"No próprio dia da batalha, as verdades podem ser pinçadas em toda a sua nudez, perguntando apenas;
porém, na manhã seguinte, elas já terão começado a trajar seus uniformes."

(Sir Ian Hamilton)



segunda-feira, 30 de junho de 2014

PENSAMENTO MILITAR - GUERRA E PAZ

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"A paz, em assuntos internacionais, é um período de trapaça entre dois períodos de guerra. "


(Ambrose Bierce, escritor e jornalista norte-americano)

domingo, 29 de junho de 2014

CENTENÁRIO DO ASSASSINATO DO ARQUIDUQUE FRANCISCO FERDINANDO

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Há exatos cem anos, com um tiro à queima-roupa, Gavrilo Princip mata o príncipe austro-húngaro, Francisco Ferdinando. É o pretexto para a 1ª Guerra Mundial

 

Por Andressa Rovani


Por pouco, o plano não foi por água abaixo. Inexperientes, os três jovens sérvios, Gavrilo Princip, Nedjelko Cabrinovic e Trifko Grabez, estiveram a um passo do fracasso de sua missão: matar o herdeiro do trono austro-húngaro, Francisco Ferdinando. Mas uma trapalhada da segurança do arquiduque colocou Princip de cara com o seu alvo. O tiro atingiu Ferdinando no pescoço. O crime foi a gota d’água para o início do conflito que deixou um saldo de 10 milhões de mortos.

Por trás do atentado estava a sociedade secreta Mão Negra. A organização nacionalista não havia engolido a anexação da Bósnia ao Império Austro-Húngaro, em 1908. E, em 1914, contratou o trio de sérvios para matar o arquiduque, em Sarajevo. Em seguida, os assassinos deveriam cometer suicídio com cianureto. Eles foram escolhidos justamente porque já estavam condenados à morte pela tuberculose. Não tinham o que perder.

O arquiduque austríaco Francisco Ferdinando


Com um arsenal de quatro pistolas e seis bombas, a ideia era que os rapazes, com a ajuda de agentes da organização, se distribuíssem no caminho que seria feito pela comitiva de Ferdinando com destino à prefeitura. O plano, no entanto, não saiu como eles imaginavam. Mas a sorte - ou azar - estava com Princip, que deu fim à vida do herdeiro do trono austro-húngaro em 28 de junho de 1914.

No total, oito homens foram presos. Princip foi condenado à pena máxima: 20 anos de prisão. O que ele desejava, no entanto, era morrer. "Minha vida já está arruinada. Eu sugiro que me preguem em uma cruz e me queimem vivo. Meu corpo em chamas será uma tocha para iluminar meu povo no caminho para a liberdade", declarou. Mas o jovem ainda viveria para ver, um mês mais tarde, a eclosão de um conflito que mobilizou todas as grandes potências mundiais.

Gavrilo Princip é conduzido preso após disparar contra o arquiduque


Apesar da ameaça de guerra já estar sendo gestada há anos pelos dois lados, o ataque à família real austro-húngara merecia uma resposta imediata - e à altura. Um ultimato, preparado pelo conselho ministerial austríaco, tornou inevitável o confronto. Foi a última tentativa diplomática de paz. Princip morreria antes do final da refrega, em 28 de abril de 1918.

 Fonte: Aventuras na História


A VERDADEIRA GUERRA DO FUTEBOL

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Em ritmo de Copa do Mundo, apresentamos hoje a história de um conflito que começou exatamente por causa do esporte que apaixona multidões




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Quem estuda História Militar sabe que as guerras são deflagradas por diversos motivos, geralmente ligados à geopolítica ou a conflitos de interesses mais profundos. Mas quem diria que algumas inocentes partidas de futebol pudessem dar início a uma guerra? Foi exatamente isso o que ocorreu em 1969 na América Central, entre Honduras e El Salvador.


