"No próprio dia da batalha, as verdades podem ser pinçadas em toda a sua nudez, perguntando apenas;
porém, na manhã seguinte, elas já terão começado a trajar seus uniformes."

(Sir Ian Hamilton)



quinta-feira, 28 de novembro de 2019

LANÇADO O EDITAL PARA O MESTRADO HUMANIDADES EM CIÊNCIAS MILITARES DO CENTRO DE ESTUDOS DE PESSOAL DO EXÉRCITO

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Quer fazer um mestrado em Ciências Militares com ênfase nas Ciências Humanas?


Foi lançado o edital do processo seletivo para o mestrado interdisciplinar de Humanidades em Ciências Militares do Centro de Estudos de Pessoal/Forte Duque de Caxias.

O Programa de Pós-Graduação Humanidades em Ciências Militares busca fomentar pesquisas nas áreas de Educação, Ciências Sociais, Psicologia, História e Serviço Social, entre outras vertentes do Colégio de Humanidades, em trabalhos de pesquisa e desenvolvimento aplicados aos problemas das Forças Militares.

Saiba como se inscrever acessando

http://www.cep.eb.mil.br/ultimas-noticias/337-cep-fdc-seleciona-candidatos-para-o-mestrado?fbclid=IwAR2G-oRkt5awWYJ1lhb5XUbs2rhmGPDbzUDr8Bgf1ZUnuu1dHk1uTnhZVgc



sexta-feira, 22 de novembro de 2019

ACADEMIA DA FORÇA AÉREA REALIZA A VI OLIMPÍADA DE HISTÓRIA MILITAR E AERONÁUTICA

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Academia da Força Aérea promove a VI Olimpíada de História Militar e Aeronáutica
 
A Academia da Força Aérea, instituição de educação superior da Força Aérea Brasileira, onde são formados os oficiais combatentes das especialidades Aviadores, Intendentes e Infantes, promoveu, nos dias 20 e 21 de novembro, a 6ª edição da Olimpíada de História Militar e Aeronáutica. Idealizada e organizada pelo coronel Cláudio Passos Calaza, professor de História Militar da Academia, a competição tem como objetivo estimular os cadetes ao estudo e pesquisa no campo, de forma lúdica e motivacional. 

Inicialmente realizada apenas no âmbito da AFA, com o passar dos anos e com o sucesso da competição, aos poucos a Olimpíada foi agregando equipes de outras instituições que enriqueceram ainda mais os propósitos do desafio. Escola Naval, Escola Preparatória de Cadetes do Exército e Instituto Tecnológico de Aeronáutica foram alguma das escolas que se incorporaram à Olimpíada. Neste ano de 2019, foi a vez da Academia de Polícia Militar do Barro Branco, da PMESP, fazer sua estreia, integrando-se ao desafio do conhecimento.

A equipe Tobias de Aguiar, da APMBB, fez sua estreia em grande estilo na Olimpíada.

A competição é realizada em duas jornadas, e engloba formas de avaliação diversificadas, como prova escrita, quiz, aula expositiva após sorteio de tema, questões do tipo “passa e repassa” e questões com respostas abertas, que são avaliadas por uma banca composta por professores expoentes da pesquisa em história militar no Brasil.

No corrente ano, na 6ª edição da Olimpíada, foram inscritas uma equipe do Instituto Tecnológico da Aeronáutica, duas da Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), uma da Academia de Polícia Militar do Barro Branco (APMBB) e sete da Academia da Força Aérea (AFA).

A disputa é acirrada, ponto a ponto. A banca, atenta, avalia o desempenho das equipes.

Após a realização das fases iniciais realizadas no primeiro dia, classificaram-se para as finais uma equipe da AFA, outra da APMBB e uma terceira da AMAN. Foi realizado o sorteio do tema único da aula a ser ministrada pelos competidores no começo da segunda jornada, que resultou no tema Guerra Assimétrica e Guerra Irregular.  Cabe ressaltar que esse sorteio foi realizado por volta das 21 horas, tendo as aulas que serem ministradas a partir das 13 horas do dia seguinte, ou seja, os competidores tiveram 17 horas, inclusive a madrugada, para pesquisarem e prepararem suas aulas.

