"No próprio dia da batalha, as verdades podem ser pinçadas em toda a sua nudez, perguntando apenas;
porém, na manhã seguinte, elas já terão começado a trajar seus uniformes."

(Sir Ian Hamilton)



sexta-feira, 29 de junho de 2018

QUERIDA HISTÓRIA, TE ESCREVO DA GUERRA

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Correspondência de soldados alimenta livros que se aprofundam no lado mais humano dos trágicos episódios do último século

Por Tereixa Constenla

Por acaso as vidas de Toyofumi Ogura e Humberto Alonso Pérez são menos história do que as vidas do imperador japonês Hirohito e do ditador espanhol Franco? Durante alguns séculos os historiadores marginalizaram as vidas minúsculas para debruçarem-se sobre as maiúsculas do poder. Vista assim, a guerra era uma história de planos, escaramuças, estratégias, generais, glórias e derrotas. Os soldados eram uma magnitude, um número no campo de batalha. “As pessoas a quem a história se refere só aparecem como figuras acessórias, como um pano de fundo, como uma massa escura no fundo da cena”, escreve Hans Magnus Enzensberger.

Esse caminho historiográfico teve seu dano colateral, na opinião da historiadora francesa Sabina Loriga. Durante a Primeira Guerra Mundial, a maioria dos historiadores políticos foi “incapaz de compreender as graves tensões sociais que perturbaram a Alemanha e a Europa em geral”.

Carta de um soldado alemão escrita no front em 1917


Existe uma história oficial sobre o 6 de agosto de 1945, quando Hiroshima perdeu 90% de suas construções e 25% de seus habitantes em meia hora. A destruição e as doenças continuariam crescendo muito tempo depois da explosão da bomba atômica Little Boy e da rendição do imperador Hirohito. Os norte-americanos mediram o impacto da catástrofe que eles mesmos causaram: 306.545 atingidos. Nos relatórios, entretanto, não é possível ver o medo, a incredulidade e a dor dos moradores de Hiroshima, protagonistas forçados da hecatombe. Para isso é bom ler as cartas que Toyofumi Ogura (1899-1996) escreveu a sua esposa Fumiyo: “Quanto mais avançava, mais me empenhava em seguir o ditado dos três macacos de ‘não ver o Mal, não escutar o Mal e não dizer o Mal’, e procurava não falar com ninguém. Depois de encostar no cadáver daquela mulher no final da ponte do bonde, rio abaixo a partir da ponte Kyobashi, decidi acrescentar um quarto macaco sábio que indicava ‘não tocar no Mal”.

Ogura, professor de História na Universidade de Hiroshima, escreveu 13 cartas que sua destinatária nunca chegaria a ler: “Logo depois de minha catástrofe me senti possuído pela sensação de precisar informar minha esposa, vítima da bomba, dos fatos posteriores a sua morte, ainda sem saber absolutamente nada da arma atômica e da doença causada pela radiação”. Após superar a censura das forças aliadas – o Japão era um país ocupado desde sua rendição em 1945 –, foram publicadas em 1948.

Soldados britânicos lendo cartas em 1944

Cartas desde el Fin del Mundo (Cartas do Fim do Mundo, ainda inédito em português) foi o primeiro relato pessoal sobre a bomba atômica e em poucos meses precisou ser reeditado seis vezes pelo interesse que causou. Ogura conta suas experiências, suas observações, seus sentimentos. De suas mãos percorrem-se caminhos transitados por pessoas comuns feridas, nocauteadas, fantasmagóricas, que perambulam por uma cidade em ruínas. Uma verdade íntima que ele compartilha.

Como fonte primária, as cartas estão ligadas à história desde sua origem – Plínio, o Jovem, narra a destruição de Pompéia pela erupção do Vesúvio no ano 79 em uma carta ao historiador Tácito –, ainda que sem o peso que alcançaram nas últimas três décadas. “Agora são o ponto de partida, e não só um instrumento de segunda ordem, para fazer uma análise histórica da cultura popular e explorar campos da história social que de outra forma não poderíamos”, diz Guadalupe Adámez Castro, autora de Gritos de Papel, uma história sobre o exílio espanhol realizada sobre os escritos de súplica de republicanos. Cartas que davam e tiravam vida, como relatou Eulalio Ferrer, preso em um campo de internação na França: “A correspondência é um elemento vital de nosso presente destino, significa tanto ou mais do que a comida. É o laço que nos une com o mundo, contribuindo para acentuar e diminuir nossas incertezas”.

