo ao Monte Castello. Quando o inimigo conseguiu ajustar seus fogos sobre a subunidade, o Capitão Bueno identificou a situação crítica e passou à frente de seus homens para liderá-los pessoalmente. Pouco a pouco, a eficácia das armas alemãs foi provocando numerosas baixas e a progressão arrefeceu. Diversas subunidades, em setores vizinhos, já haviam recebido ordens para retrair, mas o capitão prosseguiu com seus homens, até ser colhido por uma rajada de metralhadora que lhe provocou graves ferimentos. Caído em uma vala, inconsciente, com várias costelas partidas e com o pulmão esquerdo trespassado por um tiro, o capitão permaneceu no terreno, enquanto os remanescentes de sua combalida companhia retraíam.

Depois de ser informado que o comandante de uma de suas subunidades jazia ferido na “terra de ninguém”, o comandante do batalhão organizou patrulhas para tentar resgatá-lo. Com a proteção da noite, diversas patrulhas vasculharam a região a procura do oficial ferido, uma delas liderada pelo célebre patrulheiro Sargento Max Wolff Filho, mas nenhuma logrou êxito, pois o Capitão Bueno havia rastejado em busca de água e caído em um córrego. Resignado, mas temendo perder mais homens, o comandante do batalhão sustou o envio de novas patrulhas.

Capitão João Tarciso Bueno

Um integrante da 1ª Companhia, no entanto, não se conformou com a situação. Tratava-se do Soldado Sérgio Pereira, natural de Minas Gerais, ordenança do Capitão Bueno. Sabia que seu comandante havia sido visto, pela última vez, com vida, ainda que gravemente ferido, e tomou uma decisão: sairia pela “terra de ninguém” e só retornaria com seu chefe e camarada, ainda que isso pudesse custar-lhe a vida.

Armou-se, equipou-se, pegou algumas granadas de mão e, silenciosa e solitariamente, partiu oculto pela escuridão do inverno italiano. Por muitas horas caminhou, rastejou, correu e escondeu-se de patrulhas inimigas, até que conseguiu chegar aos arredores de Abetaia, localidade em poder dos alemães. Depois de ter passado pelos cadáveres de companheiros que haviam perecido na jornada, já pensava em desistir devido à aproximação das luzes da madrugada. Sua persistência, no entanto, foi recompensada. Ao vasculhar um riacho com águas quase congeladas pelo frio, conseguiu localizar seu capitão, inconsciente. Verificando que ele ainda estava vivo, o Soldado Sérgio transportou-o nos ombros por alguns quilômetros, cuidando para não fazer ruídos. Em seguida, rastejou em uma parte aberta do terreno, trazendo seu chefe nas costas até, finalmente, alcançar as linhas avançadas da FEB. Sua obstinação e seu elevado senso de camaradagem haviam salvado seu capitão.

Soldado Sérgio Pereira recebendo a medalha Bronze Star das mãos do General Truscott

O General Mascarenhas de Moraes, Comandante da FEB, elogiou o Soldado Sérgio nos seguintes termos: “É um magnífico exemplo de dedicação ao chefe, que tenho a mais grata satisfação de apontar à FEB”. O Monte Castello cairia em poder dos brasileiros somente em 21 de fevereiro de 1945, após um quinto e bem-sucedido ataque, abrindo o caminho para o vale do Rio Pó.

Por sua liderança, o Capitão Bueno foi promovido e condecorado pelo Brasil e pelos Estados Unidos. O Soldado Sérgio também recebeu uma promoção e condecorações por bravura. De volta ao Brasil, ambos permaneceram grandes amigos até o fim de suas vidas. Um belo exemplo de camaradagem legado para todos os integrantes da Força Terrestre por esses dois heróis brasileiros, naquela gelada e silenciosa noite de inverno em 1944.

Fonte: EBlog


quarta-feira, 5 de maio de 2021

DIA DA VITÓRIA - EXPOSIÇÃO DE VIATURAS MILITARES

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DA CÓRSEGA AO EGITO, BICENTENÁRIO DA MORTE DE NAPOLEÃO INSPIRA VIAGENS PELO MUNDO

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 Influência de imperador francês se nota em diversas partes da Europa e até mesmo no Rio de Janeiro

Por Eduardo Vessoni

Ele aterrorizou nações, conquistou meia Europa e tinha grande habilidade para comandar exércitos. Mas terminaria seus últimos anos isolado no meio do Oceano Atlântico, cuidando de jardins, ditando memórias a um criado e construindo uma gangorra na sala de bilhar.

Da Itália ao Egito, o império de Napoleão Bonaparte, cujo bicentenário de morte é no próximo dia 5, foi feito de conquistas e títulos. Já os extremos de sua vida foram marcados por isolamento em ilhas (no nascimento e na morte, na alegria e no exílio).

Na Córsega, onde a França insular quase toca a Itália na vizinha Sardenha, no Mar Mediterrâneo, fica a Maison Bonaparte, museu na casa de três andares onde nasceu o imperador. Foi ali na capital Ajaccio, em 1769, que ele passaria seus primeiros nove anos diante de praias de areias brancas e águas turquesas. Hoje, o lugar guarda parte do acervo da família instalada na ilha desde o final do século XV. Segundo Vincent Cronin, autor de “Napoleão: uma vida” (editora Manole), foi ali que o general, primeiro cônsul e imperador da França herdou alguns dos “valores corsos” da carreira: senso de justiça, vingança e “uma obsessão um tanto doentia com mortes violentas”.
 