Equipe da AMAN ministrando aula sobre guerra assimétrica. Cadete Zata, do 1º ano da AMAN, ministrando sua aula.

 No segundo dia, as equipes ministraram suas aulas com extrema qualidade de conteúdo e elevado nível de apresentação, ainda que com propostas metodológicas distintas, e foram avaliadas pela banca da Olimpíada. Em seguida, o sistema de Quiz, “passa e repassa” e questões com respostas abertas foi aplicado pela banca, culminado com o seguinte resultado final:

- 1º lugar: Equipe Shogun Tokugawa (AFA)
- 2º lugar: Equipe Brigadeiro Tobias de Aguiar (APMBB)
- 3º lugar: Equipe Ten Cel Villagran Cabrita (AMAN)

A equipe Shogun Tokugawa, da AFA, campeã da competição, foi composta pelos cadetes Quedinho, Pinheiro, Richard e Juann:

A equipe Shogun Tokigawa, da AFA, campeã da 6ª edição da Olimpíada
 
 

Alguns destaques da Olimpíada

- A AFA, anfitriã da Olimpíada voltou a vencer a competição depois de quatro anos, liderando-a de ponta a ponta.

- A APMBB estreou na olimpíada com um fantástico 2º lugar, acertando diversas questões de aeronáutica e de guerra, muitas delas não ministradas em seus currículos.

A estreante Academia de Polícia Militar do Barro Branco obteve a difícil segunda colocação geral na prova de conhecimento.

- A AMAN, que já venceu uma das edições da Olimpíada, e, contando com veteranos da competição, conquistou o 3º lugar, mas registrou um fato inédito na sequência da competição.  A jovem cadete Zata, do 1º ano da AMAN, foi primeira mulher a se classificar para as finais e a ser premiada, e tornou-se a primeira medalhista da Olimpíada de História Militar e Aeronáutica.  Parabéns para ela e para a cadete Amanda, da AFA, que também participou da competição.

O editor do Blog Carlos Daróz-História Militar e membro da banca avaliadora com a cadete Zata, do 1º ano da AMAN: a primeira mulher a chegar às finais e a ser premiada na Olimpíada de História Militar e Aeronáutica da AFA.
 
Por fim, o Brigadeiro-do-Ar David, comandante da AFA, encerrou a competição e conduziu a premiação das equipes vencedores.

O comandante da AFA, Brigadeiro-do-Ar David, entrega a medalha e cumprimenta o cadete Pinheiro, integrante da equipe campeã das Olimpíadas.

Também foi feita uma homenagem especial à tenente historiadora Carolina Fuzaro, uma das que mais trabalhou para a implantação da Olimpíada e que se despede da AFA no próximo mês. 

Junto à tenente Carolina Fuzaro, que se despede do corpo docente da AFA, e do suboficial Sérgio Ramos. Ambos idealizadores e verdadeiros esteios da Olimpiada.


O editor do Blog Carlos Daróz-História Militar teve a honra de compor, pela 5ª vez consecutiva, a banca avaliadora da competição.

Um registro especial: nada disso seria possível sem a criatividade, imaginação e perseverança do coronel Calaza, professor da Academia. 

Algumas imagens da competição:

Palestra de abertura das Olimpíadas.  Dr. Hugo Studart.


Equipes tentando solucionar uma questão desafiadora.


A plateia de Cadetes do Ar muito atenta à competição.


Intervenção de Carlos Daróz, explicando uma das questões da Olimpíada.


O supremo prêmio: as medalhas ofertadas pelo Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica.

Parabéns à Força Aérea Brasileira e à AFA – o Ninho das Águias – pela iniciativa e pelo sucesso da competição. E que venha a 7ª edição da Olimpíada em 2020.