Após seu estudo, Adámez concluiu que o exílio foi transversal tanto em origem como geográfico, mais heterogêneo do que a imagem de uma diáspora de intelectuais. E também que as cartas alimentavam uma relação de ida e volta: “Para o Governo republicano no exílio era uma forma de manter certa esperança na República e de poder saldar uma dívida com aquelas pessoas”.

Em uma guerra, afirma José Álvarez Junco no prólogo de Voces desde la Trinchera (Vozes da Trincheira), “ignoramos como viviam os soldados daquela experiência, o que pensavam, o quanto acreditavam da enxurrada retórica que lhes caía na cabeça, como aceitavam aquelas punições”. Nesse livro, James Matthews, membro do Centro de Estudos da Guerra na Universidade de Dublin, estuda cartas escritas entre 1938 e 1939 por soldados do Exército da Andaluzia, como Manuel Cantudo: “(...) se me visse descalço, andando com a sola do pé, e estou cheio de dizer ao tenente, e ele me fala que não há calçado”.

Carta de Humberto Alonso Pérez a sua esposa, Carmina, e ao seu filho, Guillermo, da prisão de El Coto (Gijón), em 14 de abril de 1938.

A publicação de cartas ajuda a rastrear o sentimento dos soldados da Wehrmacht – o correio militar alemão transportou 3 bilhões de cartas e pacotes durante a guerra –, o dos guerrilheiros condenados à morte pelos nazistas na França e o dos prisioneiros do campo de concentração de Mauthausen. “A carta é um documento particular que permite comparar o discurso do poder com o dos seres de carne e osso que não tiveram poder e, por outro lado, nos permite entrar no coração das pessoas para saber como vivenciaram os acontecimentos. O ápice tem muito a ver com o egodocumento, quando os historiadores começam a usar diários, memórias e cartas”, diz Verónica Sierra Blas, membro do Seminário Interdisciplinar de Estudos sobre a Cultura Escrita da Universidade de Alcalá de Henares e autora de dois livros sobre o século XX espanhol construídos sobre o gênero epistolar.

O primeiro, Palabras Huérfanas (Palavras Órfãs), reconstruiu a história das 30.000 crianças espanholas exiladas durante a Guerra Civil Espanhola na França, Bélgica, Inglaterra, México e Rússia a partir de suas cartas e diários. O segundo, Cartas Presas, se introduz no interior do sistema penitenciário durante a guerra e o franquismo através do estudo de 1.500 cartas. O remetente de uma delas é Humberto Alonso Pérez, que escreveu da prisão de El Coto, de Gijón, em 14 de abril de 1938, um mês antes de ser executado, a sua esposa, Carmina, e ao seu filho, Guillermo: “O destino me separa de vocês, me elimina da vida; o enfrento com integridade porque sei que suas vidas serão modelos e exemplares, cúmulo de honradez. Jamais se detenham em culpar alguém por minha sorte”. A história com outros nomes e sobrenomes.

Fonte: El País


domingo, 24 de junho de 2018

VOLGOGRADO, A CIDADE QUE MUDOU O DESTINO DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL

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Chamada de Stalingrado até 1961, cidade presenciou uma das batalhas mais sangrentas da história da humanidade


Por Thiago Tanji

Durante as escavações para a reforma da Arena Volgogrado, que receberá quatro jogos da Copa do Mundo de 2018, operários encontraram ossadas e vestígios de bombas no local em que foi construído o estádio. Essa não foi uma surpresa para os organizadores do evento: localizada às margens do Rio Volga, a cidade testemunhou uma das batalhas mais sangrentas já registradas. 

Ao menos 2 milhões de pessoas morreram ou foram feridas, em um evento-chave da Segunda Guerra Mundial que mudou os rumos da História. Ao final da luta, a cidade estava reduzida às ruínas e era um cemitério a céu aberto. A vitória soviética contra as tropas nazistas havia cobrado um grande preço da população local.

