"No próprio dia da batalha, as verdades podem ser pinçadas em toda a sua nudez, perguntando apenas;
porém, na manhã seguinte, elas já terão começado a trajar seus uniformes."

(Sir Ian Hamilton)



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domingo, 14 de novembro de 2021

A BATALHA DE CAMERONE (1863)

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Conhecida no México como Batalha de Camarón, o combate travado em 30 de abril de 1863 entre a Legião Estrangeira Francesa e o Exército mexicano, é considerado, pela Legião, como um momento decisivo em sua história. A conduta atribuída à Legião neste combate é mística e Camerone tornou-se, dentro das fileiras da Legião, sinônimo de coragem e luta até a morte.


Como parte da intervenção francesa no México, em 1863 um exército francês comandado por Conde de Lorencez, sitiava a cidade mexicana de Puebla. Temendo problemas de logística, os franceses enviaram um comboio com 3 milhões de francos, material e munições para o cerco. A 3ª Companhia da Legião Estrangeira foi encarregada de proteger o comboio, sendo o capitão Danjou o comandante.

Em 30 de abril, às 01:00h, os soldados estava a caminho. Às 7 da manhã, após uma marcha de 15 milhas, pararam em Palo Verde para descansar e preparar o café-da-manhã. Logo depois, uma força do Exército mexicano de 800 cavaleiros foi avistada. O Capitão Danjou ordenou o destacamento a assumir formação em quadrado e, apesar de recuarem, causaram as primeiras perdas pesadas ao exército mexicano, principalmente ao maior alcance do rifle francês.

Buscando uma posição mais defensável, Danjou ocupou as proximidades da fazenda Camarón, uma hospedagem protegida por um muro de três metros de altura. Seu plano era manter ocupadas as forças mexicanas para evitar ataques contra o comboio que estava nas proximidades. Enquanto os legionários preparavam-se para defender a hospedagem, o comandante mexicano, o coronel Milan, exigiu a rendição de Danjou e de seus soldados, ressaltando a superioridade numérica do Exército mexicano. Danjou respondeu: "Temos munições. Não vamos nos render."

Capitão Jean Danjou 

Aproximadamente às 11 horas, as tropas mexicanas receberam reforços, com a chegada de 1.200 soldados de infantaria. A hospedagem se incendiou, mas os franceses haviam perdido toda a água no início da manhã, quando mulas foram perdidas durante o recuo. Ao meio-dia, o capitão Danjou foi baleado no peito e morreu, seus soldados continuaram lutando, apesar todas as adversidades sob o comando do segundo tenente Vilain, que resistiu durante quatro horas antes de cair durante um ataque das tropas mexicanas.

Às 5 da tarde apenas 12 legionários permaneciam em torno do segundo tenente Maudet. Logo depois às 18:00h, com munição esgotada, os últimos soldados sob o comando do tenente Maudet, desesperadamente organizaram uma carga de baioneta. O coronel Milan, comandante dos mexicanos, evitou que seus homens cortassem os legionários sobreviventes em pedaços. 

Quando os seis últimos sobreviventes foram convidados a se renderem, eles requisitaram aos soldados mexicanos o retornar à base com a sua bandeira, manter suas armas e escoltar o corpo do capitão Danjou. Milan concordou com os termos dos franceses comentando: "O que posso recusar-se a esses homens? Não, estes não são homens, são demônios", e, por respeito, concordou com estes termos.

O comboio de abastecimento dos franceses com sessenta carroças e cento e cinquenta mulas com peças de artilharia, medicamentos, víveres e francos franceses, escoltada por duas outras companhias de legionários chegou a salvo em Puebla. Os mexicanos não conseguiram conter o cerco e a cidade caiu em 17 de maio.

O Capitão Danjou era um soldado profissional e havia perdido a mão esquerda durante uma expedição de mapeamento na campanha da Argélia. Ele tinha uma mão prostética, de madeira articulada e pintada para se assemelhar a uma luva, presa a seu antebraço esquerdo. Negligenciada por ambos, franceses e mexicanos que vieram para enterrar os seus mortos, a mão foi encontrada mais tarde por um agricultor anglo-francês, Langlais, e foi vendida e levada para a casa da Legião Estrangeira.

Em decorrência dessa batalha, Napoleão III da França determinou inscrever na bandeira de todos os regimentos estrangeiros a inscrição "Camerone 1863". Todos os militares franceses passaram a fazer a apresentação de armas ao passar pelo local da batalha em gesto de homenagem. Em 1892 foi construído um monumento com uma inscrição em latim rezando: 

"Eles foram aqui menos de sessenta, opostos a todo um exército que lhes destruiu a vida antes que a coragem abandonasse seus soldados franceses".

Na França, o dia 30 de abril é comemorado como o "Dia de Camerone", uma data importante para os legionários. A mão protética de madeira do Capitão Danjou é trazida para a exposição durante cerimônias especiais. A mão é o artefato mais importante na história da Legião e o legionário que a carrega durante desfile em sua caixa protetora é tido como grande prestígio e honra.