Antecedentes

Na época, os dois países já demonstravam uma relação política instável, em função da grande imigração de salvadorenhos para Honduras, a maioria vivendo no campo. Em 1967, o governo hondurenho promoveu uma reforma agrária, confiscando as terras ocupadas por salvadorenhos que imigraram ilegalmente, enviando-os de volta para seu país de origem. Os jornais de San Salvador potencializavam as tensões, publicando supostas atrocidades cometidas contra salvadorenhos em Honduras.

Soldados salvadorenhos patrulhando a região fronteiriça entre os dois países

Em junho de 1969 as hostilidades aumentaram drasticamente após três partidas de futebol entre as seleções das duas nações, que disputavam uma vaga para a Copa do Mundo de 1970. Durante as partidas, em especial a segunda, realizada em San Salvador, jogadores, torcedores e imigrantes foram expulsos, perseguidos e assassinados, levando os dois países a romperem relações diplomáticas no fim do mesmo mês e fecharem a fronteira.

No mesmo dia da última partida, 26 de junho, El salvador rompeu relações com Honduras, alegando que o governo hondurenho não tomou medidas efetivas para punir os responsáveis pelos ataques a salvadorenhos. Exigia, ainda, reparações financeiras às vítimas dos ataques e, para todas essas demandas, Honduras não respondeu.

Dois F4U-5N Corsairs da Força Aérea Hondurenha durante missão de patrulha


Breve conflito

Na manhã de 14 de julho de 1969 começou a guerra, com ataques aéreos da Força Aérea Salvadorenha contra o aeroporto de Toncolin e outras localidades estratégicas de Honduras, enquanto seu exército lançava uma ofensiva através das duas rodovias que ligavam os países. No dia seguinte, já havia ocupado Nueva Ocotepeque e mais oito cidades.

Os hondurenhos contra-atacaram usando bombas de napalm no único ataque que seus aviões conseguiram realizar contra um aeroporto em solo salvadorenho. Ambos os contendores utilizavam caças de origem norte-americana, remanescentes da 2ª Guerra Mundial, no que foi a última guerra da história onde os dois oponentes empregaram aviões de combate a hélice. Surpreendida e com um exército despreparado, Honduras perdia cada vez mais terreno para os salvadorenhos.
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Principais ações de combate

Cessar-fogo

A Organização dos Estados Americanos (OEA) negociou um cessar-fogo, mas El Salvador só aceitou em 18 de julho, depois que o governo de Honduras prometeu que tomaria medidas para garantir a salvaguarda dos salvadorenhos residentes no país. Mesmo assim, o Exército Salvadorenho só se retirou dos territórios conquistados no dia 2 de agosto. Mais de uma década se passou até que um tratado de paz definitivo fosse assinado.


Consequências

Embora breve, o conflito provocou muitas baixas. Os salvadorenhos tiveram 900 perdas entre mortos e feridos e os hondurenhos mais de 2.000, em sua maioria civis vítimas dos bombardeios aéreos.

A fronteira entre os dois países permaneceu fechada até a assinatura do acordo de paz, interrompendo o caminho por terra no continente Americano por mais de dez anos. 

Assim como na guerra, El salvador levou vantagem também nos campos, e sua seleção de futebol conseguiu a classificação para a Copa de 1970.  Honduras ficou de fora.


Os jogos da discórdia

8/6/1969 – Tegucigalpa
Honduras 1 x 0 El Salvador

15/6/1969 – San Salvador
Honduras 0 x 3 El Salvador

26/6/1969 – Cidade do México
Honduras 2 x 3 El Salvador

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segunda-feira, 23 de junho de 2014

PERSONAGENS DA HISTÓRIA MILITAR - NICCOLÒ FONTANA TARTAGLIA

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* ??/??/1500 - Brescia, Itália