Terminamos aqui com o significativo lema da AFA



"MACTE ANIMO! GENEROSE PUER, SIC ITUR AD ASTRA"
(Ânimo! Jovem, por este caminho se chega às estrelas)


MAX HASTINGS: AS GUERRAS DE 1914 E DE 1939 NÃO SÃO MORALMENTE DIFERENTES

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Em Catástrofe 1914, o historiador, um dos grandes especialistas na Segunda Guerra Mundial, visita pela primeira vez as trincheiras e a frente de combate da Grande Guerra


O historiador Max Hastings (Londres, 1945), um dos grandes especialistas na Segunda Guerra Mundial, visita pela primeira vez as trincheiras e a frente de batalha da Grande Guerra em seu livro Catastrophe 1914: Europe Goes to War.

Trata-se de uma obra muito mais militar e com menos sutilezas do que o livro de Margaret MacMillan, mas com a habitual carga de malícia, inteligência, senso de humor e conhecimento do meio bélico que caracteriza o autor. Ao contrário do que faz sua colega, no ensaio de Hastings as balas logo começam a zunir, e muito.

Cabe destacar o inovador relato da brutal invasão da Sérvia pelo exército austro-húngaro – Hastings salienta que os sérvios foram proporcionalmente os que mais baixas sofreram na luta – e a descrição das tremendas falhas e limitações dos generais de ambos os lados (sobre John French, comandante da Força Expedicionária Britânica, o autor diz sem rodeios que era “estúpido a não mais poder”).

Soldados alemães utilizando máscaras contra gases preparam suas granadas em uma trincheira, durante a 1ª Guerra Mundial


Também chama a atenção a afirmação de que o célebre plano Schlieffen, que supostamente daria uma rápida vitória à Alemanha, era “fantasioso” e não poderia funcionar de maneira nenhuma em um mundo no qual havia ocorrido uma revolução no poder destrutivo das armas, mas onde as tecnologias de transporte e comunicação ainda estavam muito atrasadas. De fato, esse paradoxo, salienta o autor, é o que transformou a I Guerra Mundial em um inferno estático de barro e trincheiras.

Como é habitual em seu trabalho, Max Hastings se mostra genial na descrição da experiência do combate e na seleção de testemunhos e relatos. Uma das características essenciais (e surpreendentes) da sua visão sobre a Grande Guerra é que ele não acredita que o conflito pertença a uma ordem moral diferente da Segunda Guerra Mundial.

Ou seja, para ele não houve uma “guerra má” e uma “guerra boa”, uma guerra que foi apenas um massacre inútil, e outra que era necessária (para acabar com os nazistas). Ele considera que em ambos os casos era preciso travá-las para deter os alemães, cujas intenções ele julga tão malévolas em uma luta quanto na outra. “Basta ver a lista de compras do Kaiserreich [império alemão] em agosto de 1914, tudo o que eles pensavam em adquirir”, justifica. “Anexariam grandes pedaços da Rússia e da França, Luxemburgo, transformariam a Holanda e a Bélgica em Estados vassalos… uma lista terrível”. 

Hastings prossegue: “É difícil hoje convencer as pessoas de que deter os alemães na Grande Guerra foi uma causa que valeu a pena, prepondera a ideia dos poetas – Owen, Sasoon – de que foi uma carnificina absurda, mas basta pensar em como teria sido a Europa se as potências centrais vencessem.  Muitos criticam a Paz de Versalhes porque, dizem, foi cruel com os alemães, mas não imaginam o tipo de paz que a Alemanha teria imposto. A liberdade, a justiça e a democracia europeias teriam saído muito prejudicadas”.

Para o historiador, além disso, a culpa da guerra recai especialmente sobre a Alemanha. “Pode-se discutir se foi ela a responsável pelo estopim, mas não o fato de que se havia uma potência que podia ter detido o mecanismo que levou à guerra era a Alemanha. A grande ironia é que, se ela não tivesse ido à guerra então, seu domínio sobre a Europa teria ficado assegurado em vinte anos, por razões industriais”.

