"No próprio dia da batalha, as verdades podem ser pinçadas em toda a sua nudez, perguntando apenas;
porém, na manhã seguinte, elas já terão começado a trajar seus uniformes."

(Sir Ian Hamilton)



sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

A MORTE DO ESPIÃO VIOLINISTA

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Apaixonado por música, o jovem Fernando Buschman foi o primeiro brasileiro a morrer durante a Primeira Guerra Mundial.  Preso e condenado por espionagem, foi fuzilado pelos britânicos em 1915


Curiosamente, a primeira vítima nacional da Grande Guerra a perder a vida foi um brasileiro naturalizado, Fernando Buschman, fuzilado na Torre de Londres, após ter sido condenado por realizar espionagem em favor da Alemanha. Fernando nasceu em Paris, em 1890, mas veio ainda bebê para o Rio de Janeiro, onde o pai, Francisco, alemão naturalizado brasileiro, tinha uma loja de instrumentos musicais.

Após se formar em engenharia na Áustria, retornou ao Rio de Janeiro para trabalhar com o irmão na loja da família, mas os negócios não prosperaram, o que levou Buschman a fazer nova sociedade com o brasileiro Marcelino Bello, em uma importadora e exportadora de produtos alimentícios. Culto, refinado, músico de qualidade, apaixonado pelo violino e pela aviação, então uma novidade, Fernando Buschman passou a viajar constantemente para a Europa, onde se casou com a filha de um milionário alemão. Quando a guerra começou em 1914, encontrava-se na Alemanha e lá foi recrutado pelo serviço de espionagem, provavelmente por causa da fachada já bem estabelecida de comerciante internacional de cigarros, alimentos e lâminas de barbear. Depois de uma breve passagem pela Itália e Espanha, chegou a Londres em abril de 1915, onde se estabeleceu como comerciante.

No exercício das atividades de espionagem Fernando Buschman mostrou pouquíssimo rendimento. Em primeiro lugar, instalou-se num hotel que era bastante conhecido pela contraespionagem britânica como ponto de reunião de espiões, e, por isso, constantemente revistado. Suas cartas eram todas abertas, pois o endereço do destinatário batia com o de espiões alemães já identificados em Roterdã, nos Países Baixos. As informações que passava eram inócuas e sem importância, não correspondentes aos insistentes pedidos de dinheiro que fazia para as autoridades alemãs.

A Torre de Londres em 1915: palco do fuzilamento de Fernando Buschman

Na madrugada do dia 4 de junho de 1915, Buschman foi preso em sua casa na Harrington Road, no bairro londrino de South Kensington. Após intensos interrogatórios e um breve julgamento de guerra, no dia 30 de setembro foi condenado à morte como espião, por fuzilamento. Encarcerado na Torre de Londres, na véspera da execução, um advogado de quem se tornara amigo, Henry Francis Garrett, conseguiu que lhe devolvessem o violino, e Buschman, que negou até o fim ser um espião, tocou seu instrumento a noite inteira. Pouco antes das 7 horas da manhã de 19 de outubro de 1915, despediu-se do violino com um beijo e seguiu para a morte. No galpão de treinamento de tiro ao alvo, anexo à torre onde se procediam as execuções, prática que estava abolida no local desde 1601, sentou-se na cadeira indicada, dispensou a venda e “morreu como um cavalheiro”, diante dos oito soldados do 3º Batalhão de Guardas escoceses que compunham o pelotão de fuzilamento.

Carta de Valerie Buschman para o advogado do marido

Executado aos 25 anos de idade, Fernando Buschman foi o primeiro brasileiro a morrer na guerra. Além dele, outros dez estrangeiros foram executados entre o fim de 1914 e o início de 1916, todos espiões amadores e pouco eficientes, controlados por uma organização igualmente descuidada, com sede em Roterdã.