+ 13/12/1757 - Veneza, Itália




Niccolò Fontana, apelidado de Tartaglia, foi um matemático italiano considerado o "pai da ciência balística". Quando criança, quase foi morto pelas tropas francesas que laceraram suas bochechas e mandíbula com cortes de sabre profundos quando capturaram sua cidade natal de Brescia, em 1512, durante as Guerras Italianas (1494-1559). Em razão de seus ferimentos veio seu apelido, Tartaglia (o gago).  Sua reputação como matemático veio com a vitória em uma competição para resolver equações cúbicas algebricamente. O trabalho de Tartaglia teve um grande impacto sobre os assuntos militares, quando publicou um artigo sobre a aplicação da matemática ao fogo de artilharia, no qual esboçou uma compreensão científica da balística e publicou as primeiras tabelas de tiro.

Ele é mais lembrado por "teorema de Tartaglia," que provou que a trajetória de um projétil é sempre uma linha curva, em vez de uma linha reta até o alvo, como é normalmente percebido a olho nu. Com seus cálculos, provou que o alcance máximo de uma bala de canhão, em qualquer velocidade, é obtida pelor disparo a uma elevação de 45,8º. Antes disso, os artilheiros acreditavam que suas balas de canhão voavam em linha reta depois de deixar o tubo, um erro que muitas vezes os levou ao fogo curto ou a posicionar os canhões perigosamente perto do inimigo.

Tartaglia também inventou quadrante de nível, pelo qual um mestre-artilheiro calculava e definia a elevação do tubo para atender a faixa desejada de acordo com uma tabela pré-estabelecida em graus, e indicada por um fio de prumo. Finalmente, Tartaglia calculou os alcances máximos eficazes para diversos tipos de peças de artilharia conhecidos.

O quadrante de nível, utilizado pelas artilharias até os dias de hoje, segue os princípios de Tartaglia
 

Tartaglia se preocupou com os efeitos morais da aplicação da ciência à arte da guerra, e chegou a destruir o manuscrito sobre projéteis a fim de impedir a sua aplicação na guerra. No entanto, quando a Itália foi ameaçada pelos otomanos, ele deixou de lado seus escrúpulos e publicou novo tratado, a Nuova Scientia (1537), que foi seguido por outros trabalhos sobre ciência militar na década de 1540.

Posteriormente, envolveu-se em disputas com Girolamo Cardano, que publicou primeiro sua solução, mesmo havendo antes jurado que não o faria. Sua maior obra, Ars Magna, foi publicada na Alemanha em 1545 e tornou-se o maior compêndio algébrico existente da época. A resolução de Tartaglia, com todos os detalhes, lá estava publicada. A partir daí, iniciou-se uma enorme inimizade com ásperas discussões, a disputa apenas terminou quando o discípulo de Cardano, Lodovico Ferrari, de posse da solução da equação do quarto grau, propôs questões que Tartaglia não conseguiu resolver.

Artilheiros renascentistas utilizando o quadrante de Tartaglia para apontar seus canhões com a elevalção correta


Fez o "Tratado Geral dos Números e Medidas" (1556-1560), que contém regras de aritmética, álgebra, geometria e física. Publicou Travagliata inventione (1551).  Tartaglia morreu em Veneza, no ano de 1557, aos 57 anos de idade.


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terça-feira, 17 de junho de 2014

AVIÃO SOVIÉTICO ABATIDO NA 2ª GUERRA MUNDIAL É ENCONTRADO COM SEU PILOTO ENTERRADO EM UM PÂNTANO

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Essa é a história do piloto russo Michail Gavrilov, da Força Aérea Soviética, desaparecido em 1942, cujo corpo foi encontrado intacto em um pântano russo, 68 anos mais tarde.
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Em abril de 1942, o tenente Michail Gavrilov já era um piloto experiente.  Participara de várias missões com seu IL-2 e abatido várias aeronaves alemãs.  Condecorado por bravura, tinha 26 anos de idade, era casado e tinha um filho.

