No dia 27 de janeiro de 1944 terminavam os 872 dias do cerco a Leningrado.
Por Aleksandr Korolkov
No dia 27 de janeiro de 1944, as tropas soviéticas fizeram os soldados de Hitler recuar para uma posição de até 100 km de Leningrado, restaurando as ligações de transporte com a cidade. Acabavam assim os 872 dias daquilo que entraria para os livros de história como o cerco a Leningrado.
Naquela noite de janeiro provavelmente todos os que conseguiram saíram para a rua para assistir aos fogos de artifício em comemoração da libertação, mas de longe nem todos viram junto a si os seus vizinhos, amigos e parentes. De quase três milhões de habitantes da maior cidade soviética antes do cerco, 1,5 milhão de foram evacuadas e mais de 650 mil morreram, a maioria de fome.
Por que razão Leningrado (como era chamada São Petersburgo) era tão importante para Hitler? Ela não apenas ameaçava o flanco esquerdo das tropas nazistas, mas era importante em termos de logística. Se tomassem Leningrado, os alemães teriam à sua disposição um porto marítimo e um importante entroncamento ferroviário de abastecimento.
Bateria antiaérea russa defendendo Leningrado
A cidade se defendeu bem. O trabalho de cerca de meio milhão de seus habitantes a transformou em uma verdadeira fortaleza. Sitiados, eles se defendiam com os canhões navais da Frota do Báltico e a artilharia pesada do forte de Krasnaia Gorka. A densidade da artilharia antiaérea de defesa era dez vezes maior do que na defesa de Londres.
Sem conseguirem tomar a cidade, os soldados do Grupo de Exércitos Norte alemão bloquearam por completo Leningrado, já cercada ao norte pelos finlandeses.
As tropas soviéticas iniciaram as tentativas de libertar a cidade no outono de 1941, mas sem sucesso.
Evacuação
A evacuação dos habitantes de Leningrado, como da população de muitas outras grandes cidades do oeste da União Soviética, foi organizada logo após o início da guerra. No dia 29 de junho trens retiraram os primeiros refugiados para leste. Naquela altura a guerra soava ainda longe e muitas pessoas se recusaram a abandonar suas casas.
Quando no dia 27 de agosto as forças da Wehrmacht se apoderaram da ferrovia que saía de Leningrado, muitos civis ficaram. Tinha então início uma séria crise no abastecimento e era impossível alimentar os que restavam na cidade.
A situação começou a mudar apenas depois de o Lago Ladoga congelar. Em outubro de 1942, mais de 1 milhão de pessoas foram evacuadas de Leningrado através do “caminho da vida”, feito ao longo deste lago.
Fome
Antes, tal como agora, os suprimentos armazenados em qualquer grande cidade chegavam no máximo para garantir duas semanas de autonomia. E a sitiada Leningrado não foi exceção. O fogo nos depósitos de comida, deflagrado pelo bombardeamento dos aviões alemães, apenas apressou o inevitável. Já em outubro a cidade se viu com sérios problemas de falta de comida e em novembro, de fome declarada.
Fazer entrar comida por via aérea era impossível e o período entre o momento em que o lago Ladoga deixou de ser navegável até o seu gelo solidificar por completo foi o mais difícil durante o bloqueio: os barcos já não podiam atravessar o lago, mas os caminhões ainda não podiam passar por cima dele.
Muitos moradores de Leningrado morreram de fome durante o longo cerco
O sistema de racionamento apenas veio organizar a fome, mas não conseguiu vencê-la. Começou com a diminuição das doses de distribuição de comida, cujo pico se deu no dia 20 de novembro de 1941, quando os soldados na linha da frente receberam para todo o dia apenas 500 gramas de pão, os trabalhadores, 250 gramas, e os empregados e dependentes, 125 gramas.
No primeiro inverno do cerco, morriam diariamente de fome e de frio milhares de pessoas. A morte de fome em massa continuou até o verão de 1942, mas mesmo depois as normas de ração diária se mantinham muito baixas e até mesmo os soldados, que recebiam rações reforçadas, passavam frequentemente fome extrema.
A vida na cidade sitiada
Apesar da fome e dos bombardeios constantes, a cidade continuava a viver. A linha da frente estava posicionada a 16 km do Palácio de Inverno, ou seja, do coração da cidade. Os tanques que saíam das oficinas da fábrica de Kirov, constantemente sob fogo inimigo, seguiam direto para a frente de combate e do centro da cidade havia um bonde que fazia o percurso também até a linha da frente.
Apesar de tudo, a cidade preservava a ordem. Quando em novembro de 1941 as mortes derivadas da fome se tornaram generalizadas, foram organizadas equipes especiais que retiravam diariamente das ruas e calçadas dezenas e até centenas de cadáveres. Em março de 1942, toda a população ativa saiu para limpar o lixo da cidade e em abril começou a restauração dos canos e de outras estruturas.
Vida cultural
Apesar dos bombardeios e do bloqueio, Leningrado mantinha a sua vida cultural. Mesmo durante o primeiro inverno do cerco, alguns teatros e bibliotecas se mantiveram abertos ao público, e no verão de 1942 foram inauguradas algumas escolas e outros teatros. No dia 9 de agosto de 1942 se realizou o primeiro concerto sitiado da filarmônica municipal, no qual foi tocada a famosa Sinfonia Heroica de Leningrado, de Dmítri Chostakovitch, que se tornou o símbolo musical do bloqueio.
Fonte: Gazeta Russa
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