"No próprio dia da batalha, as verdades podem ser pinçadas em toda a sua nudez, perguntando apenas;
porém, na manhã seguinte, elas já terão começado a trajar seus uniformes."

(Sir Ian Hamilton)



quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

CHINA CONTURBADA

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No século XIX potências estrangeiras intervieram nos assuntos internos de um combalido Império Chinês e, aos poucos, foram se apossando de seu território. A erosão do poder da China foi acelerada pela natureza altamente conservadora do governo Qing, o que conduziu o país a guerras civis e, por fim, à revolução em 1911.



Os manchus do norte da China tomaram o poder da dinastia Ming em 1644, estabelecendo a nova dinastia Qing. Expandindo-se aos poucos, eles assumiram o controle de Taiwan em 1683, Amur, na Sibéria, em 1689, a Mongólia em 1697, o Tibete em 1720 e o Turquestão oriental em 1760. Em 1769, a Coreia, o Anam (atual Vietnã), o Laos e Mian (atual Mianmar) haviam se tornado estados vassalos.



A China se isola

No final do século XVIII a dinastia Qing fechou a China para as potências europeias, criando conflito. Como seus antecessores, o imperador Qianlong (1736-1796) governava “um império sem fronteiras” e não reconhecia iguais. Em 1793, no auge da expansão europeia, ele encontrou-se com uma delegação comercial britânica comandada por lorde Macartney, que havia velejado para a China a bordo do HMS Lion, um navio de guerra de 64 canhões. O imperador recebeu a delegação, mas recusou-se a fazer qualquer concessão comercial, afirmando que não protestaria se o rei George III lhe prestasse homenagem, mas que nenhum artigo manufaturado poderia ser trocado pelas exportações chinesas (basicamente chá, porcelana e seda), que só poderiam ser pagas com prata.

Uma missão posterior britânica foi expulsa em 1816, no reinado do imperador Jianqing (1796-1820). Como resultado, aumentou a demanda pelas importações chinesas, enquanto os suprimentos de prata se tornavam cada vez mais escassos.

A suspensão de importações europeias por parte da China e a crescente demanda por chá, porcelana e seda chinesas na Europa causaram enorme desequilíbrio comercial entre as duas regiões. A Companhia das Índias Orientais tentou equilibrar a balança com a venda ilegal de ópio de Bengala para a China. À medida que o número de dependentes aumentou, os chineses tentaram suprimir o comércio, confiscando estoques de ópio em Cantão e sitiando mercadores britânicos.



Primeira Guerra do Ópio

Em junho de 1840 uma frota de 44 navios britânicos com cerca de 4 mil tripulantes foi enviada de Cingapura para exigir compensação. A expedição bloqueou a foz do rio Pérola e, em seguida, derrotou os chineses na desembocadura do rio Yang Tse. Cidades litorâneas foram bombardeadas, Cantão foi capturada, e os britânicos se apossaram de postos de coleta de impostos, reduzindo drasticamente os rendimentos imperiais.

Devido à falta de modernização, as defesas da China não podiam fazer frente aos vapores blindados e aos canhões e mosquetes europeus: a arma principal da China sob domínio manchu nesse período era ainda o arco laminado.

Em 1842 os chineses foram forçados a aceitar o Tratado de nanquim, cedendo Hong Kong à Grã-Bretanha e abrindo aos mercadores britânicos cinco dos chamados “portos do tratado”, sobre os quais a China não tinha jurisdição. O imperador também reconheceu a Grã-Bretanha como igual à China. Os EUA e a França ganharam direitos similares em 1844.



Segunda Guerra do Ópio

Embora as restrições comerciais fossem levantadas depois da guerra, o ópio permaneceu ilegal. Em 1856 funcionários chineses abordaram o Arrow, um navio chinês de registro britânico suspeito de contrabandear ópio. Os britânicos retaliaram com a captura de Cantão e o ataque a outros portos chineses, dessa vez com a participação da França, que usou como pretexto o assassinato de um missionário francês na China.
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Combate de rua em Cantão, durante a Segunda Guerra do Ópio

 
Em 1858, com os britânicos aproximando-se de Pequim, os chineses assinaram o Tratado de Tientsin, concedendo pela primeira vez aos diplomatas britânicos representações na corte imperial e abrindo dez novos “portos de tratado”. Mercadores de todas as potências estrangeiras tiveram permissão de usar os 15 portos, e os missionários cristãos e estrangeiros ganharam liberdade de viajar por toda a China. Os chineses não ratificaram o tratado imediatamente, só o fazendo depois que uma força anglo-francesa capturou Pequim e incendiou o Palácio de Verão.



Rebelião Taiping

Enquanto as potências europeias atacavam a China do exterior, o regime também era assaltado do interior. Em 1851, depois de uma insurreição na província de Guangxi, Hong Xiuquan, um acadêmico fracassado que havia estudado com um ministro batista, fundou a Sociedade dos Adoradores de Deus e proclamou uma nova dinastia: Taiping Kien-kuo (“Reino Celestial da Grande Paz”). Seu objetivo era derrubar o que para ele era o regime “estrangeiro” Qing, fazer da terra propriedade comum e banir o uso de ópio, tabaco e álcool.