Tenente Michail Gavrilov

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Os Ilyushin IL-2 Sturmovik e seus pilotos são considerados elementos que tiveram participação decisiva na 2ª Guerra Mundial, para conter os avanços alemães. Durante a guerra foram fabricados mais de 36.000 IL-2, tornando-o o modelo de avião de guerra mais produzido da história. Sua cabine não era blindada, o que representava alto risco aos pilotos - mas que também ressaltava a coragem e heroísmo de seus ocupantes.

Ilyushin IL-2 Sturmovik

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30 de abril de 1942 foi um dia comum no front soviético, novamente vencido pelos Sturmovik IL-2, que abateram 36 aviões alemães, e perderam apenas 9. Porém, uma destas perdas permaneceu envolta em mistério durante décadas.  O IL-2 de Gavrilov, após reportar situação de ataque na região de Demyannsk, simplesmente desapareceu e os restos da aeronave nunca foram encontrados.
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ENCONTRANDO O STURMOVIK
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Em abril de 2010, um grupo militar de sondagem encontrou um caça russo "enterrado" em um pântano e, após vários dias de escavação, esclareceu: era o IL-2 de Gavrilov, com os restos mortais do piloto, extremamente bem conservados após 68 anos de espera.
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O tenente Gavrilov ainda vestia seu macacão de voo, capacete e botas de batalha, mas não estava com sua identificação, armamento individual, paraquedas e relógio, o que significa que o avião foi encontrado e saqueado.  A identificação foi feita pelo código do avião, número de série do motor e pelo fato de estar ocupando a cabine do piloto da aeronave.

   

Imagens da escavação para recuperar o IL-2


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Supõe-se que, ao atacar uma instalação inimiga, o IL-2 de Gavrilov foi atingido por uma bateria antiaérea, obrigando-o a pouso forçado. A resposta se Gavrilov morreu durante o pouso ou se foi executado em solo pelos alemães será dada pelos peritos. Triste fim para um singular membro da mais corajosa equipe de pilotos da 2ª Guerra Mundial.

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CURIOSIDADE
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Gavrilov não foi o único. Em 2008 o piloto Boris Lazarev foi encontrado em sua aeronave durante sondagens de uma empresa de Topografia. Os pântanos europeus possuem alta concentração de Tanino, que inibem a proliferação de bactérias. Por isso os corpos são naturalmente "mumificados", permanecendo intactos durante centenas de anos. 

Equipe de resgate junto aos restos mortais do tenente Gavrilov




sexta-feira, 6 de junho de 2014

O MAIS LONGO DOS DIAS - 70 ANOS

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Hoje, 6 de junho de 2014, é comemorado o 70º aniversário da maior operação anfíbia da história: o desembarque dos Aliados na Normandia, que passou à história como o "Dia D".   Nas praias francesas consolidou-se a invasão da Europa e a maré do maior conflito da humanidade começou a mudar.
Publicamos, a seguir, um interessante ensaio da Revista Veja, trazendo uma reportagem fictícia sobre o evento que modificou a história.


Ondas, areia, arame farpado, barricadas, minas. Com os corpos castigados pelo peso do equipamento na mochila, de rifles em punho, dezenas de milhares de soldados americanos, britânicos e canadenses avançam sobre as praias do litoral norte da França. Acima de seus capacetes, milhares de aviões fazem a varredura do espaço aéreo atacado. Em todo o horizonte, milhares de embarcações deixam os colossais portos artificiais e atracam nas praias, despejando equipamentos e pessoal na Gália invadida. Ar, terra e mar são parte de uma só engrenagem. Normandia, 6 de junho de 1944. O primeiro dia de Netuno - a fase de arranque da Operação Overlord - encerra a maior invasão anfíbia de todos os tempos. Os Aliados estão de volta à Europa continental para tentar acabar com o jugo da Alemanha nazista.

