O CSS Hunley, que serviu às forças
confederadas durante a Guerra Civil
Americana (1861-1865), foi o primeiro submarino operacional da história a realizar um ataque bem sucedido a um navio de guerra.
O submarino Hunley, batizado com o nome do
seu inventor, Horace Lawson Hunley, foi desenvolvido no auge da guerra pelos confederados,
na cidade de Mobile, no estado do Alabama, sendo transportado por via férrea
para a cidade de Charleston. Quando da chegada do Hunley a Charleston, seu
porto encontrava-se bloqueado por dois navios da União, o USS Housatonic e o USS
Canandaigua, que se encontravam posicionados ao largo das ilhas Sullivan´s e
Morris, para impedir que navios mercantes abastecessem a cidade. Foi nesse
contexto que o Hunley foi construído, para destruir os navios da União, pondo
um fim ao bloqueio naval.
Unidades da Marinha da União bloqueando o porto de Charleston
A bordo dos dois navios da União, já
corriam rumores sobre uma "máquina infernal", que tinha sido
desenvolvida pelos confederados, mas não se sabia ao certo o que era, apenas
sabiam que podia deslizar silenciosamente pela água e aproximar-se de um navio
sem ser notado, e afundá-lo. Como tal, o capitão do USS Housatonic dera ordens
para que a área em torno do navio fosse constantemente vigiada, as caldeiras
mantivessem a todo o tempo uma pressão de 220 psi, e os motores preparados para
arrancar a qualquer momento, para se desviarem do que quer que fosse que os confederados
lançassem sobre eles.
Horace Lawson Hunley, o inventor do Hunley
E era mesmo isso que os confederados
tinham em mente, mas antes o Hunley fora submetido a rigorosos testes.
Com 12 metros de comprimento, um peso
avaliado em 7.5 toneladas, movido à força de braços por meio de uma manivela acionada
por 7 homens ligada a uma engrenagem dupla, ligada a uma hélice de ferro
forjado, uma velocidade à superfície na ordem dos 13 nós, e submerso de cerca
de 4 nós, o Hunley mostrou ser um submarino muito capaz, mas, ao mesmo tempo,
muito perigoso. Antes mesmo de o Hunley zarpar
para o mar para atacar o USS Housatonic, o submarino afundou duas vezes,
afogando seu próprio inventor e mais doze vítimas.
Com isso, os confederados perderam em parte
o interesse no Hunley. Um oficial da Marinha Confederada chegou a declarar:
"Ele é mais perigoso para nós que para eles".
Foi então que se deu uma reviravolta.
O Tenente George L. Dixon, e sete
marinheiros destemidos, demonstraram interesse em utilizar o Hunley, mesmo
sabendo de sua má fama. O Tenente Dixon fez uma série de inspeções no Hunley,
nas quais identificou o que presumivelmente falhou quando dos dois afundamentos
anteriores, e ordenou uma série de pequenos reparos e adaptações, notadamente no
sistema dos lemes de profundidade, ordenou a instalação de uma hélice mais
resistente e que movimentasse mais água, e uma série de melhorias nos tanques
de lastro.
USS Housatonic, que bloqueava o porto de Charleston, foi o alvo do CSS Hunley
Com isso o submarino Hunley
começou a ser testado por Dixon e sua tripulação. Dixon levou o submarino ao
limite, testando-o exaustivamente, calculando o tempo que o submarino percorria
determinada distância, quanto tempo podiam permanecer submersos até que os
niveis de oxigênio obrigassem a regressar à superfície e renovar o ar. Dixon calculou que podiam permanecer submersos
cerca de 30 minutos, até terem de subir à superfície e renovar o ar. No final
desses testes, Dixon sentiu-se confiante no Hunley, e estava disposto a mostrar
ao Almirantado que o submarino, em mãos hábeis e experientes, podia ser uma
arma mortífera e extremamente eficaz.
Assim, Dixon começou as
negociações com o Almirantado, com vista a receber a permissão para atacar o
navio do bloqueio, o USS Housatonic, que ocupava uma boa posição para atacar, e
caso fosse afundado, daria tempo para que alguns navios de mercadorias
passassem pela "entrada desprotegida" providenciada pelo Hunley, ao
afundar o Housatonic.
O CSS Hunley ataca
Em pouco tempo, Dixon recebeu
a autorização para atacar, mas foi ordenado que atacasse à noite, por volta das
21:20h, período em que estaria mais escuro. Nuvens escuras aproximavam-se de
Charleston, elevando a moral de Dixon e de sua tripulação, pois a luz do luar
não iria refletir no casco de ferro do Hunley, sendo muito difícil a sua
detecção antecipada pelos tripulantes do navio da União.
Tenente George L. Dixon, comandante do CSS Hunley
Na noite de 17 de fevereiro de
1864, às 20:45h, Dixon e a sua tripulação entraram a bordo do pequeno submarino
CSS Hunley, e começaram a sua jornada a caminho da posição ocupada pelo
Housatonic. Segundo o plano de ataque que Dixon entregou ao Almirantado, ele
pretendia submergir o Hunley quando estivesse a 1,2 km de distância do alvo.
Seu armamento consistia de um torpedo. Na terminologia da época, torpedo
designava um explosivo instalado na ponta de um arpão, que era direcionado e
preso ao casco da embarcação inimiga e, depois, detonado por espoleta.
O sistema de propulsão do CSS Hunley: movido a manivela e força braçal
De acordo com um tripulante, que sobreviveu ao afundamento do USS Housatonic, a noite corria clara. Nuvens escuras ocultavam as estrelas e o céu. Eram 21:05h, a tripulação do Housatoniccantava em conjunto o Hino americano, quando ouviu-se o apito do vigia. Todos pararam de cantar e encaminharam-se para bombordo.
