"No próprio dia da batalha, as verdades podem ser pinçadas em toda a sua nudez, perguntando apenas;
porém, na manhã seguinte, elas já terão começado a trajar seus uniformes."

(Sir Ian Hamilton)



quarta-feira, 18 de setembro de 2013

A MORTE DO TENENTE SIQUEIRA CAMPOS

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Antônio de Siqueira Campos nasceu em Rio Claro-SP no ano de 1898. Formado na Escola Militar, ainda no posto de tenente participou do Movimento Tenentista e da Revolta do Forte de Copacabana, em julho de 1922. Foi um dos militares que marcharam na Avenida Atlântica, na orla marítima de Copacabana, em direção à tropa legalista e que, após intenso tiroteio em um combate totalmente desigual – 18 revoltosos contra 3.000 soldados do governo –, acabaram sendo derrotados em frente à Rua Barroso, na altura do Posto 3 de Copacabana, no episódio que passou à história como  “os dezoito do forte”.  A maioria dos revoltosos morreu, somente sobrevivendo os tenentes Siqueira Campos e Eduardo Gomes e algumas praças. 

Posteriormente, a Rua Barroso, onde ocorreu o confronto final da Revolta dos 18 do Forte, foi rebatizada com o nome de Rua Siqueira Campos, como é conhecida atualmente. Na esquina desta rua com a Avenida Atlântica, foi erigida uma enorme estátua representando o Tenente Siqueira Campos no momento em que recebeu o tiro que o derrotou no confronto.


No calçadão de Copacabana marcham os dezoito revolucionários remanescentes contra 3.000 soldados legalistas.

Siqueira Campos participou do início do chamado Movimento Tenentista, que visava romper os vícios da política brasileira da época, em que grupos elitistas se perpetuavam no poder. Após período de exílio, o Tenente Siqueira Campos participou ativamente, como um dos seus principais líderes, da famosa Coluna Miguel Costa-Prestes. Durante mais de três anos a Coluna percorreu o interior do Brasil do Sul ao Nordeste no prosseguimento da luta para derrubar a República Velha, que viria a cair em outubro de 1930 com a ascensão de Getúlio Vargas ao poder.


Morte no Rio da Prata

O tenente Siqueira Campos morreu em um acidente aéreo, ao retornar do Uruguai para o Brasil em 10 de maio de 1930, antes da Revolução que levaria Vargas ao poder, quando a aeronave em que estava caiu no rio da Prata. Dizia ele: "À Pátria tudo se deve dar, sem nada exigir em troca, nem mesmo compreensão".

O também revolucionário tenentista João Alberto Lins de Barros viajava no mesmo avião com Siqueira Campos e, em sua obra Memórias de um Revolucionário (p.227-229), relatou como se deu o acidente com o Laté 28:


“(...) dentro do Laté 28, apinhavam-se cinco passageiros: o piloto, Comandante Negrin, veterano da guerra e reconhecido ás da aviação francesa. O Sr. Pranville, diretor da Latecoere para a América do Sul; o telegrafista, o Siqueira e eu. Os dois primeiros viajavam no comando do aparelho e o resto na cabine. Valentim Bouças, em tempo desistia da viagem. 

Apesar do risco que corríamos, sentimos alívio quando o avião tomou altura. Queríamos chegar aos nossos destinos de qualquer maneira, o mais rapidamente possível. Não tínhamos nem um minuto a perder e no momento, a questão de segurança pessoal afigurava-se nos secundária.

Tirei os sapatos, levantei a gola do sobretudo, sentando-me na primeira cadeira do lado esquerdo. Fazia um frio penetrante. Fatigado dos trabalhos diurnos, rapidamente adormeci.
Despertei com um golpe na cabeça. 

O avião boiava na água, agitando pelas ondas que contra ele se quebravam. Nós três – os da cabine – caíramos com as cadeiras, em confusão. Eu estava ferido na testa, na face esquerda e no nariz. Siqueira, o primeiro a recuperar os sentidos, arrastou-se para uma porta lateral, abrindo-a com algum trabalho. Aí a água entrou, alagando o compartimento em que nos encontrávamos, até atingir os nossos joelhos. Ele pulou fora, ficou sobre o teto da cabine e içou, com a minha ajuda, o telegrafista, já ao meu lado nesse momento. Logo após, eu me reunia também aos dois. Em cima daquele pequeno avião que, sacudido pelas ondas, afundava lentamente, estávamos os cinco passageiros do malfadado Laté 28, agarrando-nos uns aos outros, a fim de não sermos precipitados na água. Fomos tirando a roupa para poder nadar.

