“A
história só nasce para uma época quando ela está inteiramente morta. Assim, o
domínio da história é o passado, o presente convém à política e o futuro
pertence a Deus.”
(J.
Thiénot)
O
futuro a Deus pertence! A máxima de
Thiénot deixa clara a imprevisibilidade do que pode acontecer com nossos
projetos de vida e a incerteza da nossa caminhada. Assim, mesmo nunca imaginando esta
possibilidade, a vida trouxe o editor do Blog Carlos Daróz-História Militar a
residir na França, mais precisamente em Paris, por uma temporada.
Já
nos dois primeiros dias aqui, é muito fácil constatar que a capital francesa
transpira história, patrimônio, cultura, tradição e, acima de tudo, encerra
inúmeras referências relacionadas com a História Militar. Nesse sentido, a partir de hoje procurarei
postar aqui no Blog todas as visitas, referências, monumentos, sítios e
indicações relacionadas com o tema que eu tiver condições no período em que
estiver morando aqui, embora, de antemão, tenha a consciência de que será
impossível esgotar o assunto, devido à sua riqueza.
Hoje
começo com o belíssimo monumento A Defesa de Paris, que faz referência à
obstinada defesa da capital francesa diante do cerco realizado pelos prussianos
durante a Guerra Franco-Prussiana.
A
Defesa de Paris é uma escultura de Louis-Ernest Barrias inaugurada em 12 de
outubro de 1883 na encruzilhada de Courbevoie (hoje distrito de La Défense), no
território da cidade de Puteaux, nos Hauts-de-Seine. Homenageia a memória das vítimas militares e
civis que caíram durante o cerco de Paris na Guerra Franco-Prussiana de 1870.
O escultor Louis-Ernest Barrias venceu o disputado concurso para elaboração da escultura
Contexto
histórico
Em
19 de setembro de 1871, os alemães começaram a sitiar Paris. O novo governo
dispôs-se a negociar com Bismarck, mas suspendeu as conversações quando soube
que os alemães exigiam a Alsácia e a Lorena. O principal líder do novo governo
francês, Léon Gambetta, fugiu de Paris num balão, estabelecendo um governo
provisório na cidade de Tours para reorganizar o exército no interior. A partir
daí seriam organizadas 36 divisões, todas destinadas ao fracasso.
Mapa mostrando o cerco de Paris pelos prussianos
Esperanças
de um contra-ataque francês dispersaram-se quando o marechal François Achille
Bazaine, com um exército de 173.000 homens, apresentou sua rendição em Metz,
no dia 27 de outubro.
A
capitulação oficial de Paris ocorreu em 28 de janeiro de 1871. Louis Adolphe
Thiers, velho político francês, foi eleito pela assembleia como chefe do
executivo e solicitou um armistício aos prussianos, o qual foi concedido por
Bismarck. O armistício incluía a eleição de uma assembleia nacional francesa
que teria a autoridade de firmar uma paz definitiva. A Assembleia Nacional
Francesa reuniu-se em Bordéus, em 13 de fevereiro, nomeando Louis Adolphe
Thiers o primeiro presidente da Terceira República Francesa. O acordo, negociado
por Thiers, foi assinado em 26 de fevereiro e ratificado em 1º de março. A
população de Paris, entretanto, recusou-se a depor as armas e, em março de
1871, revoltou-se, estabelecendo um breve governo revolucionário, a Comuna de
Paris.
Em
1879, os republicanos se tornaram maioria no parlamento e se estabeleceram
definitivamente no poder. O novo regime procurou distinguir-se da República de
Mac Mahon, insistindo em recordar a política de defesa nacional que os
republicanos haviam conduzido de setembro de 1870 a janeiro de 1871, durante a Guerra
Franco-Prussiana.
Nesse
sentido, em homenagem à obstinada defesa de Paris, os republicanos também
manifestaram seu desejo de reintegrar a capital na comunidade nacional e acabar
com as divisões nascidas da Comuna de Paris.
A
construção de monumentos também afetou a ordem simbólica: a Terceira República
foi percorrida do nível nacional a nível local a partir da década de 1880, por meio
de uma "estatuomania" sem precedentes, que variava do Bourgeois de
Calais de Rodin, ao Triunfo da República de Jules Dalou, valorizando os
"pequenos patriotas", bem como a grande Pátria francesa.