Ironicamente, durante mais de 35 anos, Volgogrado recebeu o nome do líder que conduziu a União Soviética à vitória (e quase pôs tudo a perder): fundada em 1589 com o nome de Tsarítsin, a cidade foi rebatizada de Stalingrado em 1925, como homenagem aos feitos de Josef Stalin — o secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética comandara tropas bolcheviques no local durante a Guerra Civil, no começo da década de 1920. 

Em 1961, como parte dos esforços do líder Nikita Kruschev em "desestalinizar" a sociedade soviética, a cidade recebeu o nome do rio que corre na região. As memórias da batalha da Segunda Guerra Mundial, entretanto, jamais seriam esquecidas. Em 1967, foi construído um monumento de 85 metros de altura que representa a "Mãe-Pátria Russa": sobre a colina de Mamayev Kurgan, uma mulher com feições heroicas brande uma espada gigantesca. A estátua, que pode ser vista de diferentes pontos da cidade, está situada a pouco mais de um quilômetro da Arena de Volgogrado.

Monumento homenageando a "Mãe Pátria Russa"


Traição ou jogada de mestre?

O movimento socialista de todo o mundo ficou em choque com a notícia que o diplomata soviético Viatcheslav Molotov teria um encontro com o regime nazista da Alemanha, a poucos dias do início da Segunda Guerra Mundial. Com a benção de Josef Stalin, o tratado de não-agressão assinado em 23 de Agosto de 1939 também determinava a "partilha" do território polonês: em 1º de setembro, as tropas nazistas invadiriam o país do leste europeu e dariam início ao conflito mundial. 

Para alguns militantes, a tática soviética era um sinal de submissão ao poderio nazista — ou, até mesmo, um claro indício de traição. Mas a liderança da União Soviética sabia que a assinatura do tratado era apenas uma manobra para ganhar tempo: vivendo um tardio processo de industrialização, os soviéticos eram infinitamente mais fracos que os alemães.
Para piorar, Stalin conduzira entre 1936 a 1938 um processo de consolidação do poder que marcou a perseguição e eliminação física de qualquer vestígio de oposição. Líderes bolcheviques históricos, como Lev Kamenev, Grigori Zinoviev e Nikolai Bukharin, foram acusados de conspirar contra a liderança soviética e colocar a revolução em risco. Processados, foram presos e posteriormente executados. A repressão não se limitou aos quadros políticos: três dos cinco marechais soviéticos também foram fuzilados, assim como centenas de oficiais das Forças Armadas. 

Com o Exército acéfalo e poucos recursos tecnológicos bélicos, só restava à União Soviética realizar manobras para protelar o máximo de tempo possível sua entrada na Segunda Guerra Mundial. O conflito, no entanto, seria inevitável: derrotar o fascismo era uma condição básica para a sobrevivência soviética e sua tentativa de realizar uma transição ao socialismo. 

Afinal, os nazistas calcavam seu pensamento político em duas premissas básicas: para que a Alemanha conquistasse sua vitória final, era necessário derrotar as "raças inferiores" (personificadas na população judaica) e destruir qualquer rastro do comunismo. Não por acaso, os nazistas defendiam um Estado forte que defendesse os trabalhadores, mas que não dava brecha alguma para a consolidação de entidades sindicais ou de movimentos sociais que contestassem a estreita ligação entre os empresários e membros do partido de Adolf Hitler — em 1933, livros de Karl Marx foram queimados em praça pública como "necessidade de purificação radical da literatura alemã de elementos estranhos que possam alienar a cultura alemã".


A mãe de todas as batalhas 

No dia 22 de junho de 1941, o pacto de não-agressão finalmente seria rompido. Hitler ordenara o início da Operação Barbarossa, que deslocaria quase 4 milhões de tropas nazistas com o objetivo de varrer a União Soviética do mapa e construir uma vitória em um curto período de tempo. Com a tática conhecida como Blitzkrieg — ataques rápidos e precisos com a utilização da Força Aérea e de tanques blindados — a Alemanha avançou rapidamente sobre o território soviético. Enquanto marchavam em direção à Moscou, os fascistas também se dirigiam aos territórios localizados ao sul, em busca dos campos de petróleo do Cáucaso. 