Fonte:

- DAROZ, Carlos. O Brasil na Primeira Guerra Mundial - a longa travessia.  São Paulo: Contexto, 2016.


segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

IMAGEM DO DIA - 14/12/2020

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O exército chinês derrota os irmãos Khoja (Burhān al-Dīn e Khwāja-i Jahān) na Batalha de Yesil-Kol-Nor, atual Yashil Kul, Tajiquistão, travada em 1759


sábado, 12 de dezembro de 2020

NOSSA LEGIÃO ESTRANGEIRA NA GUERRA DO PARAGUAI

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Por Renato Coutinho


O Brasil contou com sua legião estrangeira, por assim dizer, na Guerra do Paraguai. Com o intuito de reforçar o diminuto exército da República Oriental do Uruguai, após sugestão do então brigadeiro (general de brigada) Osório, o governo imperial brasileiro decidiu organizar um batalhão de infantaria em Montevidéu no ano de 1865. Este batalhão poderia receber voluntários de todas as nacionalidades e realmente recebeu voluntários de diversas nacionalidades (italianos, poloneses, belgas, suíços, turcos, alemães, espanhóis, etc.). Inicialmente, o batalhão recebeu o nome de "Batalhão de Voluntários Auxiliar".

O governo brasileiro arcou com quase todos os custos para equipar, fardar e armar esse batalhão. O soldo também ficava a cargo do governo brasileiro. Os primeiros duzentos voluntários foram fardados através de contribuições de brasileiros proeminentes que viviam na capital uruguaia. Ainda em 1865, o batalhão deixou de ser conhecido como "Batalhão de Voluntários Auxiliar" e recebeu sua designação oficial. Passou a ser o 16º Corpo (Batalhão) de Voluntários da Pátria. De brasileiro mesmo, o batalhão contava apenas com a bandeira imperial brasileira e seu comandante, o gaúcho coronel do Exército Imperial Fidélis Paes da Silva.

Apesar do nome oficial de 16º Corpo Voluntários da Pátria, o batalhão era muito mais conhecido pelo seu apelido, ele recebeu o apelido de "Batalhão Garibaldino" (também chamados simplesmente de "Garibaldinos"), pois os voluntários italianos predominavam na unidade e Garibaldi, famoso revolucionário italiano, era admirado ao redor do mundo, além de ser um dos italianos mais conhecidos no mundo todo naquela época. Garibaldi, liderando sua legião de voluntários conhecidos como "camisas vermelhas", havia conquistado o sul da Itália e a Sicília em 1860, derrotando o exército do Reino de Nápoles e, assim, dando passo importante no processo de unificação da Itália. O segundo em comando do 16º de Voluntários, Major Groppi, era na realidade um velho companheiro de Garibaldi em outras aventuras.



O 16º de Voluntários adotou um uniforme parecido com o uniforme dos "camisas vermelhas" de Garibaldi, com camisa e quepe predominantemente vermelhos (farda e quepe contavam com detalhes na cor verde).

Os Garibaldinos foram integrados ao Exército Uruguaio sob o comando de D. Venâncio Flores, ora fazendo parte da brigada de infantaria uruguaia sob o comando do coronel León Palleja (brigada que contava com quatro batalhões uruguaios de infantaria), ora fazendo parte da 12ª Brigada de Infantaria Brasileira sob o comando do tenente-coronel Joaquim Rodrigues Coelho Kelly. A brigada Coelho Kelly também reforçava o pequeno exército dos nossos aliados uruguaios.


O coronel Fidélis Paes da Silva foi gravemente ferido logo na primeira ação do batalhão, na Batalha de Yataí. Uma bala de mosquete atingiu de raspão sua coxa direita, provocando algum dano, e ele recebeu um golpe de baioneta, uma cravada profunda, na coxa esquerda. O Coronel Fidélis passou um longo período no estaleiro, recuperando-se da baionetada.