O historiador militar britânico Max Hastings, especialista na Segunda Guerra Mundial, realiza uma "incursão" na Grande Guerra.


Pergunto se ele acredita que o kaiser – cuja estátua de cera, no começo do conflito, foi transferida da Galeria Real do Museu Madame Tussaud, em Londres, para a ala denominada Câmara dos Horrores (é ele quem conta) – e Hitler são comparáveis. “A comparação é possível. Recentemente, gravando um programa com MacMillan em Versalhes, ela me disse: ‘Não é paradoxal que ninguém nunca tenha perdoado Hitler por ser louco, mas que o kaiser seja, sim, desculpado pelo mesmo motivo?’. O kaiser comandou coisas terríveis, como os massacres na África e o assassinato sistemático de civis na Bélgica em 1914. E depois da batalha de Tannenberg ele queria enviar os prisioneiros russos para a península da Curlândia [na atual Letônia] para lá deixá-los morrer de fome. Nós nos empenhamos em ver o kaiser como uma figura ridícula, mais do que malvada. Tinha aspectos ridículos, mas Hitler também tinha”.

Para Hastings, o elemento bélico que melhor define a Primeira Guerra Mundial não é a metralhadora, o aeroplano ou o gás, e sim ... o arame farpado! “A descoberta de que ele poderia ser usado na guerra como com os animais, para bloquear a passagem dos soldados, foi extremamente relevante na luta.” 

Eu lhe pergunto quem considera ser o personagem mais representativo da Primeira Guerra Mundial. Joffre? O Barão Vermelho? O almirante Fisher? Lawrence da Arábia? “Lawrence? Não era representativo exceto de si mesmo! Não, possivelmente esse veterano que cito no livro, Henry Mellersh, que escreveu: ‘Eu e meu companheiro entramos na guerra esperando uma aventura heroica e com uma firme confiança na retidão de nossa causa; acabamos terrivelmente desiludidos quanto à natureza da aventura, mas convencidos ainda de que nossa causa era correta e de que não tínhamos lutado em vão”.

Fonte: El País

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segunda-feira, 18 de novembro de 2019

VI OLIMPÍADA DE HISTÓRIA MILITAR E AERONÁUTICA DA AFA

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Vem aí a 6ª edição da Olimpíada de História Militar e Aeronáutica da Academia da Força Aérea (AFA).

No já tradicional desafio do conhecimento, participam equipes da própria AFA, da Academia Militar das Agulhas Negras, da Escola Naval, do Instituto Tecnológico de Aeronáutica e da Escola Preparatória de Cadetes do Exército.

Mais uma vez, o editor do Blog Carlos Daróz-História Militar participará como membro da banca avaliadora e da organização do evento.









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quinta-feira, 14 de novembro de 2019

A REVOLUÇÃO ACREANA (1902-1903)

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Como um militar gaúcho no comando de um bando de seringueiros destreinados redefiniu o mapa do Brasil e conquistou a região oeste da Amazônia


Por Altino Machado

Era madrugada de 6 de agosto de 1902. A guarnição boliviana ainda dormia na cidade de Xapuri, que muitas décadas depois, já como cidade brasileira, se tornaria famosa por causa do sindicalista Chico Mendes. Um pequeno grupo de 33 seringueiros brasileiros, armados com rifles, desembarcou de suas canoas. Eles subiram o barranco íngreme do Rio Acre e tomaram posição em pontos estratégicos, divididos em três grupos. Os bolivianos estavam exaustos. Haviam comemorado na véspera a data nacional de seu país, com muito, muito álcool. O militar brasileiro Plácido de Castro, que comandava os seringueiros, seguiu em silêncio até a grande casa de madeira onde funcionava a Intendência do país vizinho. Dios Fuentes, o intendente e maior autoridade do local, despertou de um salto e, pensando tratar-se de um compatriota, ainda com sono, foi avisando:
- Es temprano para la fiesta.
Castro retrucou:
- Não é festa, senhor intendente. É revolução.