Tropas soviéticas defendendo Stalingrado

Em novembro, as forças nazistas já estavam às portas da capital Moscou. Para levantar a moral da população, a União Soviética organizou uma parada militar para relembrar o aniversário da Revolução Bolchevique: as tropas desfilaram em frente ao complexo do Kremlin, sede da liderança soviética, e retornaram para o campo de batalha. A mobilização popular e o inverno russo foram determinantes para a contra-ofensiva: em janeiro de 1942, os alemães se afastaram de Moscou. O cenário, entretanto, ainda era crítico.

Enquanto lutava pela sobrevivência, o Exército Vermelho estabeleceu uma linha de defesa na cidade de Stalingrado para impedir que as tropas alemãs avançassem sobre os campos de petróleo ao sul do país. O Rio Volga seria utilizado para a movimentação de tropas e insumos básicos para a população, que permaneceu na cidade trabalhando na produção de armamentos e na escavação de trincheiras. No final de julho de 1942, a Alemanha iniciou um intenso bombardeio aéreo sobre a cidade — milhares de civis morreriam por conta dos incêndios resultantes dos ataques. 

Impotentes diante da superioridade tecnológica alemã, as forças soviéticas iniciaram uma tática de aproximar ao máximo suas linhas militares em relação à vanguarda nazista, atraindo os inimigos para dentro da cidade. Assim, a utilização de bombardeios e de ataques de tanques blindados ficaria reduzida. Ao mesmo tempo, Josef Stalin editaria a ordem 227: sob a consigna de "Nenhum Passo Para Trás", a determinação estabelecia que nenhuma tropa poderia recuar sem autorização — quem desobedecesse, correria o risco de ser preso e fuzilado. 

Durante o segundo semestre de 1942, Stalingrado tornou-se um matadouro: a colina de Mamayev Kurgan, que hoje ostenta o monumento da vitória, mudava constantemente de mãos. Ora ostentava a bandeira soviética, ora exibia o estandarte da Alemanha Nazista. Na fábrica de aço Outubro Vermelho, os operários mantinham a produção enquanto soldados disputavam o controle do perímetro.  Em batalhas travadas casa a casa, prevalecia a utilização de atiradores de elite: o soviético Vassili Zaitsev ganhou fama de herói ao abater 243 alemães em Stalingrado. 

Não por acaso, o conflito ficou conhecido como "A Mãe de Todas as Batalhas". Em dezembro, o Exército Vermelho iniciou a Operação Urano, que aproveitava uma brecha nas linhas inimigas para iniciar um movimento de contra-ataque. Ao centrar fogo contra as tropas romenas, que auxiliavam os nazistas e eram menos equipadas, os soviéticos iniciaram um movimento de cerco antes de desferir um golpe fatal.

Com problemas nas linhas de abastecimento, os alemães também sofriam com o inverno russo. Em janeiro de 1943, a liderança alemã informava Adolf Hitler que as tropas não tinham munição ou alimento — como resposta, o nazista afirmava que a luta seria feita até o último homem. 

Com quase 730 mil mortos, feridos ou desaparecidos, as tropas nazistas finalmente se renderiam no dia 2 de fevereiro. A vitória soviética também cobrava seu preço: durante os meses de conflito, houve mais de 1,1 milhão de baixas, com um número desconhecido de civis mortos. A partir de Stalingrado, a União Soviética iniciaria um contra-ataque que culminaria com a chegada do Exército Vermelho em Berlim, em abril de 1945. A bandeira vermelha com a foice e o martelo tremularia em pleno Reichstag, o Parlamento Alemão que presenciou a ascensão e o fim do nazismo. 

Fonte: Revista Galileu


LANÇAMENTO DO LIVRO "A GRANDE GUERRA NO ATLÂNTICO PORTUGUÊS"

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Alô, amigos de Portugal e estudiosos da Grande Guerra e da guerra no mar.

Lançamento do livro do Prof. Antônio Telo e do amigo Prof. Augusto Salgado, A Grande Guerra no Atlântico Português.  

Imperdível!


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sábado, 16 de junho de 2018

V OLIMPÍADA DE HISTÓRIA MILITAR E AERONÁUTICA DA ACADEMIA DA FORÇA AÉREA

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Na primeira semana de julho será realizada na Academia da Força Aérea, em Pirassununga-SP, a quinta edição da Olimpíada de História Militar e Aeronáutica, envolvendo os cadetes da academia e da AMAN, os aspirantes da Escola Naval e os alunos do Instituto Tecnológico de Aeronáutica de da Escola Preparatória de Cadetes do Exército.