Um vento frio de inverno fazia-nos tremer. Densa e baixa, a cerração permitia-nos apenas lobrigar, na linha do horizonte, as luzes de uma cidade.

O motor do avião começou a desaparecer. Procuramos, instintivamente, equilibrarmo-nos em sua calda. Ninguém tomava a iniciativa de abandonar o aparelho. Nada menos de três quilômetros de mar banzeiro nos separava da costa. Uma dura etapa a vencer durante a noite, com aquele frio áspero, cortante.

O piloto Negrin, talvez levado pela responsabilidade de Comandante do aparelho, que submergia, avisou-nos de que era preciso lançarmo-nos à água. Era um homem da nossa idade, demonstrando parecença física com o Siqueira. Como nós três, estava apenas com as roupas debaixo. E, tomando a iniciativa, para dar exemplo, atirou-se à água. Seguiu-o o Sr. Pranvile, tipo de burguês francês, baixo, forte, um pouco calvo.

O telegrafista e eu permanecemos ainda no avião, agarrados ao leme do aparelho. Siqueira, vendo-me banhado em sangue, olhava-me com expressão singular. Apesar de atordoado, sentia que ele ainda não se jogara na água por minha causa. Doía-lhe deixar-me sozinho. Era preciso ganhar coragem e enfrentar a realidade, arremessando-me e tentando alcançar a costa. Precedeu-me, porém, na decisão, o telegrafista. Seguira os nossos movimentos e despira, como nós, a roupa de cima. Saltou na água e estoicamente, deixando um último adeus em espanhol, que era também uma confissão: ‘Eu não sei nadar, Vou morrer. Adeus companheiros!’. E começou a bater-se com as ondas ali, do nosso lado. Veio à tona três ou quatro vezes, sem pedir socorro. Depois desapareceu. (...) Mal havia recuperado a calma (talvez decorrido uns dez minutos de nado), ouvi, perto de mim, o grito angustiante do Siqueira. ‘Espera, João.’ Voltei-me ainda em tempo de o ver, a um metro de mim, ser tragado por uma onda. Desapareceu sem estender um braço para pedir auxílio. Apenas, na face, aquela expressão de energia indômita que eu conhecia tão bem nos momentos de luta, desfigurando agora por uma intensa expressão de dor. Esperei um instante, afastando-me somente depois que percebi que ele não retornaria (...) jamais poderia eu supor, naquele momento, que o vitimara um ataque de angina, conforme foi constatado, mais tarde, pela autópsia”.



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9 comentários:

  1. A 2a. edição do livro do tenente João Alberto Lins de Barros saiu sob o selo da Biblioteca do Exército Editora (Bibliex) em 1997 sob o título: "A Marcha da Coluna".
    O relato da morte do revolucionário Siqueira Campos, o mesmo transcrito acima, nesta edição está nas páginas 182-183.

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  2. Grande militar Brasileiro.... pelo qual eu tenho a honra de carregar o seu sobrenome!

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  3. O tenente Antonio Siqueira Campos foi o militar mais importante de minha família,onde também em Pernambuco registro o meu tio ,o Coronel Siqueira Campos ,que foi assassinado em Arcoverde e era comandante do batalhão local.Tenho uma dúvida sobre essa tradicional foto onde meus familiares diziam que Siqueira Campos era o do centro com a arma em punho.Este é o meu blog:http:fseamada.blogspot.com

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  4. Boa noite ,estive hoje no Forte de Copacabana e uma frase me intrigou onde Siqueira Campos citou "aquela que não se pode dizer" . O Sr. sabe do que se trata ?
    Desde já agradeço a atenção ❗
    Simone Figueiredo
    Rio de Janeiro

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    1. Oi Simone, boa noite. Infelizmente, não sei o contexto da frase, mas vou pesquisar. Se descobrir algo, publico aqui. Abraço.

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    2. Simone. Ele tinha um amor proibido, a quem não podia expor. Era uma pessoa comprometida.

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    3. Isabel, muito obrigado pelo esclarecimento. Abraço.

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  5. Boa tarde, estou pesquisando sobre Ana Maria Siqueira Campos, provável parente do Tenente; Onde posso obter informações dos familiares

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