Lograr este intento, é sabido, será uma outra história. Contudo, sob qualquer aspecto, a manobra de desembarque na França setentrional não tem precedentes. Mais de 185.000 homens e 20.000 veículos aéreos, marítimos e terrestres foram envolvidos no ataque, minuciosamente planejado pela equipe comandada pelo general Dwight D. Eisenhower. Inicialmente concebido para ocorrer na segunda-feira, dia 5, o "Dia D" - como a data foi chamada pelos Aliados - foi adiado por 24 horas pelas condições meteorológicas inapropriadas. Ainda assim, a incerteza sobre a efetivação da gigantesca operação não se dissipara por completo, até porque os céus franceses permaneciam lúgubres a olho nu.

O diretor da equipe de meteorologia de Eisenhower, o escocês Jim Stagg, garantiu ao general que o tempo viraria a contento dos Aliados entre segunda e terça-feira. Mesmo assim, dos três chefes das Forças Aliadas, apenas dois deles - Bernard Montgomery, do Exército, e Bertram Ramsey, da Marinha - eram favoráveis ao ataque no dia 6; o comandante da Força Aérea, Arthur Tedder, continuava considerando que a visibilidade dos céus gauleses não propiciaria suficiente cobertura aérea. Eisenhower sabia que, dadas as condições do tempo, um novo adiamento empurraria o ataque para, no mínimo, 19 de junho - e milhares de soldados já estavam havia mais de 50 horas em alerta em seus postos, espremidos em naves de desembarque, prontos para o assalto.

O fator surpresa também estava do lado do americano - apesar de sua magnitude, a operação seguia ignorada pelos oponentes. Em primeiro lugar, porque os Aliados haviam executado com sucesso um plano de dissimulação do ataque à Normandia, fazendo o comando germânico acreditar que a invasão ocorreria no Passo de Calais, destacando até mesmo o general George Patton para comandar um fictício exército de 12 divisões no local. Além disso, somente os Aliados podiam contar com essas previsões da meteorologia: todas as estações alemãs - na Islândia, na Groenlândia, em Spitzbergen e na ilha de Jan Mayen - haviam sido tomadas na preparação do ataque pelas forças anglo-americanas. Ou seja, para os germânicos, jamais uma manobra militar anfíbia poderia ser feita sob aquele clima.





Aniversário em Ulm  
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Exatamente às 4 horas da madrugada do dia 5, os líderes militares responsáveis pela Operação Overlord ("suserano", na tradução para o português) estavam reunidos no quartel-general de Eisenhower, em Southwick House, Portsmouth, na Inglaterra. Cabia única e exclusivamente ao comandante supremo tomar a fatídica decisão. "Estou certo de que temos de prosseguir. Não vejo como possamos proceder de outra forma", disse Eisenhower, depois de todas as ponderações possíveis, aos oficiais. "Ok, vamos lá".

Enquanto os comandantes das três armas disparavam as ordens decisivas a seus subordinados, os alemães repousavam. Enganados pela camuflagem aliada, seguiam tranquilos de que a invasão - que, é verdade, esperavam mais cedo ou mais tarde - ficaria para bem mais tarde. O marechal germânico Erwin Rommel, nomeado por Hitler em janeiro como Comandante-em-Chefe do Exército B, responsável por repelir qualquer tentativa de invasão na Europa, estava certo de que aquela terça-feira seria apenas mais uma no calendário. Despreocupado, voou para Ulm, em seu país natal, para celebrar o aniversário da esposa.