Terra sem lei

Tão logo o intendente boliviano se rendeu, os brasileiros recolheram as armas e aprisionaram toda a guarnição. Era o começo da Revolução Acreana. Com a população de Xapuri em festa "muitos confundiram o movimento com o Dia da Independência da Bolívia -, Plácido de Castro anunciou o sucesso da revolta e justificou a ação com o argumento de que em troca de favores financeiros, La Paz pretendia entregar a região ao capital norte-americano e britânico na forma do chamado Bolivian Syndicate. A ideia da empresa era ocupar com soldados e explorar o local por pelo menos 30 anos. O Acre era parte da Bolívia, mas a cada ano, entre o final do século 19 e o início do século 20, aumentava o número de brasileiros em suas terras, especialmente nordestinos, que corriam para lá em busca da riqueza da floresta.

Plácido de Castro (sentado ao centro) com integrantes de seu estado-maior

A Bolívia estava disposta a recuperar o território por causa dos lucros que poderia aferir com a borracha, uma das commodities mais desejadas em um mundo que começava a ser desbravado pelo automóvel e pelo uso industrial do látex. O governo brasileiro não pleiteava a região. Portugueses e espanhóis haviam definido que o Acre era boliviano desde 1750, com o Tratado de Madri. Em 1898, o Brasil reconheceu que o território pertencia mesmo à Bolívia. Mas, como era distante, de difícil acesso e em plena Floresta Amazônica, os bolivianos não se dispuseram a colonizar a região. Até aparecer o interesse internacional pela borracha.

O gaúcho Plácido de Castro chegou à Amazônia em 1899, aos 26 anos, depois de viver no Rio de Janeiro e em São Paulo. Três anos depois, seringalistas (os compradores e distribuidores do látex) viram no militar, que havia lutado na Revolução Federalista do Rio Grande do Sul, a oportunidade para ampliar seu território e seus ganhos. Ofereceram a Castro armas, munição e dinheiro para enfrentar os bolivianos. Ele, imaginando que poderia ficar rico demarcando os latifúndios da seringa (era formado em agrimensura), topou treinar e comandar 2 mil seringueiros, a maioria armada com facões.


Estado soberano

A Revolução Acreana, que começou em 6 de agosto, durou pouco. Terminou em 24 de janeiro de 1903, e as ações mais agudas, decididas rapidamente, facilitaram o desfecho favorável aos brasileiros. De acordo com o especialista em história do Acre Marcos Neves, o principal fator do sucesso da empreitada foi o fato de pela primeira vez se formar um exército organizado na região. "Era composto de seringueiros sem experiência, mas foi suficiente para direcionar corretamente os esforços militares necessários", afirma Neves. "E nesse aspecto a experiência de Castro foi fundamental." As tropas bolivianas eram minúsculas.



Depois da vitória militar, coube a Castro organizar a vida política e administrativa do novíssimo Estado Independente do Acre. Seu decreto número 1, de 26 de janeiro de 1903, mandava aplicar a lei brasileira à justiça civil, criminal e comercial, até que se promulgasse a Constituição do Estado soberano. Considerou válidos todos os títulos de propriedade, definitivos ou provisórios, expedidos pela Bolívia e pelo estado do Amazonas. Definiu o português como língua oficial e adotou o padrão monetário do Brasil. Mas encontrou inimigos em seus antigos aliados. "Rodrigo de Carvalho e Gentil Norberto, os principais articuladores da Revolução Acreana com o governo do Amazonas, tornaram-se seus adversários", afirma o professor Eduardo Carneiro, da Universidade Federal do Acre. "Os dois acusavam Plácido de Castro, entre outros, de ter acumulado riquezas com a revolução." Em carta ao Barão do Rio Branco, Rodrigo de Carvalho, ministro da Fazenda, Justiça e Guerra do Estado Independente, não poupou acusações ao "libertador do Acre" em correspondência ao ministro do Exterior brasileiro. "Plácido de Castro não é honesto; é feroz e sanguinário ", registrou.

