Antes da Segunda Guerra, Holywood namorou nazistas, comunistas e fascistas. O mercado alemão era forte e o time da propaganda liderado por Joseph Goebbels conseguia editar ou barrar produções antinazistas.
Por Lucas Mendes
Muitos editores e roteiristas não escondiam suas simpatias pelo comunismo russo, que parecia próspero e resistente à depressão que devastava a Europa e os Estados Unidos na década de 1930.
As relações entre Hollywood e os militares americanos eram frias e desconfiadas, mas mudaram da noite para o dia com o bombardeio de Pearl Harbour, em 1941.
O novo livro de Mark Harris chega às livrarias no começo de uma possível nova Guerra Fria, que coloca o capitalismo ocidental contra o putinismo russo, mas o foco do livro está nos diretores de Hollywood que se alistaram para documentar a Segunda Guerra. Five Who Came Back : A Story of Hollywood And The Second World War ("Cinco que Voltaram: Uma História de Hollywood e a Segunda Guerra Mundial") é o título, e os protagonistas são John Ford, George Stevens, John Huston, William Wyler e Frank Capra, cinco dos mais bem sucedidos diretores de Hollywood da época.
Soviéticos e nazistas sabiam usar filme para promover seus regimes. Os americanos achavam a fórmula agressiva e sem credibilidade. Quando a guerra começou, o Departamento do Tesouro americano apreendeu centenas de filmes de propaganda que eram exibidos nas comunidades alemãs de Nova York e outros Estados.
Conta Mark Harris: "Capra, convocado pelos militares, veio a Nova York assistir a um dos mais famosos destes filmes, Triumph of the Will (Triunfo da Vontade), da genial documentarista alemã Leni Riefenstahl, no Musem of Modern Art (o Moma)".
"Capra saiu estarrecido: 'Nós vamos perder esta guerra'". Ele nunca tinha visto propaganda política com aquela dimensão e eficiência.
O cineasta Frank Capra
A verba que os militares deram para Capra era curta. US$ 450 mil para fazer 50 filmes. Sem dinheiro, ele decidiu usar os filmes de propaganda nazista contra o nazismo. Com a série "Porque Lutamos", cujo primeiro filme, Prelúdio da Guerra, ganhou Oscar de melhor documentário em 1942, "Capra mostrou os perigos da ambição, poder e domínio de Hitler".
Harris conta que muita gente até hoje acha que Capra simpatizava com a esquerda, mas era um republicano da ala conservadora, que tinha orgulho de dizer que nunca votou em Roosevelt em nenhuma das quatro eleições e só não dirigiu um filme sobre a vida de Mussolini porque o chefe do estúdio da Columbia percebeu a idiotice do projeto. Capra e Mussolini se admiravam.
Sem receber nenhuma instrução de militares, a série que ele concebeu e dirigiu se tornou o instrumento de educação/propaganda de todos os soldados que entravam no Exército americano. Mas, diferente da propaganda nazista, foi Capra, e não o governo, quem explicou aos americanos porque era preciso lutar na guerra.
Do grupo dos cinco diretores, além de Capra, John Ford se alinhava com a direita; George Stevens, John Huston e William Wyler tinham visões esquerdistas.
Depois da guerra, os cinco não tiveram outros projetos juntos, mas se uniram e derrubaram o projeto do produtor Cecil B. DeMille quando este tentou exigir um juramento anticomunista dos membros dos sindicatos dos diretores.
William Wyler, imigrante judeu da Alsácia, concentrou o foco dele na Força Aérea. Seu extraordinário documentário sobre o avião "The Memphis Belle" mostrou pela primeira vez as imagens de uma tripulação bombardeando a Alemanha e sendo atacada pelos jatos alemães.
Em outro ataque, na Itália, Wyler quase ficou surdo. Quando desceu do avião, não ouvia nada. Foi imediatamente despachado de volta, certo de que a carreira militar e de diretor estavam terminadas. Recuperou parte da audição num ouvido, o suficiente para ouvir atores por alto falantes ao lado da cadeira.
Um dos seus maiores filmes, Os Melhores Anos das Nossa Vidas, é sobre a dificuldade de um veterano de se reajustar à rotina quando volta da guerra. Depois fez Ben-Hur, Chaga de Fogo, Rosa da Esperança, Garota Genial, dezenas de outros, mas continuou recebendo um cheque do governo pela surdez em combate.

Durante a guerra, fez as imagens do campo de concentração de Dachau. Ficou anos traumatizado sem, falar sobre o assunto. Seu filme ajudou a condenar nazistas nos julgamentos de Nuremberg.
John Ford já tinha feito No Tempo das Diligências, As Vinhas da Ira e Como era Verde meu Vale, antes de dirigir o primeiro filme americano que documentou um combate na Segunda Guerra. Estava no Havaí, filmando a reconstrução depois do ataque de Pearl Harbour, quando foi despachado para filmar a batalha de Midway. Sem o privilégio de comandar "Ação!", filmou os aviões japoneses passando por cima dele para bombardear uma ilha próxima, mas "uma bomba", conta Harris, "caiu tão perto que o filme saiu da câmera".
"Um defeito que seria cortado num filme normal, mas Ford deixou o preto na tela e transmitiu o realismo da batalha. A guerra ia mal para os americanos e a vitória de Midway, apesar das perdas, trouxe esperanças".
Harris: "John Huston contribuiu com a batalha de San Pietro. Ele chegou atrasado e o Exército reconstruiu a batalha seis semanas depois. O truque de Huston foi tremer as câmeras nos bombardeios. Cinema verité falso e bem sucedido".
Era imprevisível planejar como cobrir batalhas como a de Midway, mas a invasão da Normandia, o D-Day, dia decisivo, estava nos planos. George Stevens, com o Exército, e John Ford, com a marinha, tinham centenas de câmeras fixas e cinegrafistas nos barcos anfíbios. Ninguém morreu, mas grande parte dos filmes foi destruída e a maior parte era tão brutal, que nunca foi vista nos cinemas, como era a intenção do projeto. As imagens mais próximas do documentário estão nos 25 minutos iniciais de Saving Private Ryan, de Steven Spielberg.
Fonte: BBC
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