Entre 1618 e 1648, aconteceu na Europa um conflito que marcou a transição do feudalismo para a Idade Moderna. A Guerra dos Trinta Anos envolveu uma série de países no entorno da região onde hoje está a Alemanha, e teve como elemento catalisador as disputas religiosas decorrentes das reformas protestantes do século XVI. Mas as causas dessa guerra também incluem a luta pela afirmação do poder de monarquias européias, com disputas territoriais e conflitos pela hegemonia.
As causas da Guerra dos Trinta Anos também passam pelos problemas da aliança da dinastia dos Habsburgos e do Sacro Império Romano-Germânico com a Igreja Católica. Essa aliança de religião com Estado, uma herança medieval, não mais se adaptava a um mundo no qual o poder das monarquias nacionais era cada vez mais forte.
A vinculação entre o Império e a Igreja fazia com que os ideais de independência política tivessem um viés religioso, como é o caso da Boêmia, palco dos episódios que se constituíram no estopim do conflito.
Por que aconteceu a Guerra?
As tensões religiosas cresceram na Alemanha no último quarto do século XVI. Durante o reinado de Rodolfo II, a ação católica foi extremamente agressiva. Foram destruídas várias igrejas protestantes, além de uma série de medidas contra a liberdade de culto. Contra tais atitudes, foi fundada em 1608 a União Evangélica. Em resposta, foi fundada, no ano seguinte, a Liga Católica - o que permite imaginar que um conflito não demoraria para aparecer.
Na região tcheca da Boêmia, havia um impasse: a maioria da população era protestante, mas o rei, Fernando II, era católico. Fernando II era da dinastia dos Habsburgos, também duque da Estíria e da Áustria e futuro imperador do Sacro Império. Católico fervoroso, educado pelos jesuítas e herdeiro da aliança entre os Habsburgos e o papado, Fernando reprimiu violentamente os protestantes, destruindo templos e impondo o catolicismo como única religião permitida no reino.
Os Defensores da Fé, ramo boêmio da União Evangélica, lideraram a reação a Fernando. Invadiram o palácio real em 23 de maio de 1618, e atiraram os defensores do rei pela janela do segundo andar, episódio conhecido como a "Defenestração de Praga", considerado o marco inicial da guerra.
Período palatino-boêmio (1618-1624)
Comandados pelo conde Matias von Thurn, os protestantes obtiveram algumas vitórias, estendendo a revolta para outras regiões. A cidade de Viena (hoje capital da Áustria), centro do poder Habsburgos, foi sitiada em 1619. A coroa da Boêmia foi entregue a Frederico V, líder da União Evangélica e eleitor do Palatinado (território administrado por conde palatino).
É preciso lembrar que os protestantes não eram um grupo único. Havia grandes divergências entre luteranos e calvinistas, o que enfraqueceu os protestantes e abriu espaço para a contra ofensiva católica.
Em 8 de Novembro de 1620, um exército da Liga Católica, liderado pelo germânico João T'Serklaes Von Tilly, venceu os protestantes na Batalha da Montanha Branca. Após essa vitória muitos rebeldes foram condenados à morte e todos perderam seus bens.
O protestantismo foi proibido nos domínios imperiais e a língua tcheca substituída pela alemã. Em 1623, Fernando II da Germânia, imperador desde 1619, com a ajuda da Espanha e da região alemã da Baviera, conquistou o Palatinado de Frederico V. A coroa da Boêmia, até então escolhida por voto, tornou-se hereditária dos Habsburgos.
No final de 1624, o Palatinado, agora entregue a Maximiliano I, duque da Baviera, era novamente católico. Com isso teve fim o primeiro período conhecido como Palatino-Boêmio.
Período dinamarquês (1624-1629)
Essa segunda fase da guerra, que ficou conhecida como período dinamarquês, marcou o início da internacionalização do conflito.
Fernando II quis obrigar os protestantes a devolver as propriedades católicas que haviam sido tomadas. Contra essa medida, os protestantes pediram ajuda a Cristiano IV, rei da Noruega e da Dinamarca e também detentor do ducado de Holstein, no Sacro Império.