Segundo um relatório dos
arquivos navais americanos, transcrevemos a descrição dada pelo referido
tripulante:
“Cantávamos o Hino americano, quando de súbito, sem
que nada o previsse, ouviu-se o apito do vigia, paramos de cantar e fomos para
o lado bombordo do convés. O que eu e os meus amigos marinheiros vimos,
deixou-nos sem sangue. Acabara de aparecer à superfície um objeto
cilíndrico, e que se encaminhava na nossa direção, não dava para perceber o que
era, a luz fraca dos holofotes não permitia que se visse bem, mas então, dois
tubos ergueram-se desse objeto, e percebemos que o que quer que fosse, fora
construído pelo homem, e que as intenções com que se encaminhavam para nós, não
eram as melhores.
O capitão Pickering, de imediato, ordenou que se
abrisse fogo sobre esse objeto, que, a cerca de 30 metros de nós, se começava a
notar fracos clarões de luz vindos do seu interior. Dada a proximidade a que se
encontrava aquele objeto, não nos foi possível abrir fogo com as peças
principais, sendo nós obrigados a abrir fogo com os mosquetes e revólveres. Do
meio da confusão, dos disparos, o capitão Pickering ordenou que os motores
fossem de imediato postos em marcha à ré. Eu estava na amurada, a disparar o
meu mosquete naquele objeto, ele encontrava-se a dois metros do nosso casco
quando de súbito parou. Ouviram-se gritos no interior da máquina atacante, e vi
que tinha por cima pequenas vigias, e foi para lá que tentei apontar, na
esperança de atingir algum dos homens no seu interior.
Então dois tripulantes, cujo nome eu desconhecia,
gritaram, apontando para baixo, e vimos uma barra de ferro, que ia da máquina
atacante até ao nosso casco. Enquanto continuávamos a abrir fogo, a máquina
atacante começou a recuar lentamente. Não me parecia que as balas de mosquete
estivessem a ter qualquer efeito naquela máquina, mas não havia mais nada que
pudéssemos fazer. Então, quando a máquina atacante recuou a cerca de 40 metros
de nós, ouviu-se uma explosão debaixo de água, todo o Housatonic tremeu debaixo
dos nossos pés, água lançada ao ar caiu sobre o convés, e nem um minuto após a
explosão sentimos o convés a inclinar-se sob os nossos pés, percebemos de
imediato que nos estávamos afundando.
O capitão Pickering deu ordem de abandonar navio, e
de imediato os botes foram lançados para dentro da água, e muitos lançaram-se
ao mar. Eu fui um dos muitos que se lançaram à agu, na tentativa de escapar. A água
estava gelada, e fui resgatado para dentro de um bote. Nunca mais vi essa máquina
que nos atacou. O Housatonic inclinou-se para trás, a proa surgiu nas águas, e
nem quatro minutos após a explosão, todo o magnifico navio desapareceu nas
águas.”
O submarino CSS Hunley: é possível ver o arpão com o 'torpedo' na ponta
Especulações e resgate
Pouco se sabe em relação ao
que aconteceu a bordo do CSS Hunley após a explosão. Sabe-se que o submarino
fez o sinal combinado, com uma lanterna de magnésio, confirmando o afundamento
do USS Housatonic, e que os navios de abastecimento podiam encaminhar-se depressa
para o porto de Charleston. Em terra, esperou-se pacientemente o regresso do
triunfante submarino, coisa que nunca aconteceu.
O Hunley desapareceu para só
ser encontrado 136 anos depois, no dia 8 de agosto de 2000, enterrado sob dois
metros e meio de areia e lodo, que o conservaram para a posteridade, mais as ossadas
do Tenente Dixon e dos seus sete tripulantes.
Os destroços do Hunley sendo resgatados em 2000
Muita especulação existe em torno
do que sucedeu com o submarino que não regressou de sua missão. Em geral, as
teorias mais aceitas são:
1) A força da explosão da
bomba, cravada no casco do USS Housatonic, pode ter danificado os componentes
do submarino, a ponto de ficar parcialmente não operacional;
2) Com o esforço realizado
pela tripulação do Hunley, os níveis de dióxido de carbono podem ter aumentado
a níveis que fizesse os tripulantes desmaiarem, fato bem possível de ter
acontecido, pois, aquando da escavação no Hunley, as ossadas dos tripulantes encontravam-se
tombadas sobre a manivela, o que é consistente com a teoria de terem desmaiado
em plena atividade;
3) Outra hipótese é a de que,
na explosão, o casco tenha ficado danificado, a ponto de permitir a entrada de
água no casco, mas que deu tempo para a tripulação fazer o sinal de confirmação
com a lâmpada de magnésio, e;
4) Uma inundação repentina,
pela falha dos tanques de lastro por exemplo, que fizesse com que o Hunley
mergulhasse a pique, e que afogasse os seus tripulantes.
O submarino CSS Hunley em exposição, após ter sido recuperado e restaurado
Controvérsias
históricas a parte, o fato é que o CSS Hunley foi o primiro submarino a afundar
um navio de guerra em combate. Apesar de
sua perda, o conceito de uma embarcação que poderia submergir para o ataque fora provado e, nas duas guerras mundiais do século XX, o
submarino desempenharia papel essencial na luta pelo domínio do poder marítimo.
Incrivel.
ResponderExcluirBeleza de pesquisa! Tomei a liberdade de "copiar/colar" para publicar em 17 Fev 2013!
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