Bombardeiros atingiram o centro e a periferia de Berlim e vingaram ataques contra Moscou.
Por Aleksandr Korolkov
Às 21h de 7 de agosto de 1941, no 47º dia de combates contra a Alemanha durante a Segunda Guerra Mundial, 15 bombardeiros soviéticos DB-3 e Il-4 levantaram voo da base aérea do arquipélago de Moonsund, no mar Báltico, em direção à capital alemã, Berlim. Eles tinham que superar 1.765 km sobre o território inimigo e enfrentar uma defesa antiaérea bem organizada, contra a qual suas únicas armas eram a surpresa e a altitude.
O Exército Vermelho, tendo recuado por mais de um mês, na época defendia com grande dificuldade Smolensk, na Rússia, e Kiev, na Ucrânia. A Luftwaffe (força aérea alemã) bombardeava Moscou desde 21 de julho, e seu comandante, Hermann Goering, sabendo das grandes perdas sofridas pela aviação soviética e da passividade dos ingleses, fez a famosa declaração de que "nenhuma bomba cairá sobre a capital do Reich". Sob essas circunstâncias, as explosões das bombas em Berlim provaram ao inimigo e ao mundo que a retirada da aviação soviética da equação da guerra havia sido prematura.
Os aviões britânicos pararam de visitar o céu de Berlim regularmente em janeiro de 1941, depois que seus comandantes perceberam que o Terceiro Reich reagrupava a aviação para atacar o leste europeu. A cidade vivia uma vida pacífica e rotineira, em que apenas soldados e empresas de defesa se lembravam de batalhas que ocorriam em algum lugar distante. Assim, o ataque dos bombardeiros soviéticos permitiu que os moradores da capital do Reich sentissem as mesmas emoções que tomaram conta dos moscovitas durante o primeiro bombardeio alemão na cidade, na madrugada de 21 para 22 de julho.
O ataque soviético foi precedido por uma complexa jornada de sete horas desde a ilha de Saaremaa, na Estônia
Para que voassem até Berlim e voltassem em sua altitude máxima, os DB-3 foram despojados de sua blindagem e tiveram que decolar rapidamente de pistas curtas, construídas para caças. Na madrugada de 8 de agosto, o silêncio foi quebrado pelas palavras do responsável pelo sistema de rádio soviético, Vasili Krotenko, que disse a bordo de uma das aeronaves: "Meu lugar é Berlim! A tarefa foi cumprida. Estamos voltando à base!".
O ataque soviético foi precedido por uma complexa jornada de sete horas desde a ilha de Saaremaa, na Estônia, até Szczecin, na Polônia, e depois Berlim. Para escaparem da defesa antiaérea nazista, foi necessário voar a uma altitude de 7.000 metros, na qual a temperatura fora do avião chegava a 40 graus negativos. Devido à ausência de oxigênio, os pilotos tiveram que trabalhar com máscaras o tempo todo. O combustível estava no limite para se esgotar e não havia chances para erro. Se a tripulação se desviasse da rota, corria o risco de não poder retornar à base.
Os alemães foram pegos de surpresa pelos bombardeiros da URSS, e testemunhas chegaram a afirmar que as forças de defesa antiaérea nazistas encontraram as aeronaves, mas achando que fossem alemãs, sugeriram que se dirigissem à base aérea mais próxima.
Berlim foi bombardeada por apenas cinco das 15 aeronaves que partiram na missão: a atividade da defesa antiaérea alemã e a falta de combustível obrigaram os remanescentes a atacar a periferia da cidade, mas o recado foi dado pelas tripulações soviéticas.
Os ataques causaram incêndios e pânico na cidade. Até mesmo de uma grande altitude, os DB-3 soviéticos puderam escolher os alvos em uma grande e bem iluminada cidade. O blecaute começou somente um minuto após o início da invasão.