Fernando II
Protestante e interessado em obter territórios e reduzir o poder Habsburgo sobre seus domínios em Holstein, Cristiano declarou guerra contra os Habsburgos, contando com o apoio de guerreiros holandeses. Cabe lembrar que a Holanda, recém independente do reino espanhol dos Habsburgos, era predominantemente protestante.
Mas a ação militar holandesa, de 1625 a 1627, foi derrotada. Em 1629, foi publicado o Édito da Restituição, um documento que anulava todos os direitos protestantes sobre as propriedades católicas expropriadas a partir da Paz de Augsburgo. Em 22 de Maio de 1629, o rei Cristiano aceitou o Tratado de Lübeck, que o privava de mais alguns territórios germânicos, significando o fim da Dinamarca como potência européia. O imperador Fernando II alcançou o auge de seu poder.
Período sueco (1630-1635)
O terceiro período da guerra, chamado de período sueco (1630 a 1635), marcou o início da ação do cardeal de Richelieu, ministro de Luis XIII e verdadeiro governante da França. Apesar de ligado à Igreja Católica, o cardeal Richelieu queria barrar o avanço dos Habsburgos na Europa, o que o fez ficar do lado dos protestantes. Nesse sentido, Richelieu convenceu o rei da Suécia, Gustavo II Adolfo, a atacar o império de Fernando II.
Gustavo II Adolfo queria o domínio sobre o Sund, estreito que separa o mar do Norte e o mar Báltico e que garante controle comercial e estratégico da região. Para tanto, era necessária a obtenção de uma ilha ao norte da Dinamarca, dominada pelos Habsburgos.
Depois de uma série de vitórias contra as forças imperiais entre 1630 e 1632, Gustavo II Adolfo morreu na batalha de Lützen. Seus sucessores não tiveram o mesmo sucesso. Derrotados definitivamente na Baviera, em 1634, os suecos tiveram que se retirar do território alemão. O fracasso da tentativa de usar os suecos para derrubar os Habsburgos levou o cardeal Richelieu a lançar a França diretamente na guerra.
Período francês (1635-1648)
Em 1635, a França declarou guerra aos Habsburgos, iniciando o quarto e último período, chamado justamente de período francês.
O cardeal Richelieu, que chegou a apoiar protestantes para derrubar a dinastia Habsburgo, tocou guerra contra a Espanha, a Áustria e outros domínios habsburgos dentro da Europa. Richelieu defendia que o Estado deveria se pautar por parâmetros políticos, e não religiosos. Era partidário também do princípio da razão de Estado, fundamental nas relações internacionais da Europa moderna.
Tropas oponentes se enfrentam na batalha da Montanha Branca
Com o apoio dos Países Baixos, da Suécia e das regiões protestantes alemãs, Richelieu chegou a mobilizar um exército de mais de cem mil homens. Além de aniquilar o poder Habsburgo, seu objetivo era consolidar a França como principal potência continental européia.
Entre 1635 e 1644 os franceses e seus aliados impuseram uma séria de derrotas aos Habsburgos em todos os seus núcleos de poder na Europa, tornando sua posição insustentável. Já em 1645, representantes do Império de Fernando II da Germânia tentaram negociações de paz.
As hostilidades estenderam-se até 1648, quando o cerco sueco a Praga e francês a Munique, além da ameaça de ataque a Viena, levaram o imperador a capitular. Os termos de paz foram impostos pelos vencedores na chamada Paz de Vestfália, de 1648.
Entre as conseqüências, o tratado, que marcou o fim da guerra, deu independência aos Países Baixos (até então sob o domínio espanhol) e estabeleceu princípios de acordos entre os países utilizados até pela diplomacia e pelo direito internacional.
Também fortaleceu a importância do poder temporal - político, não religioso - nos Estados e a diminuição da presença de Igreja nas monarquias européias.
Piqueiros e mosqueteiros suecos em uma maquete no museu de Estocolmo