A invasão da Europa começou nos primeiros minutos do dia 6, com a aterrissagem dos paraquedistas e planadores da 6ª Divisão Aeroterrestre Britânica, a Oeste do Rio Orne. Este grupo se responsabilizaria pela proteção do flanco esquerdo das praias que seriam invadidas pelas cinco divisões aliadas; já o flanco direito ficaria sob a responsabilidade da 82ª e da 101ª Divisões Aeroterrestres Americanas, que pousaram entre Ste. Mère Eglise - a primeira cidade na França a ser libertada - e Carentan. No total, as três divisões compreendiam 23.400 homens, que sofreram com fortes ventos na região. Muitos deles foram parar no interior francês, e seus comandantes tiveram extrema dificuldade em reuni-los para atacar os alvos pré-estabelecidos. Os poucos que conseguiam se agrupar, entretanto, investiam com fúria contra os inimigos. Ironicamente, a dispersão confundiu a resistência germânica, para quem os pára-quedistas aliados haviam se espalhado por toda a Normandia; sem captar um padrão de movimento, os alemães não sabiam como responder aos ataques.

Um grupo de soldados da célebre 82ª Divisão americana logo conseguiu encurralar a 91ª Divisão germânica, comandada pelo General Falley, evitando assim quase toda a resistência tedesca na porção mais ocidental do desembarque aliado. No lado oriental, os bravos boinas-vermelhas do 9º Batalhão de Paraquedistas britânicos, comandados pelo tenente-coronel Otway - que conseguiu agrupar apenas 150 homens -, lograram imprimir o martírio contra as fortificações alemãs em Merville, em uma das batalhas mais sangrentas da jornada. Dessa forma, ao anoitecer, ambos os flancos da invasão já estavam seguros.


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Maus bocados 
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Para o ataque às praias da Normandia - que, no total, perfaziam uma faixa litorânea de aproximadamente 80 quilômetros de extensão -, o comando militar aliado enfileirou cinco diferentes divisões: duas britânicas, uma canadense e duas norte-americanas. De Oeste a Leste, tais agrupamentos atendiam pelos codinomes Utah, Omaha, Gold, Juno e Sword, cada um responsável por uma porção do litoral. O ataque às praias começou às 6h30 da manhã, pelos homens da 4ª Divisão de Infantaria Americana - justamente na que seria a mais tranqüila das abordagens, a de Utah, onde os paraquedistas já haviam imobilizado boa parte da resistência alemã. Para facilitar, a estrutura das defesas da região eram pífias. Quando a noite chegou, 23.000 soldados já haviam desembarcado, levando consigo 1.700 tanques, caminhões e metralhadoras - o número de baixas foi foi considerado proporcionalmente baixíssimo, 197 homens.
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Por diferenças na maré, os desembarques em Juno, Gold e Sword foram até uma hora e meia posteriores aos de Utah e Omaha. Em Sword, onde os paraquedistas britânicos haviam neutralizado a resistência, a 3ª Divisão de Infantaria da Grã-Bretanha não soube segurar a vantagem apesar de um início promissor - em poucas horas já havia conquistado a maioria de seus alvos. A partir daí, o avanço foi lento, provocado pelo tráfego intenso nas vias de transporte de suprimentos. Por causa disso, a cidade de Caen, um dos objetivos do dia, permaneceu em mãos inimigas.

Em Juno, a 2ª Brigada Armada do Canadá chegou ao interior após o pôr-do-sol, depois de problemas com a maré alta - a primeira vaga de naves de desembarque se perdeu praticamente por inteiro. Entretanto, próximo ao final do dia, a poderosa 12ª Divisão Panzer alemã se colocava no caminho dos Aliados, o que certamente não significaria vida fácil para os canadenses. Em Gold, os britânicos passavam por maus bocados nos momentos subsequentes ao desembarque, mas, recuperados, foram saudados por civis franceses, que atiraram flores durante sua passagem. 


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Saraivada de bombas 
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As batalhas mais sangrentas tiveram lugar em Omaha, onde desde antes mesmo do desembarque os americanos já se viam em apuros. Logo após a partida das primeiras naves que começariam a levar os 34.000 homens para suas missões, um colérico vento sudoeste abateu em sequência diversas embarcações aliadas. Tanques anfíbios afundaram como paralelepípedos: da primeira vaga de 96 veículos, um terço se perdeu. Das 16 escavadeiras blindadas enviadas para destruir obstáculos, apenas seis chegaram a seu destino - e, destas, três não funcionaram.