Nos meses que seguiram à vitória de Plácido na Revolução Acreana, a diplomacia brasileira agiu rápido. O Barão do Rio Branco convenceu os bolivianos a evitar um conflito armado de consequências imprevisíveis na região.


Primeiro território

No dia 17 de novembro de 1903, o Acre foi finalmente incorporado ao Brasil com a assinatura do Tratado de Petrópolis. O país pagou à Bolívia 2 milhões de libras esterlinas (o equivalente hoje a 640 milhões de reais) e indenizou o poderoso Bolivian Syndicate com 110 mil libras (cerca de 35 milhões de reais) por causa da rescisão de contrato de arrendamento que havia sido firmada com o governo boliviano. Também cedeu terras em Mato Grosso e se comprometeu a construir a Estrada de Ferro Madeira-Mamoré para escoar a produção boliviana pelo Rio Amazonas.

Tropas de Plácido de castro em marcha no Acre


No princípio de 1904, o Acre se tornou o primeiro Território Federal da história brasileira. Exemplo de um novo sistema político-administrativo, não previsto na Constituição, pelo qual seria gerido diretamente pela Presidência da República, a quem caberia nomear seus governantes e arrecadar os impostos. Transformado em herói pelos moradores locais, Plácido de Castro tornou-se uma ameaça para as novas autoridades brasileiras que passaram a governar o território. O presidente da República, de seu gabinete no Rio de Janeiro, a mais de 4 mil km de distância dos problemas acreanos, nomeava sucessivamente militares, magistrados ou políticos derrotados em eleições para governar o primeiro Território Federal.

Afastado do poder, mas ainda com muito cacife político, Castro virou latifundiário e gerenciava um seringal, até que resolveu voltar à política defendendo a criação de um Estado independente. Em agosto de 1908, a situação era de conflito entre ele e o prefeito de Alto Acre, o coronel Gabino Besouro, que o acusou de planejar uma revolta armada. Nesse cenário, depois de comemorar o quinto aniversário da Revolução Acreana, o militar gaúcho deixou Rio Branco em direção ao seu seringal, o Capatará, com seu irmão, Genesco, dois amigos e um funcionário. No dia 9, o grupo cruzou o Igarapé Distração preocupado com o alerta de Castro, conhecedor da região: "Este é o lugar das emboscadas". Mal atravessaram, foram recebidos por 14 homens armados. O militar levou dois tiros à queima-roupa: um no braço, outro que perfurou seu pulmão esquerdo. Ainda assim, conseguiu esporear o cavalo e fugir. Foi socorrido pelo seringalista João Rola, que apareceu com 20 homens e o levou para sua casa, no seringal Benfica. O local foi atacado à noite e no dia seguinte pelo mesmo grupo da emboscada. Antes de morrer, às 16h do dia 11 de agosto, aos 35 anos, pediu ao irmão que levasse seus ossos do Acre. Segundo Genesco, estas foram suas últimas palavras:

- Direi como aquele general africano: "Esta terra que tão mal pagou a liberdade que lhe dei é indigna de possuí-los". Ah, meus amigos, estão manchadas de lodo e sangue as páginas da história do Acre...

Soldado acreano

O nome de Plácido de Castro está inscrito no Livro dos Heróis da Pátria, no Panteão da Liberdade e da Democracia, em Brasília, desde 2002, ao lado, entre outros, de dom Pedro I, Duque de Caxias, Santos Dumont e Chico Mendes que, nascido em Xapuri, não fosse pelo militar gaúcho, seria um famoso boliviano.