Mais uma vez fui convidado para compor a banca de avaliação da competição e, neste ano, farei a conferência de abertura, que terá como tema, a pesquisa que realizei junto com minha filha Ana Daróz, sobre As Bruxas da Noite: as aviadoras soviéticas na Segunda Guerra Mundial.



Será um privilégio compartilhar o conhecimento sobre a inédita experiência soviética de emprego de unidades aéreas femininas em combate.

Também realizaremos o pré-lançamento do nosso livo "As Bruxas da Noite: as aviadoras soviéticas na Segunda Guerra Mundial", publicado em parceria com a Somos Editora.



quinta-feira, 14 de junho de 2018

"ELIMINAR AS CALÇAS VERMELHAS?!" "JAMAIS! LE PANTALON ROUGE C'EST LA FRANCE!" (NUNCA! AS CALÇAS VERMELHAS SÃO A FRANÇA!)

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A evolução dos uniformes acompanhando a progressão das sociedades e da arte da guerra encontrou um exemplo paradigmático durante a Primeira Guerra Mundial. Ignorando ou desconsiderando a evolução tecnológica doas armamentos, as lideranças francesas resistiram a modificar os uniformes de suas tropas alegando que estariam enfraquecendo o elan combatente francês.

No texto de Barabara Tuchman, no clássico Canhões de Agosto, podemos mensurar a dificuldade enfrentada pelas lideranças que queriam introduzir uniformes camuflados, ou com baixa visibilidade, no Exército Francês, tarefa que somente pôde ser efetivada no final da guerra:

"Quando olhamos para o soldado francês de 1914, ano inicial da Primeira Guerra Mundial, a primeira coisa que te atordoa são as cores brilhantes do elegante uniforme. Os soldados de infantaria franceses usavam calças vermelhas extravagantes, casacos azuis vistosos e quepes vermelhos chamativos. Este era o uniforme de combate, não apenas uniformes de passeio.

Uniformes franceses de 1914: calças garanca vermelhas que representavam o elan militar, mas que expunham os soldados às armas modernas


Os exércitos mais profissionais do mundo daquela época já tinham notado o erro. Os britânicos por exemplo, haviam adotado o uniforme caqui após a Guerra dos Bôeres, e os alemães fizeram a mudança do azul marinho prussiano para o cinza-campo (feldgrau). Entretanto, em 1914 os soldados franceses ainda usavam os mesmos casacos azuis, quepes vermelhos e calças vermelhas que herdaram das guerras napoleônicas, quando os combates se resumiam a fuzis enfileirados lado a lado apontando para os inimigos que estavam a apenas duzentos passos de distância... Naquele tempo não precisavam de camuflagem.

Visitando o front da Guerra dos Bálcãs em 1912, Messimy, o ministro da Guerra francês viu as vantagens obtidas pelos búlgaros fardados com cor fosca e voltou para casa determinado a tornar o soldado francês menos visível. Seu projeto para vesti-lo em cinza-azul ou cinza-verde levantou um uivo de protesto. O orgulho do Alto comando do Exército era tão intransigente em desistir de suas calças vermelhas quanto em adotar armas pesadas. 

O prestígio do exército foi mais uma vez colocado em jogo. Para eles, vestir o soldado francês em alguma cor lamacenta e inglória seria realizar os mais profundos sonhos dos intelectuais e dos maçons. Era banir 'tudo o que é colorido, tudo o que dá ao soldado seu aspecto vívido', escreveu na época o jornal Echo de Paris, 'é contrariar tanto o gosto francês, quanto sua função militar'.

Messimy apontou que os dois não mais poderiam ser sinônimos, mas seus oponentes conservadores se mostraram irredutíveis. Em uma audiência parlamentar, o ex-ministro da Guerra, M. Etienne, falou pela França:

- Eliminar as calças vermelhas? - gritou com veemência. 
- Jamais! Le pantalon rouge c'est la France!  ("Nunca! As calças vermelhas são a França!")