Explorando os temores da população acerca da decadente economia chinesa, os rebeldes logo cresceram em número e determinação. Em dois anos, um exército de 1 milhão de homens varreu o vale do Yang Tse e capturou Nanquim, matando milhares de civis e cerca de 30 mil soldados imperiais. Com Nanquim como capital, o Reino Celeste expandiu-se e chegou a abranger boa parte da China meridional e central, com uma população de cerca de 30 milhões de pessoas. No entanto, seu poder começou a declinar em 1861, quando Hong foi repelido em Xangai pelo “Exército Sempre Vitorioso”, treinado no estilo europeu e comandado pelo general americano Frederick Ward. Após a morte de Ward, o comando passou ao general britânico Charles Gordon, que, empregando artilharia moderna, retomou Nanquim em 1864.

Soldados imperiais durante a Rebelião Taiping

 
Durante o sítio, mais de 100 mil rebeldes cometeram suicídio, entre eles Hong, que ingeriu veneno. A luta terminou com a derrota dos sublevados em 1871.



Guerras contra a França e o Japão

Com o Vietnã meridional e central sob seu controle em 1883, a França invadiu a província nortista de Tonquim, dominada pela China. O capitão Henri Rivière marchou rumo a Hanói e expulsou os soldados chineses que ocupavam a cidade, mas foi morto em um contra-ataque. Em seguida os reforços franceses alcançaram uma série de vitórias, forçando o vice-rei chinês a conceder um protetorado conjunto sobre a província.

Quando o governo da França rejeitou o acordo, a Xchina declarou guerra. Seu exército resistiu bem aos ataques franceses no sul, mas a ilusão de que a China poderia enfrentar de igual para igual o poderio militar europeu evaporou-se quando, em apenas meia hora em agosto de 1844, canhões navais e torpedeiros franceses destruíram uma frota chinesa inteira com seis novos cruzadores em Fuzhou. Pelo acordo de paz, a China cedeu o Vietnã à França.

Coisa pior viria na década seguinte, quando o Japão e a China entraram em choque por causa do protetorado chinês na Coreia. Apesar de em menor número, as forças japonesas alcançaram vitórias importantes. Em agosto de1894, navios dos dois países enfrentaram-se no rio Yalu, na fronteira entre a Rússia e a China. A tática e o armamento superiores dos japoneses, combinados com a inépcia chinesa (dois de seus navios foram destruídos quando sua pintura e verniz pegaram fogo), deram ao Japão uma fácil vitória e a posse de Taiwan.

A Coreia recuperou sua independência, mas a rivalidade entre a Rússia e o Japão pela península Coreana levou à guerra em 1904-1905 e à anexação do país pelo Japão em 1910.


A Rebelião Boxer

O ressentimento contra o envolvimento estrangeiro na China atingiu o clímax na Rebelião Boxer, de 1899. Encorajada pela imperatriz viúva Cixi em troca de seu apoio à dinastia Qing, a Sociedade I-ho-chuan (“Punhos harmoniosos e justiceiros”) tinha o objetivo declarado de expulsar da China todos os estrangeiros, particularmente os missionários cristãos. Em 1899 alguns desses boxers – assim chamados por causa de sua crença de que certos rituais de boxe chinês os tornariam imunes aos disparos das armas de fogo – atacaram os cristãos e queimaram suas igrejas na região de Pequim.
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Tropas estrangeiras da força multinacional em Pequim durante a Rebelião Boxer

 
Uma força multinacional tentou sufocar o levante, mas foi repelida pelas tropas imperiais. Cixi, então, ordenou a morte de todos os estrangeiros e, como resultado, morreram um ministro alemão e um diplomata japonês. Uma força multinacional muito maior entrou em Pequim em agosto de 1900 e finalmente esmagou os rebeldes.

Em consequência, a China teve de pagar US$ 6,5 bilhões (em valores atuais), suas fortalezas costeiras foram destruídas e todas as sociedades secretas hostis aos estrangeiros foram banidas. Tropas estrangeiras também foram estacionadas ao longo da ferrovia entre Pequim e Xangai.



A Revolução Chinesa

O colapso do regime Qing levou à Revolução de 1911 e a um longo período de instabilidade, que só terminou com a tomada do poder pelos comunistas em 1949. Em 1911 o Partido da Aliança Revolucionária (Kuomitang) de Sun Yat-Sen, explorando um motim do exército em Wuhan, na China central, derrubou a dinastia Qing e tomou o poder.

Sun Zhongshang proclamou os Três Princípios da Revolução – nacionalismo, democracia e socialismo -, mas retirou-se em favor do general Yuan Shikai, que se tornou presidente.



Fonte: Adaptado de War. Londres: DK Publisher, 2009.

 
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