Meu reino por dois cavalos

Na Bolívia, a culpa pela perda do Acre para o Brasil é creditada até hoje ao presidente Mariano Melgarejo (1820-1871). Ele negociou com o Brasil o Tratado de Ayacucho, de 1867, sobre os limites entre os dois países ainda durante a Guerra do Paraguai. O governo brasileiro, temeroso de criar uma fronteira hostil no norte, topou renegociar o Tratado de Madri, de 1750. O cônsul brasileiro na Bolívia, Regino Correa, conhecia a paixão de Melgarejo por equinos e o presenteou, antes de começar as negociações com um casal de cavalos brancos. Conta-se que o boliviano ficou tão feliz com o presente que deu de presente ao Brasil "dois dedos " de terra marcados no mapa de seu gabinete, pois se tratava de uma área despovoada. O historiador Marcos Neves afirma que a história é "estranha " e muito pouco conhecida no Brasil. Mas reconhece que, à época, era importante para o país neutralizar qualquer possível aliança entre Bolívia e Paraguai.


"A posteridade o julgará" - A furiosa carta da mãe de Plácido de Castro

Em 1929, o senador J. Pires Ferreira apresentou um projeto de lei que promovia postumamente Plácido de Castro a general. A honraria não convenceu a mãe do militar, Zeferina, de 92 anos, que enviou uma carta ao político. A seguir, os principais trechos.

"Chegando ao meu conhecimento que transita pelo Senado Federal um projeto de lei de autoria de Vossa Excelência dando honras de general ao meu pranteado filho, J. Plácido de Castro, e de coronel a dois dos principais cúmplices no seu assassinato - Gentil Tristão Norberto e Antônio Antunes de Alencar -, venho pedir-lhe o grande favor de retirar o nome do meu filho do mesmo projeto.

Em vida, ele nada pediu à sua pátria e nada recebeu além da perseguição, da injúria, da calúnia e da morte por mão das principais autoridades federais; é justo que depois de morto, quando de nada precisa, também nada receba. Os governos já tripudiaram muito sobre o seu nome e sobre a sua memória...

É preciso que a pátria seja coerente: com honrarias póstumas ela não ressuscita a vítima nem lava as máculas do passado. Continue ela a proteger, amparar e distinguir os assassinos, procurando apagar os vestígios da covarde tragédia de 9 de agosto de 1908 e a transformar os criminosos em heróis. Isso é justo: mas que aos 92 anos eu veja o nome do meu filho servir de escada para a ascensão dos seus matadores, isso é demais...

A posteridade julgará meu filho, e é o bastante."


A sequência dos conflitos

Tomada de Xapuri (6 de agosto de 1902)
Início da última e mais sangrenta fase da Revolução Acreana. Xapuri foi tomada pelo exército revolucionário acreano, sem o disparo de nenhum tiro.

1º Combate da Volta da Empresa (18 de setembro)
Tropas de Plácido de Castro são emboscadas e derrotadas na Volta da Empresa (atual Rio Branco) por um pelotão boliviano comandado pelo general Rozendo Rojas.

Combates do Telheiro e do Bom Destino (23 e 24 de setembro)
De Puerto Alonso (atual Porto Acre) partem ataques bolivianos contra os seringais Telheiro e Bom Destino, derrotados pelos revolucionários brasileiros.

2º Combate da Volta da Empresa (5 a 15 de outubro)
Plácido de Castro ataca de novo a Volta da Empresa, que tinha posição estratégica para o domínio do médio Rio Acre. Depois de dez dias de luta toma o povoado.

Combate do Bahia (11 de outubro)
De Xapuri, uma coluna revolucionária parte para o barracão do Igarapé Bahia, mas são atacados e derrotados pelos seringueiros e camponeses bolivianos que formavam a Coluna Porvenir.

Combates de Santa Rosa e Costa Rica (Novembro e dezembro)
Para consolidar o domínio do médio e do alto Acre, Plácido de Castro ataca povoados bolivianos às margens dos rios Abunã e Tahuamano, destruindo-os e vingando o massacre de brasileiros no igarapé Bahia.

Combate de Porto Acre (15 a 24 de janeiro de 1903)
Depois de seis meses de guerra, Plácido de Castro e seus seringueiros vencem o exército regular da Bolívia e tomam o quartel-general em Puerto Alonso. Foi a vitória definitiva da Revolução que tornou o Acre brasileiro.

Fonte: Aventuras na História