Por que tão impressionante respeito ao que tornaria um soldado tão visível, um alvo fácil para o rifle de um sniper inimigo ou de uma metralhadora? Esse júbilo de cores vivas provinha das experiências militares das potências anteriores à Primeira Guerra Mundial - britânicos, franceses e alemães - que se limitava a lutar contra pessoas que na maioria das vezes não tinham rifles ou metralhadoras: rebeldes mal armados lutando contra o domínio colonial na África ou na Ásia. Os generais sabiam, é claro, que isso não seria mais válido para essa nova guerra em escala total na Europa, mas há sempre aquela diferença curiosa entre saber e agir, e os militares não estão imunes a isso. 

Reencenadores franceses com o uniforme bleu horizon, utilizado no final da guerra


Centenas de milhares de tropas da infantaria francesa e cavalarianos com couraças polidas e brilhantes tiveram que morrer como alvos fáceis para metralhadoras alemãs - exemplo disso é a batalha das Fronteiras, que ocorreu em poucas semanas do início da Guerra, e ficou marcada para sempre como o dia mais sangrento da história militar francesa, onde mais de 27 mil soldados franceses morreram em um únienadores franceseco dia - antes que os novos uniformes na cor Azul-horizonte (bleu horizon) fossem distribuídos às tropas no início de 1915."

Fonte: TUCHMAN, Barbara. Canhões de Agosto. Rio de Janeiro: BibliEx, 1998.

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UNIVERSIDAD SIMÓN BOLIVAR REALIZA SEMINÁRIO SOBRE ARTILHARIA E HISTÓRIA MILITAR

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quarta-feira, 13 de junho de 2018

A INTRODUÇÃO DA ARTILHARIA É PERCEBIDA PELA LITERATURA

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O sucesso da artilharia otomana levou os exércitos europeus a considerarem os canhões como uma opção real para ampliar seu poderio, o que foi potencializado pelos avanços nas técnicas de fabricação das bocas de fogo e da pólvora.  

Com efeito, já na virada do século XV para o XVI, a artilharia se afirmou no campo de batalha, revelando-se imprescindível no ataque e na defesa das praças fortes.  Os mais notáveis autores renascentistas ibéricos se aperceberam da inovação e fizeram interessantes referências à artilharia em suas obras.  Camões, em Os Lusíadas, testemunhou os efeitos da nova arma:

"As bombardas horrisomas bramavam,
Com as nuvens de fumo o sol tomando;
Amuidavam-se os brados acendidos,
Tapam com as mãos os mouros os ouvidos" 

Luís de Camões em Os Lusíadas: "As bombardas horrissomas bramavam..."

Além de começar a se tornar eficiente, o canhão foi decisivo – juntamente com seus derivados, o arcabuz e o mosquete – para eliminar o prestígio e a primazia da cavalaria medieval, conforme protestou, com boa dose de indignação, o célebre autor espanhol Miguel de Cervantes:

"Bem hajam aqueles benditos séculos que careceram da espantosa fúria destes denominados instrumentos da artilharia, a cujo inventor, tenho para mim, que o inferno está dando o prêmio da sua diabólica invenção, com a qual deu causa a que um infame e covarde braço tire a vida a um valoroso cavaleiro e, que sem saber como, ou por onde, em meio de coragem e brio, que inflama e anima os valentes peitos, chega numa desbandada bala, disparada por quem talvez fugiu ao disparar a maldita máquina e corta e acaba em um só instante os pensamentos e a vida de quem a merecia gozar longos séculos." 

Peça de artilharia do século XVI



Conheça essa e outras histórias lendo


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aguerradoacucar@yahoo.com.br


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segunda-feira, 11 de junho de 2018

IMAGEM DO DIA - 11/6/2018

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Couraçado defesa costeira Almirante Ushakov durante a Batalha de Tsushima (1905).
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quinta-feira, 7 de junho de 2018

ARMAS - REVÓLVERES DA GUERRA CIVIL AMERICANA

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Uma amostra de armas de porte da Guerra Civil Americana. Neste conflito uma ampla coleção de pistolas, de pistolas de cavalaria deram lugar a simples revólveres, de calibres variados e desenhos únicos, que se tornaram icônicos.


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terça-feira, 5 de junho de 2018

PENSAMENTO MILITAR - HISTÓRIA E HISTÓRIA MILITAR



“ A história do mundo, em larga medida,
é uma história de guerras, porque os Estados em que vivemos nasceram das conquistas, guerras civis ou lutas pela independência."

(John Keegan, historiador britânico)


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