O 16º de Voluntários esteve presente na rendição de Uruguaiana e combateu nas batalhas de Yataí, Estero Bellaco, Tuiuti, Isla Carapá e Curupaiti. Em Curupaiti, o 16º não participou do infrutífero e custoso assalto frontal (os aliados sofreram mais de 4.000 baixas, sendo que pouco mais de 2.000 foram brasileiras). O batalhão estava na outra margem do rio, ocupando posição numa espécie de chaco, de frente para o flanco paraguaio, de frente para o flanco das posições defensivas paraguaias, e quase não sofreu baixas. Pelo contrário, o fogo do 16º de Voluntários provocou baixas nas tropas paraguaias e fez com que muitos paraguaios mantivessem suas cabeças abaixadas procurando abrigo. Os paraguaios sofreram poucas baixas naquele dia e, segundo o depoimento de George Thompson, inglês que era Coronel do Exército Paraguaio, "As baixas paraguaias foram incrivelmente pequenas, a maior parte pelas balas dos fuzileiros postados no Chaco [justamente os homens do 16º]. O Tenente Lescano, ajudante de ordens favorito de López, foi morto por uma destas balas."

O 16º de Voluntários passou a ser o 43º de Voluntários na reforma organizacional que Caxias promoveu no fim de 1866, mas vou parando por aqui. Nossa "legião estrangeira" lutou muito bem no Paraguai.

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terça-feira, 8 de dezembro de 2020

CHUCK YEAGER, PILOTO QUE QUEBROU A BARREIRA DO SOM, MORRE AOS 97

 


O oficial da Força Aérea dos EUA e piloto de teste Chuck Yeager, conhecido como "o mais rápido homem vivo", morreu aos 97 anos.


* 13/2/1923 - Myra, EUA

+ 7/12/2020 - Los Angeles, EUA


Yeager quebrou a barreira do som ao testar o X-1, em outubro de 1947, embora o feito não tenha sido anunciado ao público até 1948. Sua segunda esposa, Victoria, confirmou à CNN, na noite de segunda-feira, que Yeager havia falecido, depois que ela postou da conta de Yeager no Twitter que o ás da aviação da Segunda Guerra Mundial havia morrido. “Uma vida incrível e bem vivida, o maior piloto da América”, ela tuitou.

Seu legado também capturou as gerações posteriores, sendo apresentado no livro e no filme de 1983, The Right Stuff. "Este é um dia triste para a América", disse John Nicoletti, amigo de Yeager e chefe da equipe de terra, à CNN na noite de segunda-feira. "Depois que ele quebrou a barreira do som, todos nós agora temos permissão para quebrar barreiras." Nicoletti disse que Yeager passou por alguns desafios físicos nos últimos anos e teve uma queda que levou a complicações e outros problemas devido à sua idade.

Yeager residia no norte da Califórnia, mas morreu em um hospital de Los Angeles, disse Nicoletti. "Yeager nunca desistiu de nada", lembrou Nicoletti de seu amigo. "Ele era um homem incrivelmente corajoso."


Tempo de guerra

Nascido em 1923 e criado na Virgínia Ocidental, Yeager ingressou na Força Aérea do Exército dos EUA aos 18 anos, em 1941. Em 1943, Yeager foi comissionado um oficial aviador da reserva, antes de se tornar um piloto no comando de caça da 8ª Força Aérea, baseada na Inglaterra. Ao longo da Segunda Guerra Mundial, ele voou 64 missões e abateu 13 aviões alemães, de acordo com sua biografia na Encilopédia Britannica.

“Muitos não sobreviveram à Segunda Guerra Mundial. Muitos não sobreviveram aos primeiros dias de testes de pilotagem”, explicou o amigo Nicoletti. "As chances de sobrevivência para Chuck eram tão estreitas quanto as chances de a América ganhar sua própria liberdade." 

Yeager foi abatido sobre a França em março de 1944 durante sua oitava missão de combate, mas conseguiu escapar da captura com a ajuda da resistência francesa. Ele voltou aos Estados Unidos em 1945 e se casou com sua esposa Glennis, em cuja homenagem ele havia nomeado vários de seus aviões de combate.


Rompendo a barreira do som

Após a guerra, Yeager tornou-se instrutor de voo e piloto de teste, trabalhando como oficial assistente de manutenção na Seção de Caça da Divisão de Teste de Voo em Wright Field, Ohio. As habilidades excepcionais de Yeager foram rapidamente reconhecidas e ele foi convidado a atuar em shows aéreos, bem como testes de serviço para novos aviões.