 
Uma fortaleza natural
 
Quem visse aquele homem entediado e doente cuidando de jardins e hortas, no final da vida, nem poderia imaginar seu currículo controverso. Após a Batalha de Waterloo na atual Bélgica, a última da carreira, Napoleão foi levado a Santa Helena, uma das ilhas mais remotas do mundo, cujo pedaço de terra a mais perto fica a 1.125km, na Ilha de Ascensão, no Atlântico Sul. Destino turístico de trilhas exigentes em terreno vulcânico e mergulhos em águas com visibilidade de até 40 metros, a ilha tem Napoleão como uma das principais atrações.
 
Vista aérea da Ilha de Santa Helena, território britânico no Atlântico Sul, onde Napoleão Bonaparte passou seus últimos anos de vida
 
Foi ali que ele passou recluso os últimos cinco anos e meio de vida, sob olhares de dezenas de soldados britânicos, na Longwood House, sobre um platô desprotegido dos ventos violentos. Aliás, esta é uma das razões para o primeiro aeroporto da ilha só ter sido inaugurado em 2016 e a primeira operação comercial ser apenas no ano seguinte, quando um Embraer 190 provou dar conta daquela ventania toda. Este chamado Território Ultramarino Britânico foi escolhido por sua localização remota, numa espécie de fortaleza natural a cinco de dias de navegação da Cidade do Cabo, na África do Sul.

“Os britânicos esperavam que Napoleão fosse esquecido logo. Mas estavam enganados, pois conseguiu manter contato com a Europa”, diz o chefe da Fondation Napoléon, Pierre Branda, em vídeo promocional do “2021 Année Napoléon”, série de atividades criadas na França para marcar o bicentenário e que vem provocando controvérsia, opondo quem vê Napoleão como herói e quem o vê como vilão sanguinário que não merece receber homenagens. 
 
 
Urna no Palácio dos Inválidos, em Paris, onde os restos mortais de Napoleão Bonaparte

 
Até o início da pandemia, a casa e o túmulo eram as atrações turísticas mais procuradas em Santa Helena. No próximo dia 5, os jardins serão abertos com toques de cornetas e leitura de trechos do diário de confidências do general Henri Bertrand, um dos colegas que acompanharam Napoleão em seu último exílio. Vale dizer que, desde 1840, seus restos mortais estão guardados em um túmulo de quartzito vermelho na cripta do Palácio dos Inválidos, um marco em Paris.

Napoleão era chegado a armas, sobretudo canhões, mas tinha uma queda por artes e inovações. Em Paris, introduziu a iluminação a gás na cidade, fez o primeiro calçamento da capital francesa na Rue du Mont Blanc e ordenou a construção do Arco do Triunfo. Em Roma, cujo modelo imperial inspiraria seu planos de expansão, criou praça, jardim e restaurou o Panteão.
 
 
Pedra no caminho
 
No Egito, durante a campanha para ocupar o nordeste africano e a Índia, onde atacaria os britânicos, o capitão Bouchard, que liderava o exército de Napoleão, descobriu a Pedra de Rosetta, que ajudaria, anos mais tarde, a decifrar hieróglifos egípcios. Em exposição no Museu Britânico de Londres, a peça de 196 a.C. é considerada a pedra mais famosa do mundo.
 
Descoberta por uma missão científica ordenada por Napoleão no Egito, a Pedra de Rosetta hoje em dia pode ser vista no British Museum, em Londres
 
Na América Latina, seu legado indireto foi a Missão Artística Francesa, comitiva de escultores, pintores e arquitetos que chegou ao Brasil em 1816, talvez em busca de trabalho após a queda de Napoleão.

A mesma Corte portuguesa que fugira às pressas de Lisboa com medo de uma invasão das tropas napoleônicas contrataria os serviços de artistas bonapartistas como Jean-Baptiste Debret, autor do gigantesco quadro “A coroação de D. Pedro I”, hoje no Palácio do Itamaraty, em Brasília, e cerca de 800 aquarelas, atualmente no Museu da Chácara do Céu, em Santa Teresa, que retratam o cotidiano do Rio naquele começo de século.
 
 
Calendário de mostras para marcar bicentenário de morte de Napoleão
 
Há diversos eventos programados na França. Muitos museus estão fechados por conta da pandemia e se preparam para reabrir. Na internet, é possível ter um aperitivo das exposições. Confira alguns destaques.

Napoléon? Encore!’. Artistas contemporâneos como a sérvia Marina Abramovic expõem trabalhos inspirados no militar. De 7 maio a 30 de janeiro de 2022, no Museu das Armas, em Paris (musee-armee.fr)

La mémoire des Bonaparte em Corse’. Dedicada aos monumentos públicos erguidos em homenagem aos Bonaparte. De 18 de maio a 11 de julho, no Castelo de Malmaison, em Hauts-de-Seine (musees-nationaux-malmaison.fr)

Dessiner pour Napoléon’. Mais de 1.300 documentos, como mapas e plantas, foram restaurados para a exposição. Abriu em março e vai até 19 de julho, no Arquivo Nacional, em Paris (archives-nationales.culture.gouv.fr)

Napoléon n’est plus’. Mais de 200 objetos relacionados aos mistérios da morte de Napoleão. Até 19 de setembro, no Museu das Armas, em Paris (www.musee-armee.fr)

L’exposition Napoléon’ — Peças de diversos museus, como móveis e objetos de arte, ajudam a recontar a vida do militar francês. Até 19 de setembro, no centro cultural Grande Halle de la Villette, em Paris (expo-napoleon.fr)
 
 
Fonte: O Globo