A rogátina, arma dos primórdios da civilização eslava, ajudou os russos a dominar as vastas florestas e combater os perigos da mãe natureza.
Por Alexandr Verchínin
A rogátina é uma arma dos primórdios da civilização eslava. A Europa praticamente não conheceu análogos. Somente os vikings, vizinhos e velhos inimigos dos eslavos, produziram algo similar. Visualmente, podemos comparar a rogátina a uma lança, mas com uma significativa diferença: o seu tamanho e peso.
A ponta de uma lança comum raramente pesava mais de 400 gramas. O peso do topo metálico da rogátina (conhecido por rojón) podia chegar a 1 kg. O seu comprimento era de cerca de meio metro, dois terços do qual eram parte de contato direto em combate: uma lâmina alargada de dois gumes em forma de folha de louro. A espessura do rojón chegava a alcançar um centímetro e meio. Na verdade, tratava-se basicamente de uma poderosa adaga que se colocava na ponta de uma grande vara (o iskepiche) cujo comprimento era maior do que a estatura de um homem. A rogátina permitia furar ou cortar a carne, sendo que as feridas deixadas por ela eram particularmente profundas e largas.
Esta arma tão terrível foi inventada pelos eslavos antigos para conseguirem caçar o senhor dos bosques – o urso. Bastaria em princípio um golpe dado com ela para causar um ferimento mortal ao terrível animal. Mesmo em baixo da lâmina havia uma cruzeta fixada transversalmente. O urso lançava instintivamente as patas a essa cruzeta com lâmina e ele mesmo se cortava nela. Daí vem o provérbio russo que se usa até hoje: “Lançar-se ao rojón”, que significa colocar-se em perigo ou provocar perigo para si mesmo.
A rogátina ajudou o homem russo a conquistar as vastas florestas e a lutar contra os perigos que lhe preparava a mãe natureza. Mas ela resultou também ser uma excelente arma de combate. Já as crônicas do início do século XII mencionam a rogátina como a arma dos combatentes russos. Cem anos depois, a invasão tártaro-mongol marcaria o início de uma nova era no desenvolvimento da arma branca russa, no entanto, a forma da rogátina funcionava tão bem que ela permaneceu inalterada durante cinco séculos. Era usada principalmente nos combates a pé.
Cavaleiro russo do século XIII armado com uma rogátina
Mais do que uma vez encontramos crônicas sobre o uso da rogátina por parte dos guerreiros russos. Em 1377, esta poderosa arma não salvou o príncipe de Nijni Novgorod de uma derrota esmagadora no rio Piana. Ninguém esperava o ataque das tropas tártaras, por isso muitos dos guerreiros da corte estavam bêbados e nem sequer tiveram tempo para encaixar a lâmina da sua rogátina na vara. Mas em 1444, o exército russo, armado com rogátinas, rechaçou com sucesso o ataque dos tártaros a Riazan. O uso militar das rogátinas foi mantido até o final do século XVII.
As pessoas ricas podiam se permitir a ter alguns tipos de armas particularmente luxuosos. Uma verdadeira obra-prima dos antigos armeiros é a rogátina do príncipe Boris de Tver, forjada no início do século XV. No seu aro de encaixe, a continuação da lâmina usada para fixar o rojnó na vara tinha uma esplêndida gravura de prata. O artista gravador transmitiu assim toda a história do heroísmo e morte trágica às mãos dos tártaros do príncipe Mikhail, um antepassado do dono da arma. Nos arquivos do Palácio do Arsenal, no Kremlin, encontrarmos descrições das rogátinas cerimoniais dos czares Ivan, o Terrível e Boris Godunov. Como uma das insígnias reais, elas eram levadas atrás do czar em celebrações especiais.
A belíssima rogátina do príncipe Boris de Tver
No exército reformado por Pedro I, a baioneta foi adotada como a principal arma branca da infantaria. No entanto, a rogátina continuou sendo amplamente usada como arma de caça. Ainda no início do século XX, o mujik russo ia para o bosque caçar ursos com ela. E não apenas o mujik. Um dos passatempos favoritos do imperador Aleksander II (1818-1881) era a caça ao urso com rogátina. O czar, fisicamente forte, não tinha medo de entrar em combate corpo a corpo com o senhor da floresta. Testemunha de uma dessas lutas foi Otto von Bismarck, que na época era embaixador da Prússia na Rússia. O incomum lazer da caça era também apreciado pelo conde Tolstói, que quase morreu nas garras de um animal raivoso.
Fonte: Gazeta Russa
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