O X-1 durante testes em Ohio


Chuck Yeager diante do X-1 Glamorous Glennis


Em 1946, o coronel Albert Boyd era o chefe da Divisão de Teste de Voo e escolheu Yeager a dedo para ser um aluno na nova escola de pilotos de teste em Wright Field. Embora tivesse apenas o ensino médio, Yeager creditou seu sucesso no programa às suas habilidades de voo.

O Coronel Boyd escolheu Yeager para ser o primeiro a pilotar o Bell X-1 movido a foguete. "Ele escolheu Yeager porque o considerava o melhor piloto 'instintivo' que já tinha visto e demonstrou uma capacidade extraordinária de permanecer calmo e focado em situações estressantes", explica o site pessoal de Yeager.

Após meses de voos com o X-1, Yeager quebrou a barreira do som com sua aeronave, que chamou de Glamorous Glennis em 14 de outubro de 1947, sobre o Lago Rogers Dry, no sul da Califórnia. O X-1 alcançou Mach 1,06 ou 700 mph, tornando Yeager o primeiro homem a viajar mais rápido do que a velocidade do som e ganhando o título de "Fastest Man Alive" ("o mais rápido homem vivo").


Quebrando mais recordes

Yeager passou os anos seguintes continuando a testar aeronaves e ultrapassando os limites, estabelecendo o recorde de velocidade para uma aeronave de asa reta de Mach 2,44, em dezembro de 1953. Yeager foi premiado com o Troféu Harmon Internacional de 1953 pelo presidente Dwight D. Eisenhower por quebrar o recorde. Ele então voltou ao voo operacional em 1954, assumindo o comando do 417º Esquadrão de Caça-Bombardeiros, estacionado na Base Aérea de Hahn, Alemanha, e depois na Base Aérea de Toul-Rosières, na França.  Em 1957, Yeager retornou à Califórnia e assumiu o comando do 1º Esquadrão de Caça Diurno, sediado na Base Aérea George.


Ele se tornou comandante da Escola de Pilotos de Pesquisa Aeroespacial no posto de coronel, em 1962. Lá, ele presidiu o desenvolvimento de uma instituição inédita, projetada para preparar pilotos de teste militares dos EUA para voos espaciais.

Trinta e sete formandos desse programa foram selecionados para o programa espacial dos EUA, com 26 ganhando as asas de astronauta e voando nos programas Gemini, Apollo e Ônibus Espacial. Ao longo da década de 1960, sua posição na Força Aérea o levou às Filipinas, Vietnã, Tailândia e Coréia.


Pós-aposentadoria

Ainda na ativa, foi promovido ao posto de brigadeiro-general e, após se aposentar, Yeager continuou a ser um consultor valioso para o governo e a indústria aeroespacial. Yeager foi uma das várias pessoas que apareceram no filme de 1983, The Right Stuff, adaptado do romance de não ficção de Tom Wolfe, sobre os primeiros 15 anos do programa espacial da América. Em 1997, aos 74 anos, Yeager comemorou o 50º aniversário de seu voo histórico no X-1, voando em um F-15 Eagle.

"O General Yeager representa o melhor de nós. Para mim, Chuck Yeager sempre será o som da liberdade", disse seu amigo Nicoletti à CNN.

Fonte: CNN


sexta-feira, 4 de dezembro de 2020

O COMBATE A BAIONETA NA 1ª GUERRA MUNDIAL




Segundo a tradição, a baioneta foi desenvolvida em Bayonne, França, no início do século XVII. O fato de ainda estar em uso comum durante a Primeira Guerra Mundial pode parecer incongruente quando comparado com saltos na guerra tecnológica tipificados pela artilharia, granadas, aviões e gases venenosos. No entanto, a baioneta foi usada por todos os lados no conflito de 1914-18, mesmo que o seu uso fosse mais psicológico do que prático.


Usada para atiçar o fogo

Os veteranos da Grande Guerra, quando entrevistados, tendiam a minimizar o impacto da baioneta durante a guerra. Muitos observavam (geralmente em tom de brincadeira) que a baioneta era usada primeiramente como um esplêndido meio para torrar pão, para a abertura de latas, para raspar a lama uniformes, para cutucar um braseiro nas trincheiras ou mesmo para ajudar na preparação de latrinas coletivas.

