terça-feira, 9 de junho de 2009

ENTREVISTA COM FRANK McCANN: OS EUA, O BRASIL E A 2ª GUERRA MUNDIAL




Para o pesquisador americano Frank McCann, a contribuição feita pelo Brasil ao esforço aliado durante a 2ª Guerra Mundial foi maior do que se imagina. As bases americanas instaladas em território brasileiro, afirma, foram fundamentais para os aliados na África, na ex-União Soviética e até na China durante o conflito, que poderia ter tido outra história se elas não existissem.


McCann lembra ainda que os Estados Unidos chegaram a temer que, assegurado o norte africano, os alemães atravessassem o Atlântico para invadir o Brasil, com apoio de revoltas das comunidades germânicas e italianas do Sul do país. O pesquisador também relata que ocorreu, na 2ª Guerra, um choque de culturas, no qual os norte-americanos tiveram uma visão negativa dos brasileiros por causa da falta de condições de saúde dos soldados do Brasil. Segundo ele, após o fim da Guerra Fria, e desde que foi superada a tensão que precedeu o rompimento, em 1977, do acordo militar de 1952, há mais respeito mútuo entre os dois países. "Havia alguma suspeita entre oficiais brasileiros de que os americanos estavam interessados demais na Amazônia", disse McCann. A seguir, os principais trechos da entrevista concedida por ele ao Estado:




O senhor diz que o Brasil na 2ª Guerra foi um dos primeiros exemplos do uso de civis em projetos militares. Como isso ocorreu?
Eu estava me referindo à construção das bases aéreas. Os militares americanos não poderiam fazê-lo, então foram à Pan American Airways, cuja subsidiária Pan Air do Brasil foi encarregada de obter as terras, os trabalhadores, e organizar as construção. O contrato da Pan Am com o Exército dos EUA estabelecia que construiria bases de Miami a Natal e então, através da África, de Dacar à Somália. Quando a Europa estava sob domínio alemão, e os japoneses dominavam o Pacífico, essa rede abasteceu os britânicos no Norte da África, a União Soviética e até o crucial teatro da China, Burma e Índia. Sem as bases brasileiras, a Segunda Guerra Mundial teria tido uma história diferente.

Qual foi o peso que teve, para a entrada do Brasil na guerra, a Operação Pote de Ouro, invasão planejada do Nordeste por 100 mil americanos para garantir a área para as operações dos EUA?
Não acredito que tenha tido alguma influência na tomada de decisão. Franklin Delano Roosevelt e o Exército americano não desejavam combater brasileiros. Em vez disso, temiam que a Alemanha, após assegurar o norte da África, lançasse um ataque no Nordeste brasileiro e que as comunidades alemãs e italianas no Sul se revoltassem em apoio ao esforço alemão. A vitória alemã contra a França e o ataque aéreo à Grã-Bretanha assustaram todo mundo.

Houve um choque de culturas entre brasileiros e americanos na 2ª Guerra?
O Brasil deu aos americanos uma visão negativa do País. Grandes recursos, maravilhosa hospitalidade, mas uma população doente. Embora o intenso treinamento tenha irritado alguns oficiais brasileiros, não era diferente daquele aos quais os soldados americanos eram submetidos. A regra era simples, soldados subtreinados poderiam logo ser mortos. Minha impressão é que oficiais como Castello Branco logo entenderam que o contínuo treinamento era necessário.


Por que a FEB teve apenas 25 mil homens? O que faltou? Dinheiro?
Não, foi simplesmente uma questão de não ter homens jovens saudáveis em número suficiente. Um dos problemas foi que o processo decisório no Brasil era muito lento. As decisões certas foram tomadas muito tarde para tirar vantagens das oportunidades que passavam rapidamente. Se o Brasil tivesse estado pronto para enviar suas forças em 1943 como parte da campanha no Norte da África, mesmo que tivesse tido somente um par de divisões, seu status teria sido diferente.


Como ficou a relação Brasil-EUA na área militar após o fim da Guerra Fria?
Acho que há mais respeito mútuo. Havia alguma suspeita entre oficiais brasileiros de que os americanos estavam interessados demais na Amazônia. O Brasil negou permissão para pouso aos EUA em alguns campos em Roraima no fim dos anos 80, mesmo em missões humanitárias. E, com pelo menos um treinamento envolvendo paraquedistas brasileiros em Roraima, os EUA foram advertidos para que mantivessem distância.
,
Recentemente, o Brasil lançou um extenso programa de compras militares. Comprou equipamentos da Rússia e da França. Os americanos continuarão distantes ou Obama poderia mudar esse quadro?
Ouvi que o presidente Obama estava impressionado com o presidente Lula. Mas ficaria surpreso se ele tivesse uma ideia clara sobre o que o Brasil é hoje. Espero que ele venha logo e consiga ver muito do País. Como regra, os americanos têm poucas ideias concretas sobre o Brasil. Quanto mais Obama ver, melhor será.

Fonte: Estadão

 

Um comentário:

  1. Daroz, enquanto estudiosa do assunto me questiono o tempo que levaram para chegar a tais conclusões, ou melhor, divulgá-las. Muito tempo e um assunto que só levanta perguntas...

    É estranho, até porque os arquivos que contêm esses documentos deixaram de ser top secrets há muito tempo.

    beijos
    vânia

    ResponderExcluir