Tropas da Legião Estrangeira celebrando o Dia de Camerone, em Aubagne


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terça-feira, 14 de abril de 2009

RESGATE EM KOLWEZI, ZAIRE (1978)


Uma das grandes ações da Legião Estrangeira francesa na África ocorreu em 1978, no Zaire, em apoio ao governo do presidente Mobutu.


No dia 13 de maio de 1978 cerca de 4.000 Tigres, guerrilheiros da Frente Nacional de Libertação do Congo (FNLC), ocuparam a cidade de Kolwezi, na conturbada província de Sheba (ex-Katanga), cortando as comunicações com a capital e infligindo grandes perdas ao exército governamental. Seguiu-se uma orgia de violência e matanças que atingiram centenas de europeus habitantes da região. No dia seguinte, o presidente Mobutu pediu a ajuda dos franceses. A resposta veio rapidamente.


Entrada da cidade de Kolwezi

A Operação.

Em 17 de maio, por volta da 10 horas, o 2º Regimento Estrangeiro de Pára-quedistas da Legião Estrangeira (2º REP), baseado em Calvi, Córsega, foi designado para se deslocar no prazo de seis horas. Mas as ordens executivas só chegaram à 01:30h da madrugada seguinte. Às 8 horas o regimento estava na base aérea de Solenzara, pronto para partir.

O primeiro escalão embarcou naquela tarde em cinco DC-8 de carreira, seguidos pelo restante do contingente que foi junto com as armas e os veículos pesados em aviões C-141 e C-5 da Força Aérea dos EUA (USAF). Os DC-8 aterrissaram no início da noite no aeroporto de Kinshasa, capital do Zaire, onde os legionários souberam que embarcariam para Kolwezi (a 2000 km de distância) em quatro Hércules C-130 e em dois Transall C-160 da Força Aérea do Zaire.

Teriam como tarefa resgatar todos os civis que estivessem aprisionados pelos rebeldes em Kolwezi e arredores. Pouco se sabia de concreto o que acontecia em Kolwezi.

Os homens do 2º REP trabalharam toda a noite para se organizar e então embarcaram apressadamente nos aviões. Poucos já tinham saltado de um C-130 e todos teriam de usar pára-quedas norte-americanos T-10, com os quais não estavam acostumados.

Paraquedistas do 2º REP embarcando em Kinshasa, antes do salto em Kolwezi

Um pneu de um C-160 estourou durante a decolagem e os legionários tiveram que ser distribuídos pelos outros cinco aviões. Oitenta pára-quedistas foram espremidos num avião feito para levar 66 pessoas. Eles não dormiam havia 48 horas. Depois de quatro horas de vôo, o 2º REP fez com sucesso seu primeiro salto operacional desde a derrota de Dien Bien Phu, saltando diretamente sobre o objetivo e não a 1 km de distância como havia sido previsto.

Embora não houvesse oposição, a ação dos legionários foi rápida. A 1ª Companhia ocupou uma escola (Liceu João XXIII), a 2ª apoderou-se de um hospital e de uma oficina e a 3ª tomou o Hotel Impala e uma ponte. A noite transcorreu com ações esporádicas e, na manhã seguinte, os quatro C-130 e o C-160 chegaram com o restante do regimento. O comandante achou que não se justificava o risco de um salto noturno e mandou os aviões seguirem até perto de Lubumbashi. Ao amanhecer voltaram para o local da operação e lançaram os homens e os equipamentos com êxito total.

Enquanto tudo transcorria, os legionários em terra continuavam em sua tarefa de resgatar prisioneiros, impor ordem na cidade e enfrentar muito duramente os Tigres da FNLC.

Por volta do meio-dia de 20 de maio (dois dias depois da primeira aterrissagem) a situação em Kinshasa estava sob controle suficiente para que a 4ª Companhia avançasse em direção à cidade de Metal Shaba, ao norte. Ali deparou-se com uma poderosa força inimiga – que dispunha de infantaria motorizada, apoiada por dois tanques leves de fabricação soviética -, a qual foi prontamente destruída.

Legionário francês capturando um prisioneiro


Aos primeiros clarões de 21 de maio, a maior parte dos veículos de transporte do regimento chegou de Lubumbashi, seguida pelo restante da unidade. Totalmente motorizadas, as companhias passaram os dois dias seguintes percorrendo os arredores a procura de rebeldes e prisioneiros. Encontraram grupos de europeus aterrorizados pelas violências cometidas pelos Tigres.


Vitória

No dia 28 de maio, o 2º REP recebeu ordens para ceder seu espaço a tropas belgas, marroquinas e zairenses que se aproximavam, e se deslocar para Lubumbashi, de onde voltaria à Córsega em aviões C-141 da USAF.

Em sua rápida operação, o 2º REP foi o responsável direto pelo salvamento de 3.000 europeus e africanos leais ao governo Mobutu, cerca de trezentos Tigres da FNLC foram mortos e 163 capturados, além de grande quantidade de armas e munições. Cinco legionários morreram em combate e 25 ficaram feridos.


Legionário francês observa os restos da batalha

Levando-se em conta o rápido deslocamento da Córsega para Kinshasa e a precariedade do vôo para Kolwezi, bem como as condições adversas do local dos combates, o desempenho dos legionários foi excepcional.



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