É, portanto, levanta a questão: a baioneta possuía algum efeito prático durante a guerra, e se não, por que foi utilizada por praticamente todos os soldados de infantaria em todos os exércitos, mesmo que tecnologicamente avançados para a época?


Projeto simples

O Exército Alemão desenvolveu mais tipos de baioneta do que todos os outros exércitos juntos. Foram produzidos adaptadores especiais para que as baionetas inimigas capturadas pudessem ser fixadas ao fuzil padrão alemão, o Gewehr 98.

Em essência, uma baioneta é simplesmente uma lâmina que está acoplada ao cano de um fuzil, para utilização no combate aproximado.

Soldados britânicos fixam suas baionetas antes de um ataque

A maioria das baionetas era de design simples, derivadas das facas militares já produzidas, embora existissem projetos específicos. Por exemplo, os franceses inventaram uma lâmina de agulha para uso em fuzis Lebel. Notoriamente, o exército alemão produziu uma lâmina “saw-back” que, como o próprio nome sugere, tinha a aparência de uma serra com a sua dupla fileira de dentes na extremidade oposta à do fio.

Produzida principalmente para o uso por unidades de engenharia para tarefas específicas, a lâmina de serra revelou-se uma bênção para fins de propaganda dos Aliados, que passaram a apresentar como cruéis, implacáveis e sedentos de sangue. A imprensa Aliada propagou amplamente a noção de que este tipo de baioneta tinha sido desenvolvido especificamente como um refinamento da brutalidade alemã para uso em combate próximo. Embora, sem dúvida, pudesse ser utilizada para tal uso, ela foi realmente concebida para ser usada como uma serra quando surgisse a necessidade.

A lâmina saw-back desenvolvida pelos alemães.  Embora tivesse sido projetada para trabalhos de engenharia, a propaganda Aliada  acusou os alemães de a utilizarem para cometer atrocidades


Personificação do Espírito Ofensivo

De muitas maneiras, a baioneta foi um retrocesso para o conceito de um método agressivo de guerra. Utilizada tradicionalmente pelas potências coloniais, como a França e a Grã-Bretanha em combate contra adversários muito menos bem armados, foi considerado um exemplo positivo do chamado "espírito ofensivo".

Tendo em conta que o modelo pré-guerra francês para a guerra, o Plano XVII, requeria uma abundância de espírito ofensivo no Exército Francês (o èlan) para a planejada conquista da Alsácia e da Lorena, a baioneta deve ter parecido uma arma ideal para a próxima guerra. Na realidade, porém verificou-se que os avanços tecnológicos na guerra defensiva tinham ultrapassado os de guerra ofensiva. A metralhadora manteve o domínio sobre o campo de batalha e os soldados de infantaria que tentassem avançar com baionetas afixadas aos fuzis eram invariavelmente ceifados antes de chegarem às trincheiras inimigas. As oportunidades de uso da baioneta eram, portanto, muito limitadas.

Mesmo quando um grupo de combate conseguia chegar à posição inimiga, o papel da baioneta era, frequentemente, defender os granadeiros que atacavam as trincheiras. Os grupos de assalto invariavelmente continham pelo menos dois "homens da baioneta”, cuja função era unicamente proteger os granadeiros.

Uma vantagem da baioneta no combate aproximado, ao contrário dos fuzis e granadas de mão, era a pequena probabilidade de provocar ferimentos acidentais nos próprios companheiros. Um projétil disparado a curta distância em um inimigo poderia muito bem passar pelo seu corpo e atingir um amigo que estivesse atrás dele.


Combate aproximado

Naturalmente ainda havia muitas ocasiões em que o combate aproximado se fazia necessário, o cenário ideal para o uso da baioneta. No entanto, o combate a baioneta raramente era utilizado, pois os soldados experientes geralmente preferiam outros métodos, e utilizavam lâminas, facas ou soqueiras.

