Em
18 de novembro de 1919, o marechal Paul von Hindenburg usa a teoria da
"punhalada pelas costas" para se eximir da responsabilidade pela
derrota da Alemanha na Primeira Guerra Mundial.
Por Henrike
Scheidsbach
A comissão
parlamentar de inquérito investigava a questão das responsabilidades pela
Primeira Guerra Mundial, que se encerrara um ano antes. Em seu depoimento em 18
de novembro de 1919, o marechal-de-campo Paul von Hindenburg defendia a teoria
de que movimentos revolucionários da Alemanha teriam "apunhalado" o
Exército pelas costas.
"Um general
inglês disse, com razão: 'O Exército alemão foi apunhalado pelas costas'."
Essa foi uma das frases usadas por Von Hindenburg ao tentar se eximir, diante
do Parlamento, de qualquer responsabilidade pela derrota da Alemanha na
Primeira Guerra. Nascia ali a chamada "lenda da punhalada pelas
costas" (em alemão, Dolchstosslegende), que anos mais tarde
ajudaria os nazistas a tomar o poder.
O estopim do
primeiro conflito mundial havia sido o assassinato do arquiduque Francisco
Ferdinando, herdeiro do trono austro-húngaro, por um nacionalista sérvio, em 28
de junho de 1914. Um mês depois, a Áustria declarou guerra à Sérvia.
No início de
agosto, a Alemanha declarou guerra à Rússia e à França. A invasão da Bélgica
pelos alemães, que não tinham outra forma de atingir a França, foi pretexto
para a entrada da Grã-Bretanha na guerra, que envolveria ainda muitos outros
países.
O plano alemão
de cercar rapidamente o Exército francês fracassou. Já em outubro de 1914, a
guerra na Europa Ocidental passou a ser tática, com pesadas perdas para todos e
praticamente sem alteração nas frentes de batalha até 1918.
Paul von Hindenburg semeou a lenda
O abastecimento
piorou a tal ponto na Alemanha que 260 mil civis morreram de fome em 1917. O
anúncio alemão de contrabloqueio por submarinos provocou a entrada dos Estados
Unidos no conflito.
Em março de
1918, a Alemanha ainda forçou a Rússia a assinar um acordo de paz no Leste
Europeu; em agosto, praticamente capitulou diante dos aliados na frente
ocidental. Segundo anotações de um comandante da região de Flandres, milhares
de soldados alemães e divisões inteiras de tanques estavam virando cinza.
Fome
tirou entusiasmo pela guerra
Para
antecipar-se a uma vitória das tropas aliadas no ocidente, o comandante geral
Erich Ludendorff pediu um cessar-fogo imediato. Na Alemanha, as mortes de civis
famintos no inverno de 1917 quebrara o entusiasmo inicial pela guerra. Naquele
ano, operários da indústria de armamentos entraram em greve em protesto contra
a fome.
Em julho, os
partidos democráticos formaram uma comissão interpartidária e exigiram do
governo imperial – sem sucesso – uma "paz de entendimento, sem anexação
forçada de territórios".
No início de
novembro de 1918, em meio às negociações do cessar-fogo, marinheiros em Kiel
impediram a partida da frota da Marinha para um combate e, com essa
insubmissão, desencadearam uma reação em cadeia na Alemanha.
Na disputa pelo
poder, as forças democráticas, comunistas e nacionalistas derrubaram a
monarquia. Os democratas saíram vitoriosos e foram legitimados, mais tarde,
pela Assembleia Nacional Constituinte. O antigo regime entregou à comissão
interpartidária o governo e o pesado fardo de aceitar um acordo de paz
desvantajoso, do ponto de vista da Alemanha.
Todos esses
acontecimentos internos, que causaram a derrocada do antigo regime e o
nascimento da democracia, serviram ao Comando Superior das Forças Armadas para
desviar a atenção da própria culpa pela guerra.
O argumento de
Von Hindenburg, de que as forças revolucionárias teriam desmoralizado e
apunhalado o Exército pelas costas, foi propagado por militares e políticos
monarquistas, através de jornais conservadores e de extrema direita, e ganhou
um teor explosivo subestimado pelos democratas.
A população,
inicialmente castigada pelas reparações de guerra pagas pela Alemanha, sofreu
as consequências do desemprego e da inflação, sem ter um esclarecimento amplo
dos verdadeiros motivos da guerra. Os nazistas aproveitaram essas
circunstâncias para difamar a democracia e chegar ao poder com promessas de
salvação.
Fonte: DW
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