Um
concurso com grandes artistas
Para
comemorar a defesa heroica de Paris contra os prussianos, a Prefeitura do Sena
organizou, em 1879, um concurso para a construção de um monumento na rotatória
de Courbevoie, localizada no final da Avenida de Neuilly, e no alinhamento do
Arco do Triunfo, onde os Guardas Nacionais se reuniram antes da última batalha
de Buzenval, ocorrida em 19 de janeiro de 1871 na fase final da conflito.
Cem
artistas competiram, incluindo Gustave Doré, Auguste Bartholdi,
Carrier-Belleuse, Alfred Boucher, Alexandre Falguière e Auguste Rodin, mas a
escolha dos jurados foi pelo projeto de Louis-Ernest Barrias. O
monumento foi erguido sobre o que era a rotatória de Courbevoie e ali
permaneceu até 1965, instalado em uma base que, até então, havia apoiado uma
estátua de Napoleão I.
A
localização tornou-se o distrito comercial e financeiro de La Défense, cujo
nome deriva da obra de Barrias. Devido
aos trabalhos de construção do moderníssimo distrito, a escultura foi desmontada
e armazenada por vários anos, até ser reinstalada, em 21 de setembro de 1983,
cem anos após a sua inauguração e praticamente no mesmo local que antes.
A prestigiada inauguração
Na
tarde de 12 de agosto de 1883, uma grande multidão, estimada em mais de cem mil
pessoas, participou da inauguração de escultura de Barrias em cerimônia
presidida pelo Ministro do Interior da França, Pierre Waldeck-Rousseau.
A escultura ainda instalada sobre a base original em 1910
A
cerimônia começa às 16 com uma salva de vinte e um disparos disparos de canhão
posicionados no Monte Valerian, enquanto a banda de música da Guarda
Republicana executava a Marseillaise. Após os discursos habituais, homenageando
o patriotismo dos combatentes e a coragem heroica dos parisienses sitiados, a
inauguração terminou com um grande desfile militar.
Após
a partida das autoridades, o público pode finalmente aproximar-se do monumento,
colocado no centro da praça instalado em uma base de granito, cercado por um
portão de ferro, e iluminado por lanternas a gás nos quatro vértices.
Na
inauguração, os partidários da Comuna de Paris perturbaram a cerimônia
patriótica, uma bandeira vermelha foi desdobrada, e pôde-se ouvir as palavras
de ordem: "vida longa à anistia; vida longa à República Social".
A
escultura e suas representações
A
escultura produzida em bronze representa as três figuras que simbolizam a
defesa de Paris:
-
Uma mulher, vestida com o uniforme da Guarda Nacional, apoiada em um canhão e
segurando uma bandeira, representa a figura alegórica da cidade de Paris.
-
Os defensores assumem as características de um jovem soldado mobilizado, que
coloca um último cartucho no seu fuzil Chassepot. As duas figuras olham para
Buzenval, o lugar dos últimos combates em janeiro de 1871.
-
Do outro lado do monumento, uma menina prostrada que, com sua expressão triste e
aparência miserável, personifica os sofrimentos da população civil.
A mulher vestida com o uniforme da Guarda Nacional e empunhando a bandeira representa a própria Paris. O soldado colocando o último cartucho em seu fuzil faz referência ao exército francês.
A menina prostrada , com sua expressão triste e aparência miserável, personifica os sofrimentos da população civil parisiense
Placa indicativa do monumento
Barrias
inspirou-se no trabalho de Amédée Doublemard, A Defesa da barricada de Clichy,
também conhecido como monumento ao marechal Moncey, da Place de Clichy em
Paris.
O editor do Blog Carlos Daróz-História Militar diante do monumento A defesa de Paris
O
monumento emprestou seu nome ao distrito La Défence, que se tornou o principal centro
de negócios e finanças da Europa.
O distrito de La Défence, maior centro financeiro da Europa, recebeu seu nome devido à referência do monumento de Barrias
Referências
-
BEST, Janice. Les monuments de Paris sous la Troisième République: Contestation
et commémoration du passé. Paris: L'Harmattan, coll. Histoire de Paris, 2010.
-
LAVALLE, Denis. Le monument de la Défense et la statuaire du XIX siècle. Paris:
Archives départementales des Hauts-de-Seine, 1983.
Olá Carlos,
ResponderExcluirVisite o musée de l'armée construído por Luiz XIV, terá material para um ano no mínimo e por toda Paris existem monumentos e homenagens aos combatentes.
Sou fã do seu blog, que aliás é muito bom,
Abraços Antonio