Baionetas da 1ª Guerra Mundial

Curiosamente o manual de treinamento baioneta do Exército Britânico dava poucas orientações para o combate a baioneta. Os soldados eram instruídos a dirigir a baioneta nos pontos vulneráveis ​​do corpo do inimigo: a garganta, a mama esquerda ou direita e a virilha esquerda ou direita.

Ao cravar a lâmina de baioneta no peito corria-se o risco de prendê-la no esterno, tornando a remoção da lâmina altamente difícil. Da mesma forma, dirigir a lâmina contra a virilha resultava inevitavelmente em dor excruciante para a vítima, de tal forma que ela, muitas vezes, agarrava a baioneta em uma tentativa de puxar a lâmina para fora. Em tais casos, os soldados muitas vezes tinham que simplesmente remover a baioneta do fuzil a fim de continuarem combatendo.

Inegavelmente, havia um valor psicológico para a infantaria na realização de uma carga de baioneta, mesmo se, na prática, fosse pouco utilizada. As baionetas continuaram a ser normalmente produzidas na Segunda Guerra Mundial.
 


 



sábado, 21 de novembro de 2020

AMTORG: A JANELA PARA A INDÚSTRIA DE DEFESA SOVIÉTICA

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Ao sair da sangrenta guerra civil, Rússia soviética teve que buscar meios de recuperar o atraso bélico.


Por Aleksandr Verchínin

A parte europeia do país estava em ruínas. Embora o Exército tivesse aumentado numericamente durante a guerra civil, o nível de armamento existente se encontrava no mesmo patamar que o dos países vizinhos, que estavam longe de serem potências militares avançadas.

Para se ter uma ideia, segundo os oficiais do Estado-Maior soviéticos, em caso de uma grande guerra europeia em 1927, bastariam os exércitos da Polônia e da Romênia, com o apoio material da Grã-Bretanha e da França, para destruir por completo o Exército Vermelho.

Só havia uma saída para a situação: era preciso construir uma nova indústria militar do zero. No entanto, a tecnologia e o desenvolvimento no Ocidente já estavam muito à frente. Enquanto na Rússia os vermelhos e os brancos matavam uns aos outros, os europeus conceitualizavam a experiência da Primeira Guerra Mundial, que marcou o início de uma nova era em assuntos militares. E ninguém desejava compartilhar esse know-how com os bolcheviques.

No final da década de 1920, a economia soviética já tinha se recuperado, e o governo conseguira angariar fundos para comprar grandes quantidades de equipamento militar no exterior. Quando, em 1929, a Europa e os Estados Unidos mergulharam nas profundezas da Grande Depressão, o ouro russo veio a calhar.


Arma diplomática

Nos primeiros anos de existência, a URSS não mantinha relações diplomáticas com muitos países do Ocidente e, por isso, teve que criar empresas privadas para iniciar as relações comerciais com o exterior. Na Inglaterra, por exemplo, a empresa Arkos operava desde 1920. Já nos EUA, as atividades comerciais em nome do governo soviético eram feitas pela empresa Amtorg.

Era pela Amtorg que passavam todas as questões relacionadas com a cooperação técnica entre a URSS e os EUA, desde a seleção de exemplares de tecnologia militar até a organização de viagens dos engenheiros soviéticos às fábricas norte-americanas. Mais do que tudo, era necessário adquirir dos americanos equipamento de aviação.

Ainda em 1922, os projetistas soviéticos tiveram acesso a um motor da marca Liberty, a partir de um avião norte-americano que havia sido capturado como troféu de guerra. Ele se distinguia por sua confiabilidade e qualidade de construção, portanto, foi decidido que seria copiado e produzido em série nas fábricas de Moscou. No entanto, um único exemplar não era suficiente – sem falar dos quilos de documentação técnica, peças de reposição e outros atributos valiosos que faziam falta.

Propaganda da Amtorg em revista norte-americana

A tarefa para encontrar tudo isso foi confiada à Amtorg, que recebeu uma generosa quantia para realizar o trabalho: US$ 1,5 milhão. No entanto, os diplomatas soviéticos se depararam com problemas de outra natureza. Em primeiro lugar, a empresa com participação soviética era olhada com desconfiança e ninguém estava disposto a vendê-la prontamente grandes lotes de equipamento.