Os soldados que lograram chegar à praia foram recebidos com uma saraivada de bombas, tiros de metralhadora e morteiros. O caos se manteve por várias horas, com baixas significativas em ambos os lados. Para sorte dos Aliados, porém, os germânicos não tinham peças de reposição, enquanto que os invasores ganhavam reforços a cada minuto vindos dos portos artificiais, os Mulberries, especialmente desenhados para essa operação. Dessa forma, aos poucos, a supremacia no território em Omaha acabou finalmente obtida.

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Para selar e ratificar o êxito terrestre, a Força Aérea Aliada, com seus Spitfires, Typhoons, Thunderbolts e Lancasters, foi também de crucial importância. Além de lançar os paraquedistas no início da jornada, bombardeiros garantiram a supremacia no céu normando durante o dia. A outrora temível e poderosa Luftwaffe - que na conquista da França, em 1940, aterrorizou os britânicos com os Stukas e Bf-109s - terminou o dia com apenas 185 aeronaves em condições de combate. No total, os Aliados colocaram 13.743 aviões no espaço aéreo gaulês, perdendo apenas 114.

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Unidades clandestinas 
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Os números finais do já histórico 6 de junho de 1944 informam que 75.515 soldados britânicos e canadenses e 57.500 americanos desembarcaram pelas praias; outros 7.900 e 15.500, respectivamente, pelo ar. Calcula-se que 2.500 militares aliados tenham sido mortos, cerca de 1.000 apenas em Omaha. As baixas totais, incluindo mortos, feridos, desaparecidos ou prisioneiros, são estimadas em 6.600 americanos, 3.000 britânicos, 946 canadenses e em torno de 6.500 alemães.

O presidente dos Estados Unidos, Franklin Roosevelt, foi econômico ao comentar o êxito da primeira fase da Operação Overlord. "Está tudo correndo de acordo com o planejado", sentenciou. O líder britânico Winston Churchill saudou o desempenho das tropas aliadas em seu pronunciamento na Câmara dos Comuns: "Muitos perigos e dificuldades que ontem nos pareciam extremamente terríveis já são passado".

O mais entusiasmado dos líderes, porém, foi o general francês Charles de Gaulle. "A grande batalha começou. Depois de tanto conflito, ódio e ira, o confronto final está diante de nós. Esta é a verdadeira Batalha da França", afirmou, exaltado, em transmissão radiofônica para os compatriotas, convocando-os para a pendenga. E os franceses realmente serão de grande valia para as tropas aliadas nesta campanha. Estima-se que haja 175.000 integrantes da resistência tricolor espalhados pelo país, divididos em 44 unidades clandestinas sob o comando do general Pierre Koenig. Como este, por sua vez, responde a Eisenhower, essa legião deverá se tornar parte integrante e ativa dos esforços de guerra dos Aliados.

Após o coruscante êxito do desembarque na Normandia, o mundo espera agora os próximos movimentos da Operação Overlord. Calcula-se que será necessário transportar ainda 2 milhões de soldados - todos equipados - para a França, a fim de que o processo de retomada da Europa seja completado. De acordo com o plano inicial, as tropas invasoras precisam caminhar rumo ao interior e tomar posse de uma área de alojamento - que seria a baixa Normandia, a Bretanha e partes do Maine e Anjou. Com esse torrão de segurança, os Aliados interromperiam sua marcha e se preparariam para atacar a fronteira da Alemanha, para depois partir em direção ao vale do Ruhr, gangrenando o coração industrial de Adolf Hitler. Contudo, a exemplo dos ventos normandos, tais planos são volúveis e seu sucesso, imponderável - como bem sabe o comandante Eisenhower.

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Fonte: Veja.com


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