O escritor e correspondente militar N.G. Mikhailovski, que testemunhou esses acontecimentos, descreveu o ocorrido a bordo de um dos aviões: "As fábricas da Siemens-Schuckert eram o nosso alvo, mas os pilotos sonhavam em chegar ao Reichstag ou à Chancelaria do Reich. Ivan Rudakov congelou-se imóvel na metralhadora. As mãos de Preobrajenski estavam congelando no manche. Mas isso não importava. O mais importante é que cheguemos ao alvo. Nosso sonho era chegar, a qualquer custo. E nós chegamos! A grande cidade estava bem visível a uma altura de sete quilômetros. Tomada por milhares de luzes, ela se estendia como uma aranha. Não nos esperavam. De fato, Goebbels foi afoito em declarar a destruição da aviação soviética... A voz do navegador: ‘Nós estamos sobre o alvo!’. O avião se balançou e elevou-se de leve. Na cabine surgiu o cheiro familiar do funcionamento das chaves que ligam as bombas. Pesadas bombas caem... ‘Isso é por Moscou, por Leningrado!’, escutamos a voz rouca de Khokhlov", relatou.
Berlim após o bombardeio dos aviões soviéticos
Apesar de terem sido lançados folhetos junto com as bombas, o comando alemão tentou esconder o fato de que aeronaves soviéticas haviam cruzado o céu de sua capital. As estações de rádio alemãs noticiaram o ocorrido como uma tentativa frustrada de 150 aviões britânicos de chegar a Berlim. De acordo com a imprensa alemã, apenas algumas aeronaves conseguiram e seis delas foram abatidas, provocando os incêndios. Na realidade, os pilotos soviéticos só perderam uma aeronave na missão. A invenção da propaganda alemã logo foi desmentida por uma mensagem da BBC, que disse que na noite de 7 para 8 agosto aviões britânicos não voaram sobre o céu de Berlim.
Em 8 de agosto, o serviço de informações soviético, Sovinformburo, declarou ao país inteiro que os bombardeios ocorridos em Moscou nos dias 22 e 24 de julho, que mataram centenas de moradores, haviam sido vingados.
Os membros da tripulação da aeronave sob o comando do Coronel Preobrajenski foram agraciados com o título de Heróis da União Soviética. Stalin assinou um decreto determinando que "nas ações no centro político do inimigo, para cada bombardeio, cada pessoa da tripulação receberá um prêmio em dinheiro no valor de 2.000 rublos". Isso era muito dinheiro na época, mais de quatro vezes a recompensa usual para um bombardeio bem-sucedido.
Os bombardeios seguintes das tripulações soviéticas não tiveram a mesma sorte. O elemento surpresa pode ser usado somente uma vez.
"Em 9 de agosto houve um novo ataque à capital nazista. Ele era consideravelmente mais difícil do que o anterior. Embora o clima tenha melhorado, nós voávamos em rajadas contínuas de artilharia antiaérea. Entre Szczecin e Berlim, os ataques vindos do chão pararam de repente, e no céu noturno surgiram caças inimigos. Dois aviões alemães com luzes brilhantes voaram quase que em cima de nós. As mãos de Rudakov coçavam para abrir fogo, o alvo era muito tentador e estava tão próximo. Mas era arriscado revelar-se. Dez minutos mais tarde, o nosso avião mergulhou de novo num mar de artilharia antiaérea. O nosso navegador disse: ‘Cinco minutos para o alvo’", relembra Mikhailovski sobre a segunda missão de ataque a Berlim.
Partindo das ilhas próximas a Leningrado (hoje São Petersburgo), até 5 de setembro os pilotos realizaram nove missões envolvendo 86 aeronaves, lançando 21 toneladas de bombas e perdendo 18 aviões devido ao fogo antiaéreo e avarias.
Os voos levavam as forças físicas e mentais a um limite máximo de tensão. Às vezes, já perto da base aérea, as mãos dos pilotos não podiam mais lidar com o manche, os olhos se fechavam pela fadiga. Não podendo voar as últimas centenas de metros até a pista de pouso, os aviões às vezes caíam. Foi assim que morreu a tripulação do tenente N. Dashkovski.
Os voos soviéticos se interromperam depois do início das batalhas pela ilha de Moonsund, em 7 de setembro de 1941, mas na ofensiva seguinte da Alemanha, em julho de 1942, os moradores da capital do Reich novamente viram aviões com estrelas vermelhas em suas asas.
Fonte: Gazeta Russa
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