Truques do capitalismo

A Amtorg teve que aprender a lidar com a “arte capitalista” de criar empresas temporárias. O primeiro lote de motores Liberty e 350 conjuntos de ignição foram adquiridos por meio do negócio de fachada “Gabinete Zaustinski”. Mas em poucos anos foram fechados contatos diretos e esse tipo de artifício deixou de ser necessário.

Graças à Amtorg, toneladas de carga entraram na URSS. Para o seu transporte, o Comissariado do Povo para o comércio exterior teve até que organizar um serviço especial. Só em 1925 foram comprados dos EUA instrumentos de aeronáutica no valor de US$ 400.000. Livros, desenhos técnicos, álbuns e manuais de fábricas americanas eram enviados para a União Soviética em contêineres.

Em 1929, a Amtorg intermediou a entrada nos EUA de um oficial da Força Aérea soviética cuja tarefa era estudar as instalações para a produção de paraquedas. Até então, ninguém tinha ouvido falar de paraquedas na URSS. Nos EUA, o visitante aprendeu não apenas como esses paraquedas eram feitos, mas também realizou um salto de teste. De tão inspirado com a experiência, o oficial se engajou na promoção a modalidade na Rússia e criou o primeiro esquadrão nacional de paraquedistas.

Joia da indústria aeronáutica americana, bombardeiro pesado B-17 quase foi para nas mãos dos soviéticos


EUA em crise

Inicialmente, os norte-americanos estavam um pouco relutantes em discutir a possibilidade de vender aeronaves completas aos russos. Porém, a crise econômica os obrigou a fazer concessões.

Em 1934 começaram a chegar aos Estados Unidos delegações soviéticas com o objetivo de adquirir os exemplares mais modernos. Essas delegações eram lideradas pelos proeminentes projetistas de aeronaves nacionais A.N. Tupolev, o pai do famoso TU, e M.I. Gurevitch, o criador do MiG.

Dois anos depois, um avião de carga DC-3, aviões anfíbios e um bombardeiro foram transportados dos Estados Unidos para a União Soviética. A joia da indústria aeronáutica americana não foi parar por pouco nas mãos dos soviéticos: o bombardeiro pesado B-17, que aterrorizaram as cidades alemãs e japonesas durante a 2ª Guerra.

Ao contrário dos tanques, nenhum desses exemplares foi para a produção em série. No entanto, diversos elementos foram incorporados na produção das famosas aeronaves militares soviéticas.

Fonte: Gazeta Russa

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segunda-feira, 16 de novembro de 2020

UNIFORMES - REGIMENTO DE INFANTARIA DE PENICHE

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Exército Português
Regimento de Infantaria de Peniche
(1764)


O primeiro documento oficial conhecido que se refere explicitamente ao Terço de Peniche é a consulta de 13 de Março de 1698, onde consta a nomeação do Conde de S. João para Comandante do Terço de Peniche, que por essa época é “levantado de novo". 

Contudo, o Terço de Peniche só foi criado em 7 de Junho de 1698, através do decreto reorganizador da Infantaria e da Cavalaria, com 670 infantes e a gente que tinha aquele presídio, ou seja, a Praça de Guerra de Peniche, tendo sido levantado com base nas companhias de infantaria que, em 1693, faziam já parte da guarnição daquela praça de guerra.

Em 1707, com a publicação das novas ordenanças de D. João V, os Terços passaram a designar-se por Regimentos. 

Embora os soldados de infantaria utilizassem como padrão uniforme na cor azul, os músicos e tambores eram fardados de modo diferenciado. Este soldado-tambor veste túnica padronizada amarela e chapéu tricórnio, característico do século XVIII. Revestindo seu tambor, encontram-se as cores e o brasão da Coroa portuguesa.

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terça-feira, 10 de novembro de 2020

A INVASÃO ÁRABE NA ESPANHA (711)

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Em 28 de abril de 711, os árabes atravessam o Estreito de Gibraltar em direção à Espanha. Em quatro anos, conquistam quase todo o país, chegando até a França.

