"No próprio dia da batalha, as verdades podem ser pinçadas em toda a sua nudez, perguntando apenas;
porém, na manhã seguinte, elas já terão começado a trajar seus uniformes."

(Sir Ian Hamilton)



sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

A MORTE DO ESPIÃO VIOLINISTA

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Apaixonado por música, o jovem Fernando Buschman foi o primeiro brasileiro a morrer durante a Primeira Guerra Mundial.  Preso e condenado por espionagem, foi fuzilado pelos britânicos em 1915


Curiosamente, a primeira vítima nacional da Grande Guerra a perder a vida foi um brasileiro naturalizado, Fernando Buschman, fuzilado na Torre de Londres, após ter sido condenado por realizar espionagem em favor da Alemanha. Fernando nasceu em Paris, em 1890, mas veio ainda bebê para o Rio de Janeiro, onde o pai, Francisco, alemão naturalizado brasileiro, tinha uma loja de instrumentos musicais.

Após se formar em engenharia na Áustria, retornou ao Rio de Janeiro para trabalhar com o irmão na loja da família, mas os negócios não prosperaram, o que levou Buschman a fazer nova sociedade com o brasileiro Marcelino Bello, em uma importadora e exportadora de produtos alimentícios. Culto, refinado, músico de qualidade, apaixonado pelo violino e pela aviação, então uma novidade, Fernando Buschman passou a viajar constantemente para a Europa, onde se casou com a filha de um milionário alemão. Quando a guerra começou em 1914, encontrava-se na Alemanha e lá foi recrutado pelo serviço de espionagem, provavelmente por causa da fachada já bem estabelecida de comerciante internacional de cigarros, alimentos e lâminas de barbear. Depois de uma breve passagem pela Itália e Espanha, chegou a Londres em abril de 1915, onde se estabeleceu como comerciante.

No exercício das atividades de espionagem Fernando Buschman mostrou pouquíssimo rendimento. Em primeiro lugar, instalou-se num hotel que era bastante conhecido pela contraespionagem britânica como ponto de reunião de espiões, e, por isso, constantemente revistado. Suas cartas eram todas abertas, pois o endereço do destinatário batia com o de espiões alemães já identificados em Roterdã, nos Países Baixos. As informações que passava eram inócuas e sem importância, não correspondentes aos insistentes pedidos de dinheiro que fazia para as autoridades alemãs.

A Torre de Londres em 1915: palco do fuzilamento de Fernando Buschman

Na madrugada do dia 4 de junho de 1915, Buschman foi preso em sua casa na Harrington Road, no bairro londrino de South Kensington. Após intensos interrogatórios e um breve julgamento de guerra, no dia 30 de setembro foi condenado à morte como espião, por fuzilamento. Encarcerado na Torre de Londres, na véspera da execução, um advogado de quem se tornara amigo, Henry Francis Garrett, conseguiu que lhe devolvessem o violino, e Buschman, que negou até o fim ser um espião, tocou seu instrumento a noite inteira. Pouco antes das 7 horas da manhã de 19 de outubro de 1915, despediu-se do violino com um beijo e seguiu para a morte. No galpão de treinamento de tiro ao alvo, anexo à torre onde se procediam as execuções, prática que estava abolida no local desde 1601, sentou-se na cadeira indicada, dispensou a venda e “morreu como um cavalheiro”, diante dos oito soldados do 3º Batalhão de Guardas escoceses que compunham o pelotão de fuzilamento.

Carta de Valerie Buschman para o advogado do marido

Executado aos 25 anos de idade, Fernando Buschman foi o primeiro brasileiro a morrer na guerra. Além dele, outros dez estrangeiros foram executados entre o fim de 1914 e o início de 1916, todos espiões amadores e pouco eficientes, controlados por uma organização igualmente descuidada, com sede em Roterdã.

Fonte:

- DAROZ, Carlos. O Brasil na Primeira Guerra Mundial - a longa travessia.  São Paulo: Contexto, 2016.


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