Por Jens Teschke


Tarik ibn Ziyad, o governador da cidade de Tânger, desembarcou na Baía de Algeciras com cerca de 8 mil soldados. Primeiro ele se instalou à volta do penhasco de Calpe, onde construiu suas primeiras fortalezas. Mais tarde, esse penedo recebeu o nome Djabal Tarik – o monte de Tarik – atualmente conhecido como Gibraltar.

Algumas semanas mais tarde, aportaram outros milhares de soldados – berberes em sua maioria – e Tarik seguiu terra adentro. O primeiro choque sangrento entre os árabes e os visigodos que dominavam a Espanha data de 19 de julho de 711. Os dois exércitos enfrentaram-se por vários dias e somente a traição por parte das tropas do rei Roderico decidiu a batalha. O caminho para Córdoba e Sevilha estava aberto para os mouros.

O reino visigótico estava praticamente esfacelado, a resistência era quase nula. Pode-se dizer que houve um colapso interno total após o primeiro ataque dos agressores estrangeiros, bloqueando qualquer resistência por parte da população cristã.

Os visigodos haviam subestimado o perigo representado pelos árabes. Depois que Tarik começou sua marcha do sul para o norte, bastaram apenas sete anos até que os novos conquistadores se estabelecessem. A penetração da cultura muçulmana na Europa tem consequências até hoje.


UE reconectou Espanha ao continente

Para a Espanha, a invasão representou o desligamento quase total da Europa, o início de uma história quase hermética desde a Idade Média até a Era Moderna. Segundo o historiador Michael Borgholte, da Universidade Humboldt de Berlim, não é exagero afirmar que só com a sua filiação à União Europeia é que a Espanha voltou a se conectar com o resto do continente.

Visto sob o pano de fundo da história europeia, a conquista muçulmana da Espanha foi o campo de experiências para o choque e a simbiose de três culturas, representadas pelas três grandes religiões: Cristianismo, Islamismo e Judaísmo.

O processo de fertilização cultural foi especialmente intenso no século XI, sobretudo na cidade de Toledo. Os conhecimentos linguísticos de numerosos judeus eruditos ali residentes lhes permitiram traduzir para o latim os relatos históricos em árabe e grego. Por outro lado, a cidade logo atraiu estudiosos da Inglaterra, França e Alemanha para estudar esses documentos antigos.

A expansão muçulmana na Europa possui reflexos até os dias atuais

Porém, desde o século IX, as tensões cresciam. Partes da Espanha começaram a ser reconquistadas pelos cristãos. O resultado foram cruéis perseguições e pogroms, como, por exemplo, em 1066, quando 1.500 famílias judaicas foram assassinadas.


Início da Reconquista

A fase de poder ilimitado dos mouros acabou em 718, mas foi apenas no ano de 732 que os sucessores de Tarik sofreram a derrota definitiva. Eles haviam chegado longe, atravessado os Pireneus até Poitiers. Sob os golpes de Charles Martel, o avô de Carlos Magno, a Gália foi resgatada para a Europa. Após a vitória de Poitiers começou a Reconquista.

O processo foi difícil, já que os muçulmanos dilapidaram o país em sua retirada. A Espanha estava despovoada, cada investida dos cristãos, de 718 a 1493, implicou a recolonização uma a uma das regiões abandonadas. Antes de cada próximo passo, o vácuo deixado pelos mouros tinha que ser preenchido.

A Batalha de Poitiers, em 732, assinalou o limite da expansão muçulmana na Europa e o início da longa Guerra de Reconquista

Em 1493 os mouros estavam definitivamente vencidos. Com o apogeu dos reis católicos seguiu-se uma catolização radical da Espanha, excluindo qualquer possibilidade de convivência pacífica entre as diferentes culturas e religiões. Um ano antes, começara o êxodo dos judeus para os países vizinhos, expulsos pelo casal real Fernando e Isabel.

Hoje, tanto por seu passado como pela situação geográfica, a Espanha é a ponte entre a União Europeia e a África.

Fonte: DW